ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo Original - Ano 2022 - Volume 12 - Número 1

Perfil de prematuridade e adequação neonatal de peso em maternidade de Minas Gerais e comparação com literatura médica

Profile of prematurity and neonatal weight adequacy in maternity of Minas Gerais and parallel with medical literature

RESUMO

OBJETIVOS: Recém-nascidos em ambos extremos da curva de crescimento estão em maior risco de morbidade e mortalidade perinatal. Isso se associa à prematuridade e baixo peso ao nascer. Durante a prática clínica o não reconhecimento desses neonatos pode comprometer o seu tratamento e acarretar complicações futuras. O objetivo deste estudo foi avaliar a classificação dos neonatos no hospital estudado quanto à adequação de peso e maturidade e compará-los com estimativas da literatura médica.
MÉTODOS: Trata-se de estudo transversal, descritivo e retrospectivo. Nascidos em hospital do interior de Minas Gerais foram analisados em relação ao peso de nascimento e idade gestacional, durante 2 meses, a fim descrever os perfis de adequação ponderal para idade gestacional e de maturidade, usando como referência as curvas de crescimento do Intergrowth-21, e feito uma comparação com outros estudos.
RESULTADOS: Quanto à maturidade, 11,4% dos recém-nascidos eram prematuros, 88,1% a termo e 0,4% pós-termo. Pequenos para a idade gestacional (PIG) foram 8,4% e grandes para a idade gestacional 14,2%. Recém-nascidos baixo peso (RNBP) eram 9,9%, macrossômicos 4,9%. O hospital estudado apresentava valores maiores de RNBP total (p<0,001) e a termo (p<0,001) comparativamente ao Intergrowth-21, porém não significativos se comparados com prematuros (0,07) e outros estudos.
CONCLUSÃO: Os valores encontrados não foram significativamente diferentes, na maioria das vezes, de estimativas encontradas na literatura, considerando as mesmas características. Conhecer o perfil de uma maternidade de referência de Minas Gerais é importante para reconhecer precocemente problemas e otimizar as intervenções oferecidas, e assim atender as reais demandas dessa população.

Palavras-chave: Idade Gestacional, Recém-Nascido Pequeno para a Idade Gestacional, Recém-Nascido de Muito Baixo Peso, Recém-Nascido de Peso Extremamente Baixo ao Nascer, Recém-Nascido de Baixo Peso, Recém-Nascido Prematuro.

ABSTRACT

OBJECTIVES: Newborns at both ends of the growth curve are at increased risk for perinatal morbidity and mortality. These newborns usually are associated with prematurity and low birth weight. During clinical practice, failure to recognize these neonates can compromise their treatment and lead to future complications. The objective of this study was to evaluate the classification of neonates in the studied hospital regarding weight adequacy and maturity and to compare it with medical literature estimates.
METHODS: This is a cross-sectional, descriptive, and retrospective study. We analyzed birth weight and gestational age of newborns in a Minas Gerais maternity for two months to describe the profiles of weight adequacy for gestational age at birth and its maturity, using the growth curves of Intergrowth-21 as a reference, and compare them with other studies.
RESULTS: For maturity, 11.4% of newborns were premature, 88.1% at term, and 0.4% post-term. Small for gestational age (SGA) were 8.4% and large for gestational age 14.2%. Low birth weight newborns were 9.9%, macrosomic 4.9%. The studied hospital had higher values for the total (p<0.001) and full-term (p<0.001) low birth weight concerning the Intergrowth-21 study, but no significant results when concerning prematurity (0.07) and other studies.
CONCLUSION: The values found were not significantly different, in most cases, from estimates of the literature, considering the same characteristics. Knowing the profile of a reference maternity in Minas Gerais is essential to recognize problems early and optimize the interventions offered and thus meet the real demands of this population.

Keywords: Gestational Age, Infant, Small for Gestational Age, Infant, Low Birth Weight, Infant, Very Low Birth Weight, Infant, Premature, Infant, Extremely Low Birth Weight.


INTRODUÇÃO

Globalmente, há aproximadamente 4 milhões de mortes neonatais por ano. Dessas, ao menos 60% são associadas a neonatos com crescimento intrauterino restrito (CIUR), com baixo peso ao nascer, que apresentaram parto prematuro ou alterações genéticas1. Ainda existem 48% de neonatos não pesados ao nascer no mundo e, por isso, a percentagem de recém-nascido baixo peso (RNBP) pode estar subestimada2. Considerando esses dados, a redução de nascimentos com baixo peso está entre os “alvos globais de 2025 para nutrição” da ONU2. A avaliação de risco do neonato deve ser considerada, assim, prioridade, especialmente em países em desenvolvimento, onde 98% dessas mortes ocorrem1.

O cruzamento do peso ao nascer com a idade gestacional reflete a duração da gestação e o crescimento fetal e permite a avaliação nutricional da criança que nasce. RN nos extremos das curvas de crescimento são há longo tempo reconhecidos na literatura como mais propensos à mortalidade e morbidade perinatal3-6. A classificação proveniente desse cruzamento também influencia o tratamento infantil e as expectativas dos pais6. Além disso, diversos estudos que indicam possível relação entre extremos de peso e complicações metabólicas durante a vida2-4,7. É necessário considerar também o uso dessa classificação na saúde pública - governos e agências internacionais usam curvas de crescimento e classificações provenientes delas para avaliar e monitorizar o bem-estar populacional, formular políticas e intervenções de saúde, entre outros5.

A adequação do peso do neonato é feita a partir de uma inferência entre o peso individual e a idade gestacional: o neonato pequeno para a idade gestacional (PIG), adequado para a idade gestacional (AIG) e grande para a idade gestacional (GIG)3,9,12,13. Recém-nascidos PIG são considerados na literatura como neonatos com um peso de nascimento menor que o percentil 10, ou, mais recentemente, o recém-nascido cujo peso e/ou comprimento de nascimento for menor a 2 desvios-padrão abaixo da média populacional para sua idade gestacional3,9,12,13. Essa classificação não diferencia entre o recém-nascido pequeno para a idade gestacional por motivos constitucionais - como tamanho dos pais e etnia, que não apresentam maiores riscos de morbidade e mortalidade - e recém-nascidos com CIUR, por isso e por sua dificuldade de diferenciação na prática clínica, neonatos CIUR são geralmente identificados como tal por sua classificação como PIG7,14,15. O recém-nascido com peso ao nascer maior que o percentil 10 e menor que o percentil 90 para sua idade gestacional, ou entre -2 e +2 desvios-padrão, é considerado AIG; e o RN que ultrapassa o percentil 90, ou acima de +2 desvios-padrão, é considerado GIG7,13,14,16-18.

A idade gestacional é, portanto, essencial para o diagnóstico da adequação de peso ao nascer, além de sua importância para a classificação de prematuridade, sendo recomendados como parâmetro, primeiramente, a data da última menstruação (DUM), em segundo lugar a ultrassonografia (US) até a 16º semana de gestação e, se não houver tais dados disponíveis, o método de avaliação por exame físico de Capurro somático para crianças maiores que 28 semanas de idade gestacional e de New Ballard para menores de 28 semanas de idade gestacional3,14.

Além dos conceitos apresentados se utiliza também o de RNBP, que se refere ao peso de nascimento inferior a 2.500g. Ela não deve ser confundida com o termo PIG, ainda que muitas vezes essas condições sejam sobrepostas2. RNBP apresentam maior risco de morte e de intercorrências perinatais. Seu uso é também importante para a saúde pública, onde é considerada um preditor de sobrevivência infantil e é relacionada ao nível de desenvolvimento socioeconômico e de assistência materno infantil2,8,19. A percentagem de baixo peso em uma população reflete também outros indicadores de saúde pública, que incluem nutrição materna, sistema de saúde precário e fumo. Individualmente o peso ao nascimento, por si só, é considerado uma das medidas com maior sensibilidade para avaliar o bem-estar do RN2,5,8.

Entretanto, não há consenso sobre qual curva utilizar, o que pode levar o profissional a classificar o recém-nascido a partir de valores desatualizados ou não baseados em evidências, com a possibilidade de não se reconhecer neonatos em risco ou levar a testes e tratamentos desnecessários em recém-nascidos normais6,11.

Em um estudo de 2014, em Ontário, Canadá, 56,5% dos hospitais estudados não utilizavam curvas para avaliação do peso ao nascimento. Entre os 37 hospitais restantes, 7 locais utilizavam mais de uma curva, não apresentando uma convenção dentro do serviço6. É possível inferir que o mesmo aconteça na realidade brasileira.

Curvas de crescimento

Existem na literatura diversas curvas de crescimento. A primeira curva foi feita ainda no século XVIII20; exemplos mais recentes são a de Olsen et al. (2010)21 e Fenton e Kim (2013)22; e as curvas de crescimento da ONU. Essas mudam de características a partir de sua metodologia e da população estudada.

Existem hoje duas vertentes na literatura médica. Apesar de ser um tópico debatido continuamente, ainda não há, dentro das evidências atuais, uma resposta de qual seria a melhor abordagem15,23.

Em uma das vertentes, coloca-se a necessidade do conhecimento do perfil antropométrico de cada localidade. Essa vertente considera que, caso não sejam utilizados dados locais, a definição de um recém-nascido nas categorias PIG, AIG e GIG pode ser inadequada pela interferência da etnia nos dados antropométricos. Portanto, defende a realização de curvas de crescimento locais ou nacionais como parâmetros ideais3,23,24.

Outra vertente propõe que se realize um gráfico global, standard, considerando diversas etnias, e é a proposta original do estudo Intergrowth-21 e das curvas de crescimento da ONU5,25. Nessa segunda vertente, considera-se que há a possibilidade de enganos em populações onde a falta de nutrição e a má qualidade da saúde são prevalentes, o que pode ser refletido em gráfico de crescimento, se tornando a média normal sem que esses neonatos sejam de fato saudáveis. Assim, são tomadas precauções para que outras fontes de variações de peso gestacional não influenciem o resultado nos dados coletados, nomeadamente acompanhar a saúde e nutrição materna durante a gravidez, apresentar dados de RN amamentados ao seio, entre outros. Esse enfoque considera que devemos ter um gráfico que demonstre como o RN “deve crescer” ao invés de considerar como “pode crescer”5,15,25.

Outro problema comum é como escolher a curva a ser utilizada para neonatos prematuros. O Consenso Latino-Americano de 2011 recomenda que cada país possua seu referencial. Se não houver dados locais, recomenda as curvas da OMS para crianças termo e de Fenton para crianças pré-termo3. A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), por sua vez, recomenda o uso da curva do Intergrowth-21 em neonatos com 32 semanas ou mais, seguida pela curva da OMS após 64 semanas pós-concepcionais26.

O Intergrowth-21 é um projeto internacional, multicêntrico e multiétnico, conduzido entre 2009 e 2014, em oito áreas urbanas, entre elas Pelotas, Brasil. Esse projeto usa a mesma base conceitual que as curvas de crescimento da OMS e visa criar standards internacionais para parâmetro neonatais, crescimento fetal, entre outros1,23. Além disso, o Intergrowth-21 lançou uma curva de crescimento também para RNPT a partir de 27 semanas de idade gestacional, permitindo a avaliação de um maior número de crianças27.

Independente do uso de curvas de crescimento globais ou locais, o monitoramento do perfil da população neonatal com indicadores essenciais à assistência perinatal básica é estratégia fundamental para a implementação de intervenções efetivas, visando práticas clínicas potencialmente melhores2,3.

O estudo teve como objetivo principal avaliar e comparar o perfil epidemiológico relacionado ao estado nutricional e de maturidade num grupo de neonatos de Minas Gerais, tendo como referência as curvas de crescimento do Intergrowth-21. Além disso pretendeu também descrever a importância da classificação neonatal a partir do peso e idade gestacional, e indicar a melhor curva antropométrica a ser utilizada para avaliação de neonatos nesse cenário.


MÉTODOS

Trata-se de estudo observacional, transversal, do tipo descritivo. A população estudada foi composta por recém-nascidos de maternidade de hospital de médio porte de cidade do interior de Minas Gerais, com uma população estimada em 1,5 milhões de habitantes. Possui atendimento do sistema único de saúde (SUS), convênios e particular. Possui alojamento conjunto, leito de berçário para cuidados intermediários, apartamentos e CTI neonatal.

Foram incluídos todos os neonatos nascidos nesse hospital entre agosto e setembro de 2017, em um total de 464 neonatos, totalizando 100% dos nascimentos nesse período. Foi realizada uma análise da idade e peso desses recém-nascidos, com o objetivo de fazer um perfil de adequação ponderal e de maturidade, classificando-os como PIG, AIG ou GIG; baixo peso, muito baixo peso, extremo baixo peso; macrossômicos; prematuros, termo e pós-termo.

A avaliação antropométrica foi realizada pela equipe de enfermagem durante o primeiro dia do nascimento da criança. O peso foi obtido através de uma balança eletrônica da marca Toledo, devidamente calibrada. A unidade utilizada foi Kg. Os dados foram coletados de forma manual pela equipe de enfermagem da maternidade e anotados no livro de registro de partos da maternidade do hospital em estudo. A tabela de crescimento do Intergrowth-21 foi a escolhida por ser uma curva de crescimento que engloba diversas idades gestacionais, por ser recomendada tanto pela Sociedade Brasileira de Pediatria quanto por instituições internacionais, além de possuir representação brasileira em sua realização, muitas vezes não presente em curvas anteriores. Os percentis encontrados de peso e idade gestacional do estudo Intergrowth-21, que permitiram a classificação de adequação do peso neonatal, são apresentados em anexo. Esses percentis estão presentes no site oficial do projeto Intergrowth-21 (https://intergrowth21.tghn.org/newborn-size-birth/)25.

Esta pesquisa é parte integrante do projeto “Análise do perfil de marcadores de injúria renal e de prognóstico de síndrome metabólica em recém-nascidos pequenos para idade gestacional e prematuros menores que 34 semanas”, que foi apresentado às comissões de ética e pesquisa do Campus Centro Oeste Dona Lindu/UFSJ e comissão de ética em pesquisa do hospital envolvido após inscrição na Plataforma Brasil. Este foi devidamente aprovado sob os respectivos números de parecer: 1.384.630 e 1.436.310.

1. Os recém-nascidos foram classificados entre PIG, AIG e GIG, considerando:


1.1 PIG os bebês nascidos com peso < percentil 10;

1.2 AIG os que tiverem o peso de nascimento entre o percentil 10 e 90;

1.3 GIG os que nascerem com peso > percentil 90 para a idade gestacional.


2. Os recém-nascidos foram classificados também em RNBP ou “macrossômico”. Neonatos acima de 4.000g foram considerados macrossômicos e neonatos com menos de 2.500g como baixo peso e subdivididos da seguinte forma:


2.1 Baixo peso ao nascer: menos de 2.500g (de 1.500g até 2.499g, inclusive);

2.2 Peso muito baixo ao nascer: menos de 1.500g (até 1.499g, inclusive);

2.3 Peso extremamente baixo ao nascer: menos de 1.000g (até 999g, inclusive).


3. A classificação de termo, pré-termo e pós-termo usada foi:


3.1 Pré-termo (RNPT) os recém-nascidos com menos de 37 semanas completas (menos de 259 dias) de gestação;

3.2 Recém-nascidos termo (RNT) os de 37 semanas a 41 semanas completas (259 a 293 dias) de gestação;

3.3 Pós-termo os que nascem com 42 semanas completas ou mais (294 dias ou mais) de gestação.


Análise estatística

As informações coletadas foram transcritas pela autora para uma planilha do Excel. Após a transcrição de todos os recém-nascidos, a planilha foi convertida automaticamente para classificação de z-scores e percentis pela calculadora “Neonatal size calculator for newborn infants between 24+0 and 42+6 weeks gestation” disponível no site do Intergrowth-21. Os dados foram processados e analisados através dos programas Excel e SPSS (Statistical Package for Social Sciences, versão 25.0).

Foram analisados em conjunto e após separadamente os grupos de RNT, RNPT e RN pós-termo. Os grupos foram classificados e suas porcentagens foram comparadas com os valores encontrados em estudos brasileiros e internacionais. A comparação foi feita através de teste de hipóteses bilateral usando a aproximação normal. O nível de significância para toda a análise estatística foi de 5%.


RESULTADOS

Caracterização da amostra


O total de neonatos no período estudado foi de 464, sendo 226 (48,7%) crianças do sexo feminino e 238 (51,3%) do sexo masculino. Houveram 8,4% de neonatos classificados como PIG, 77,4% AIG e 14,2% com classificação de GIG. Do total de RN, 4,5% eram macrossômicos e 9,9% possuíam peso abaixo de 2,5kg ao nascer. A média de peso foi 3,15kg, com um desvio standard de 0,55kg. Ao considerar apenas os neonatos termo, a média de peso foi de 3,25kg. A média de peso para neonatos pré-termo foi de 2,34kg e neonatos pós-termo 3,30kg. O peso mínimo foi 0,63kg e o máximo foi 4,97kg.

Em relação à idade gestacional foram encontrados 11,4% de RN prematuros, 88,1% a termo e 0,4% pós-termo. A idade mínima foi de 168 dias (24 semanas) e a máxima de 294 dias (42 semanas). A média de idade foi de 269 dias (38 semanas e 4 dias), com um desvio padrão de 13,5 dias.

É possível ver esses dados e maiores detalhes nas Tabelas 1, 2 e 3 e nos Gráficos 1 e 2 abaixo.








Gráfico 1. Número de neonatos de hospital de Minas Gerais, segundo classificação de peso ao nascer, Brasil, 2018 Macrossômico: Acima de 4.000 gramas; Peso adequado: Entre 2.500 e 4.000 gramas; Baixo peso: Menos de 2.500 gramas/Peso muito baixo: Menos de 1.500g; Extremo baixo peso: Menos de 1.000g.


Gráfico 2. Número de neonatos de hospital de Minas Gerais, segundo classificação de tempo ao nascer, em porcentagens aproximadas, Brasil, 2018.



DISCUSSÃO

Os dados encontrados foram comparados com os resultados do projeto Intergrowth-21. A percentagem de nascimentos pré-termo encontrada foi 5,5% globalmente e de 9% na população brasileira30. Não há evidência de que a proporção de 11,4% seja diferente da proporção de 9% (p=0,07). Ainda se tratando dos dados do estudo Intergrowth-21, em RN a termo nascidos no Brasil, o peso médio de nascimento foi de 3,3kg, o qual não apresenta uma diferença significativa ao que encontramos para a mesma população em nossa amostra, com um peso médio de nascimento de 3,25kg (p=0,053)30. Apesar do valor de p para essa característica em particular ter sido próxima de 0,05, indicando que talvez com uma maior amostra o valor poderia ser significativo, a diferença de um RNT com 3,3kg ou 3,25kg não é clinicamente relevante, o que nos faz manter a hipótese que os valores não são significantes. Os RNBP foram estimados em 5,8% no Intergrowth-21, e considerando apenas RNT no grupo BP, o valor cai para 1,9%. A amostra estudada apresenta valores significativamente diferentes dessas proporções, de 9,9% e 4,4%, respectivamente (p<0,001). Esses dados se encontram detalhados na Tabela 4 abaixo.




Outras estimativas importantes encontradas na literatura foram também avaliadas. De acordo com dados da ONU, existe uma variação considerável da prevalência de baixo peso. Em 2014 foi estimado 15% de nascimentos de crianças baixo peso globalmente, com seu maior pico, 28%, no sul da Ásia, e 9% na América Latina2. O valor encontrado no hospital estudado, de 9,9%, não é significativamente diferente dos valores encontrados pela ONU na América Latina (p=0,5).

O dado brasileiro mais recente publicado pelo DATASUS referente ao ano de 2007, relata 8,53% de baixo peso no Brasil e 9,1% na região sudeste19. A porcentagem da região Sudeste também não é significativamente diferente do encontrado nessa amostra de 9,9% (p=0.5).

O estudo “Nascer no Brasil”, realizado em 2016, estima a prematuridade brasileira em 11,5%29, sem diferenças significativas à encontrada, de 11,4% (p=0,94). Outro estudo anterior, de 2013, apresentou a percentagem de RNPT em 11,7% para o ano de 201028, também sem diferenças significativas (p=0,84).

Por fim, um estudo estimou o número de crianças PIG nascidas em 2012 na América Latina com o uso do standard do Intergrowth-21 em 8,6%, não significativamente diferente do valor encontrado de 8,4% (p=0,88)31.

Esses dados podem ser visualizados também na Tabela 5 e no Gráfico 3.




Gráfico 3. Neonatos de hospital de Minas Gerais, segundo classificação de adequação de peso ao nascimento, em porcentagens aproximadas, Brasil, 2018. PIG - Pequeno para idade gestacional; AIG - Adequado para a idade gestacional; GIG - Grande para a idade gestacional.



É possível observar na comparação com o Intergrowth-21 que apenas a percentagem de RNBP é maior em nossa população, tando seu total quanto apenas os RNT. É importante perceber que a amostra de dados do Intergrowth-21 foi feita em um município com menores discrepâncias econômicas que o estudado. Como comparação, o salário médio mensal dos trabalhadores formais da região de Pelotas, local de realização do Intergrowth-21, é de 2,9 salários mínimos, enquanto o salário médio mensal desses trabalhadores em Divinópolis é de 2,1 salários mínimos32, o que pode ter causado um acréscimo dos casos de RNBP na região. Além disso, a diferença pode se dever ao fato de o hospital ser referência na região para nascimentos pelo SUS, apresentando uma população com menor nível socioeconômico.

Comparação entre percentagens de nascimento de RNPT, PIG e RN baixo peso em outras literaturas não demostraram diferenças significativas do encontrado nessa amostra, o que indica que o hospital estudado está dentro do esperado para a população brasileira, mas, assim como o resto do Brasil, necessita melhorar o acesso e a qualidade do cuidado pré, pós e neonatal, diminuindo assim as proporções de crianças nascidas nessas categorias.

Diante do exposto podemos perceber que as percentagens de RNPT, PIG e média de peso de RNT que se aproximam aos valores da literatura. A percentagem de RNBP é aumentada se comparada aos valores encontrado pelo Intergrowth-21.

Como limitação do estudo, existe a possibilidade de erros na coleta e anotação dos dados pela enfermagem, principalmente quanto à idade gestacional, da qual não foi detalhada a forma de contagem (se por DUM, US ou outros).

Como propostas futuras para a localidade estudada, podemos considerar os métodos para reduzir o número de nascimento baixo peso e pré-termo. Esses incluem uma nutrição adequada para gestantes; a promoção de cessação de fumo; a melhora da qualidade do atendimento à saúde; e o acompanhamento do recém-nascidos de risco2.

É importante implementar uma curva de crescimento padrão, que deve ser de fácil acesso e utilizada por toda a equipe28. De acordo com os dados levantados e as novas evidências, este estudo sugere as curvas do Intergrowth-21 como a curva padrão para RN brasileiros, tanto a termo quanto pré-termos.

Diante disso, a classificação neonatal deve ser criteriosamente realizada pela equipe médica e padronizada de acordo com a instituição, a fim de minimizar complicações, evitar procedimentos desnecessários e permitir o tratamento e acompanhamento eficaz dessas crianças.


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Hospital São João de Deus, Residência de Pediatria - Divinópolis - Minas Gerais - Brasil

Autor correspondente:

Raisa Rios Lodi Guedes
Hospital São João de Deus
R. do Cobre, 800 - São João de Deus, Divinópolis, MG, Brasil
CEP: 35500-227
E-mail: raisarlg@gmail.com

Data de Submissão: 18/02/2020
Data de Aprovación: 07/04/2020