TOP: Tópicos Obrigatórios em Pediatria - Ano 2015 - Volume 5 - Número 3
Diabetes mellitus tipo 1 e 2 - diagnóstico e manejo
Diabetes mellitus type 1 and 2 - diagnosis and management
O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é considerado a segunda doença crônica mais comum da infância, enquanto que o tipo 2 (DM2) vem aumentando ascendentemente devido à epidemia de obesidade infantil em que vivemos atualmente. Por essa razão, será apresentado, a seguir, o guideline do National Institute for Health and Care Excellence (NICE), publicado em agosto de 2015 e intitulado "Diabetes (type 1 and type 2) in children and young people: diagnosis and management".
O tratamento e acompanhamento clínico desses pacientes caberão sempre ao especialista, mas, na maioria das vezes, é o pediatra geral que fará o seu diagnóstico no consultório ou no atendimento de emergência. A suspeita clínica deve ser feita a partir de sintomas típicos como poliúria, polidipsia, polifagia, perda ponderal e cansaço excessivo e o diagnóstico final é dado quando glicemia ao acaso > 200 mg/dl associada a um desses sintomas citados ou pela presença de dois ou mais dos critérios abaixo:
Lembrando que o pediatra deve ainda estar atento às seguintes alterações da glicemia, que não preenchem critério para DM, mas devem ser acompanhadas de perto:Glicemia de jejum sérica > 126 mg/dl Glicemia sérica após 2h do teste de tolerância oral à glicose com 1,75 g/kg de dextrosol > 200 mg/dl Hemoglobina glicada (HbA1C) > 6,5%
1. Glicemia de jejum alterada: > 100 mg/dl e < 126 mg/dlAo fazer diagnóstico de diabetes em pacientes pediátricos, deve-se assumir se tratar de DM1, a não ser que haja forte indício de outros tipos de diabetes, como DM2, monogênica ou mitocondrial. Pensar em DM2 quando houver:
2. Tolerância oral à glicose: > 140 mg/dl e < 200 mg/dl
Caso haja dúvida no diagnóstico do tipo de DM, a dosagem do peptídeo C pode ser realizada, mas enfatizando que, quanto mais tempo houver do diagnóstico até a dosagem, mais alto é o seu valor discriminativo. E caso a clínica seja atípica, com características ou história familiar sugestiva de diabetes monogênica, encaminhar para testes genéticos.História familiar importante de DM2. Pacientes obesos (que são cada vez mais comuns, dificultando o diagnóstico). Pacientes com sinais de resistência insulínica (acantose nigricans, entre outros). Descendentes africanos ou asiáticos. Pacientes sem necessidade de insulinoterapia ou necessidade de baixas doses.
Uma vez feito o diagnóstico, as principais prioridades para o manejo dos pacientes com DM1 são:
1. Educação e informação sobre a doença e seu tratamento.
2. Insulinoterapia, que será individualizada para cada paciente. Existem 3 esquemas básicos de insulinoterapia atualmente:
3. Reeducação alimentar, ensinando a contagem de carboidratos e suas substituições.Regime de múltiplas injeções diárias basal-bolus, que consiste em aplicações de insulina rápidas ou ultrarrápidas antes das refeições e uma a três injeções de insulina basal, dependendo de sua meia vida, ao longo do dia. Sistema de infusão contínua de insulina, conhecido como bomba de insulina. Uso de uma a três injeções diárias de uma mistura já pronta de insulina rápida com basal.
4. Medições de glicemia capilar e meta de HbA1C:
5. Tratamento psicológico, tanto para os pacientes quanto para seus familiares.A glicemia capilar deve ser aferida pelo menos 5 vezes/dia com do uso de glicosímetro ou sistema de monitorização contínuo quando houver indicação especifica. Uma das novidades do guideline é estabelecer uma meta de HbA1C < 6,5% para evitar complicações crônicas do diabetes, como retino, nefro e neuropatia. Essa meta deve ser individualizada de acordo com idade e histórico de cada paciente e nunca pode ser rígida. HbA1C deve ser solicitada a cada 3 meses.
6. Orientações para hipoglicemia, cetoacidose e manejo em dias de doenças.
7. Rastrear possíveis doenças autoimunes associadas, como tireoidite de Hashimoto e doença celíaca.
8. Rastreio de complicações crônicas a partir de 5 anos de doença, anualmente.
Outra novidade trazida nesse guideline é o manejo dos pacientes com DM2, que é bem semelhante ao dos DM1, exceto por algumas particularidades:
1. Importância da perda ponderal por meio da reeducação alimentar e atividade física.
2. Iniciar metformina para todos acima de 10 anos após o diagnóstico.Oferecer todo o suporte para otimizar a perda ponderal e controle glicêmico, levando em consideração aspectos sociais e culturais de cada paciente. Calcular e plotar IMC no gráfico em todas as consultas.
3. Tratamento psicológico.
4. Monitorização de HbA1C a cada 3 meses com a mesma meta dos DM1.
5. Monitorização de complicações crônicas a partir do diagnóstico anualmente, incluindo hipertensão e dislipidemia.
A complicação aguda mais grave do DM é a cetoacidose diabética (CAD) e na maioria das vezes será tratada pelo pediatra de plantão, por isso, é de grande importância o domínio do seu manejo, que é descrito detalhadamente nesse guideline. O diagnóstico nem sempre é tão simples, já que seus sintomas (náuseas, vômitos, dor abdominal, desidratação, hiperventilação e redução do nível de consciência) podem se confundir com quadros comuns como asma, gastroenterite e outras infecções. Sempre que houver suspeita, é importante perguntar por sintomas clássicos de diabetes, realizar uma glicemia capilar e uma gasometria. O diagnóstico é feito se ph < 7,3 e bicarbonato (HCO3) < 18 e é considerada grave se ph < 7,1. Lembrar que pacientes previamente diabéticos podem desenvolver cetoacidose com glicemia normal por estarem parcialmente insulinizados.
Os pilares do tratamento da CAD são a hidratação e a insulinoterapia venosa. A reposição de potássio também é fundamental. A monitorização clínica, da glicemia capilar e o balanço hídrico devem ser feitos de hora em hora e a monitorização laboratorial 2 horas após o início do tratamento e depois a cada 4 horas. A transição para insulina subcutânea só pode ser feita após a confirmação de o paciente estar sem acidose, sem náuseas e vômitos e aceitando dieta via oral. A complicação mais grave da CAD é o edema cerebral, que deve ser sempre suspeitado em pacientes com cefaleia, agitação ou irritabilidade, taquicardia, hipertensão, rebaixamento do nível de consciência, alterações do padrão respiratório e anisocoria. O tratamento deve ser iniciado o mais breve possível com manitol ou solução sódica hipertônica.
Portanto, na leitura do guideline indicado, será possível encontrar as recomendações mais recentes e detalhadas sobre o manejo dessas enfermidades cada vez mais comuns na prática pediátrica e que por seu caráter crônico, se mal conduzidas, geram um grande impacto na vida dessas crianças e adolescentes.
Link:
http://www.nice.org.uk/guidance/ng18/resources/diabetes-type-1-and-type-2-in-children-and-young-people-diagnosis-and-management-1837278149317
1. R4 de Endocrinologia Pediátrica do HFSE
2. Endocrinologista Pediátrica do HFSE
3. Pediatra. Chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Federal dos Servidores do Estado - MS. Rio de Janeiro, RJ. Coordenador Adjunto de Residência e Estágios em Pediatria da SBP
Endereço para correspondência:
Hospital Federal dos Servidores do Estado
Rua Sacadura Cabral 178. Saúde
Rio de Janeiro, RJ. Brasil