ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo Original - Ano 2022 - Volume 12 - Número 4

Análise da Prevalência e Conduta das Gestantes Colonizadas por Estreptococo do Grupo B e Evolução de seus Recém-Nascidos segundo o guideline de 2010 do Centers for Disease Control and Prevention (CDC)

Analysis of Prevalence and Management of Pregnant Women Colonized with Group B Streptococcus and Outcomes of their Newborns According to the 2010 Centers for Disease Control and Prevention (CDC) guideline

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a aplicação do guideline de 2010 do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) pelas equipes de obstetrícia e neonatologia de um hospital público terciário localizado no Rio de Janeiro, Brasil.
MÉTODOS: Estudo retrospectivo, com a revisão de prontuários das gestantes que realizaram swabs vaginal-retal no hospital entre 01/11/2014 e 31/10/2015. Dos 595 swabs obtidos, 122 eram positivos para Streptococcus agalactiae (SGB). Após excluídos prontuários incompletos, malformações e partos fora do hospital, totalizou-se 85 gestantes com swabs positivos, com seus respectivos 92 recém-nascidos.
RESULTADOS: A prevalência de colonização materna foi de 20,5%. A época da coleta do swab variou entre 18 e 39 semanas, sendo a média 34,9 semanas. Das 85 gestantes estudadas, 33 (38,9%) não receberam conduta correta, pois em 19 o parto ocorreu antes de 4 horas de antibiótico e em 14 não houve início da profilaxia quando esta era indicada. Dos 92 recém-nascidos estudados, 5 (5,4%) não receberam conduta correta devido, principalmente, a rastreio infeccioso desnecessário, e um rastreio considerado incompleto por não incluir hemocultura quando indicado pelo protocolo. Dos 86 recém-nascidos com conduta considerada adequada, 53 (61,6%) tiveram mães também adequadamente tratadas. Trinta e três (57,75%) dos tratados adequadamente tinham mães com conduta incorreta pela obstetrícia.
CONCLUSÕES: Apesar do protocolo do CDC 2010 para prevenção de sepse precoce pelo SGB estar implementado no hospital, ainda é possível detectar falhas na profilaxia intraparto materna e na avaliação do recém-nascido. Estas falhas na aderência ao protocolo representam oportunidades perdidas na prevenção da sepse precoce pelo SGB.

Palavras-chave: Streptococcus agalactiae, Sepse Neonatal, Fidelidade a Diretrizes, Recém-Nascido, Gestantes.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To evaluate the implementation of the 2010 Centers for Disease Control and Prevention (CDC) guidelines by the obstetrics and neonatology teams of a tertiary public hospital located in Rio de Janeiro, Brazil.
METHODS: This retrospective study included the medical records of pregnant women who underwent vaginal-rectal swabs at the hospital between Nov. 1, 2014 and Oct. 31, 2015. Of the 595 included swabs, 122 were positive for Group B Streptococcus (GBS). After excluding incomplete medical records, malformations, and women who delivered at other hospitals, 85 pregnant women with positive swabs and 92 newborns were included.
RESULTS: The prevalence of maternal colonization was 20.5%. The time to vaginal/rectal swab collection ranged from 18 to 39 weeks of gestation, with a mean of 34.9 weeks. Thirty-three of the 85 included pregnant women (38.9%) were not properly managed, since in 19 cases delivery occurred within less than four hours of antibiotic administration, and in 14 prophylaxis was not initiated when indicated. Five of the 92 included newborns (5.4%) were not properly managed, mainly due to unnecessary screening for infection; screening was incomplete in one case, since blood culture was not ordered although the guidelines in effect required it. Of the 86 newborns with management considered adequate, 53 (61.6%) had mothers who were also adequately managed. Thirty-three (57.75%) of the newborns managed adequately had mothers submitted to inadequate obstetric management.
CONCLUSIONS: Although the 2010 CDC guidelines for prevention of early sepsis by GBS has been implemented in the hospital, we have detected failures in maternal intrapartum prophylaxis and newborn assessment. Failure to adhere to the established guidelines yields missed opportunities to prevent early-onset GBS sepsis.

Keywords: Streptococcus agalactiae, Neonatal Sepsis, Guideline Adherence.


INTRODUÇÃO

O Estreptococo beta-hemolítico de grupo B de Lancefield (SGB ou Streptococcus agalactiae) é um diplococo gram-positivo capaz de colonizar a região vaginal/retal cronicamente ou de modo intermitente. Apesar da maioria das gestantes colonizadas apresentarem-se assintomáticas, o SGB pode causar infecção e até mesmo comprometer o âmnio, endométrio ou parede abdominal, causar sepse e, mais raramente, meningite1.

A despeito de medidas adotadas na prevenção da sepse perinatal por SGB desde os anos de 1990, esta bactéria continua sendo a principal causa de sepse neonatal precoce entre recém-nascidos2,3. Por conta disso, é recomendado o screening para avaliação da colonização materna entre 35 e 37 semanas de gestação, de modo a ser realizada antibioticoprofilaxia intraparto e reduzir os casos de sepse neonatal precoce. Nos Estados Unidos, após a introdução da quimioprofilaxia intraparto, houve um declínio da incidência de sepse por SGB de 1,8 casos/1000 nascidos vivos em 1990 para 0,32 casos/1000 nascidos vivos em 20032. No Brasil, existem poucos trabalhos que evidenciam as taxas de colonização materna e neonatal, e poucos são os protocolos ou recomendações técnicas sobre o tema1.

O presente estudo foi realizado em um hospital público terciário de referência para gestação e recém-nascido de alto risco no Rio de Janeiro, Brasil, que realiza de rotina cultura de swab vaginal-retal para detecção da colonização por SGB nas gestantes que fazem pré-natal nesta unidade. Entretanto, em 2007, estudo semelhante realizado neste hospital evidenciou uma aplicação inadequada da profilaxia e pouca adesão ao protocolo recomendado pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC)4.

O objetivo deste estudo é avaliar a aplicação do “Guideline para a Prevenção da Doença Perinatal do Streptococcus do Grupo B”, do CDC/2010, pelas equipes de obstetrícia e neonatologia do hospital terciário.


MÉTODOS

Trata-se de um estudo coorte retrospectivo, descritivo, baseado na revisão de prontuários de gestantes colonizadas pelo SGB que fizeram pré-natal num hospital terciário do Rio de Janeiro, Brasil, no período de 01 de novembro de 2014 a 31 de outubro de 2015, e a análise dos prontuários de seus recém-nascidos. O presente estudo ocorre após intervenção realizada em 2006 no mesmo hospital por Costa4, que avaliou as mesmas variáveis, num período em que o protocolo do CDC já estava sendo aplicado no hospital. Na época, após seus resultados, estes foram divulgados e apresentados aos serviços de obstetrícia e neonatologia.

O estudo foi realizado por completo no próprio hospital, incluindo a cultura de swab vaginal-retal. O serviço de obstetrícia atualmente segue o protocolo do CDC de 2010 para prevenção de doença perinatal pelo SGB. Realiza de rotina swab vaginal/retal de todas as gestantes no pré-natal, entre 35 e 37 semanas de gestação.

O material para pesquisa de SGB é coletado com um único swab estéril da vagina e reto durante consulta na obstetrícia, e encaminhado ao setor de Bacteriologia/Departamento de Patologia Clínica do mesmo hospital. Neste local, as amostras são identificadas, e cada uma é reconstituída em meio liofilizado em 3 ml de água destilada antes da semeadura e agitada vigorosamente para dissolução completa. O swab que contém a amostra é introduzido no tubo em meio Caldo Granada, um meio seletivo para rastreio e identificação do SGB. O swab é cortado e fechado em um tubo hermeticamente. A amostra é incubada a uma temperatura de 35oC (±2) por 18 a 24 horas em aerobiose. Após a primeira leitura, a incubação é prolongada por mais 24 horas em caso de ausência de viragem do meio.

No pré-parto, o serviço de obstetrícia recomenda que as gestantes colonizadas por SGB recebam profilaxia antibiótica intraparto. O serviço de neonatologia do mesmo hospital também adota o protocolo do CDC de 2010 para avaliação dos recém-nascidos, diagnóstico e conduta

O estudo foi realizado com todas as gestantes colonizadas pelo SGB e seus recém-nascidos. Tais gestantes foram identificadas no pré-natal por meio do livro de registro de cultura no laboratório de bacteriologia no período do estudo. A partir dessas gestantes, foram selecionados seus prontuários e de seus recém-nascidos no arquivo informatizado. Foram excluídos os recém-nascidos portadores de malformações congênitas e síndromes genéticas, além dos que não nasceram na instituição.

Aplicou-se um questionário para coleta de dados maternos e neonatais, que continha dados gerais maternos, neonatais, laboratoriais e exames complementares realizados nas unidades.

Foi considerada profilaxia antibiótica no período intraparto toda gestante colonizada por SGB que recebeu pelo menos uma dose de antibiótico no período intraparto. A conduta também foi considerada correta quando a profilaxia antibiótica intraparto ocorreu pelo menos quatro horas antes do nascimento do concepto. Além disso, considerou-se como conduta correta quando a gestante não recebeu profilaxia intraparto, porém foi submetida a cesárea eletiva, com bolsa íntegra e sem evidências de trabalho de parto, de acordo com o protocolo do CDC de 2010. Considerou-se como prescrição médica incorreta quando doses ou intervalos dos antibióticos não estavam de acordo com as recomendações do protocolo ou quando o antibiótico utilizado era diferente daquele proposto para a profilaxia do SGB.

Os recém-nascidos foram avaliados por meio dos prontuários e classificados como sepse comprovada, sepse suspeita e não sepse. Foram utilizados os critérios de Panero et al.5 e Messer et al.6, que consideram o diagnóstico de sepse neonatal pelo menos um ou mais sinais de pelo menos três categorias clínicas e/ou sinais de duas dessas categorias clínicas mais um ou mais fatores de risco maternos, demonstradas no Quadro 17.




Para a análise dos dados, criou-se um banco de dados no programa Epi Info versão 3.5.1, por onde foram armazenados e analisados. O teste Qui-quadrado foi usado para comparar variáveis categóricas e o teste T de student para avaliar variáveis contínuas. O p-valor menor do que 0,05 foi considerado como valor com significância estatística.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do mesmo hospital e registrado na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa.


RESULTADOS

Durante o período do estudo, 595 mulheres realizaram swabs vaginal-retal no hospital do estudo. Destas, foram obtidas 122 (20,5%) culturas de swab vaginal-retal positivas para SGB e 471 com microbiota normal. Dois swabs foram excluídos por se tratar de mulheres não gestantes. A partir das 122 gestantes, 37 foram excluídas do estudo, sendo uma por não ser possível conseguir informações completas no prontuário, 4 por nascimentos ocorridos fora do hospital em estudo e 32 por serem gestações com o concepto apresentando malformações. Totalizou-se 85 gestantes, sendo 78 com gestação única e 7 com gestação gemelar, de modo que foram obtidas informações de 92 recém-nascidos (Figura 1).


Figura 1. Fluxograma da população estudada.



A idade no momento do parto variou de 14 a 43 anos, com média de 30,16 anos (Desvio-Padrão – DP ± 8,5 anos). Em relação à raça, observou-se que 46 gestantes (54,1%) eram brancas, 7 (9,4%) eram negras e 31 (36,5%) eram pardas. A média de consultas de pré-natal foi de 10 (DP ± 4,3).

O momento de coleta dos swabs vaginal-retal nas gestantes colonizadas variou de 18 a 39 semanas de idade gestacional, sendo a média 34,9 (DP ± 2,5 semanas) e mediana e moda 36 semanas. As gestantes que realizaram swab entre 35 e 37 semanas de idade gestacional representaram 75,3%.

Em relação ao tipo de parto, 44 (51,8%) foram submetidas a cesariana, enquanto 41 (48,2%) ao parto transvaginal. Quatro gestantes (4,7%) foram submetidas a circlagem. Quanto ao tempo de bolsa rota, 9 (10,6%) tiveram período maior ou igual a 18 horas, 36 (42,7%) com menos de 18 horas e 40 (47,1%) foram rotas no ato.

Das 85 gestantes, 46 (54,1%) receberam profilaxia intraparto, sendo que, destas, 43 (93,5%) foram realizadas com ampicilina e 3 (6,5%) com cefazolina. A penicilina não foi utilizada por não estar disponível no hospital.

A conduta foi considerada adequada na mãe em 52 (61,2%) gestantes. Dentre as condutas incorretas, 19 (22,4%) ocorreram pois o antibiótico foi iniciado em menos de 4 horas antes do parto. Já 14 (16,5%) gestantes não receberam profilaxia quando esta deveria ter sido iniciada.

Avaliando a conduta em relação ao tipo de parto, observou-se que, dos 44 partos com cesariana, 36 (81,8%) tiveram profilaxia adequada. Dos 8 (18,2%) com conduta inadequada, 1 (2,3%) foi pela profilaxia ter iniciado em menos de 4 horas e 7 (15,9%) por não ter sido iniciada a profilaxia quando houve bolsa rota. Já em relação ao parto transvaginal, dos 41 realizados, 16 (39%) tiveram conduta adequada em relação à profilaxia para SGB. Porém, em 25 (61%) partos, a conduta foi inadequada, pois em 18 (43,9%) partos normais a profilaxia foi iniciada em menos de 4 horas antes do parto e em 7 (17,1%) não foi iniciada profilaxia quando esta deveria ter sido feita.

Das 46 gestantes que receberam profilaxia, a conduta foi adequada em 27 (58,7%) das gestantes. Já nas 39 gestantes que não receberam profilaxia, a conduta foi adequada em 25 (64,1%) (Figura 2). Uma gestante apresentava sinais de corioaminionite no momento do parto, porém, nesta gestante, a conduta foi adequada.


Figura 2. Fluxograma da profilaxia antibiótica intraparto e conduta materna.



Foram estudados 92 recém-nascidos, entre eles, 7 pares de gêmeos. A idade gestacional variou de 32 a 42 semanas, sendo a média 38 semanas e 4 dias (DP ± 1 semana e 5 dias). Quatorze (15,4%) eram prematuros e 77 (84,6%) a termo.

A média do índice de Apgar no 1o minuto de vida foi de 8,3 (DP ± 1,1) e no 5o minuto foi 9 (DP ± 0,5), sendo a mediana 9 e 9, respectivamente. Na sala de parto, 8 (8,8%) necessitaram de reanimação neonatal, sendo que 7 (7,7%) receberam ventilação com pressão positiva sob máscara e apenas um (1,1%) necessitou de intubação orotraqueal.

Oitenta e quatro recém-nascidos (91,3%) permaneceram no alojamento conjunto, enquanto 8 (8,7%) ficaram internados na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal por diversas indicações, seja por dificuldade respiratória ou sepse suspeita.

Foi realizado rastreio infeccioso em 47 (51,1%) dos 92 recém-nascidos estudados, com coleta de hemocultura em 10 destes (21,2%), todas negativas. Em relação à cultura do líquor, foi feita em 4 recém-nascidos (8,5%), todas também negativas para SGB. Nos que foram rastreados, a média foi de 1,8 rastreios por RN (DP ± 0,6).

Dos 92 recém-nascidos estudados, 6 (6,5%) apresentaram sinais e sintomas na primeira semana de vida, e foram tratados com ampicilina associada à gentamicina. As apresentações clínicas incluíram desconforto respiratório, doença da membrana hialina, apneia, convulsão, icterícia precoce e instabilidade térmica. Oito (8,7%) tiveram o diagnóstico de sepse suspeita, sendo nenhum caso de sepse comprovada.

Em relação à conduta no recém-nascido, 86 (93,5%) tiveram conduta adequada, ou seja, diante da conduta materna, a conduta foi realizada corretamente de acordo com o protocolo do CDC 2010. Cinco recém-nascidos (5,4%) foram avaliados incorretamente, e tiveram o rastreio realizado desnecessariamente e um (1,1%) não teve o rastreio feito adequadamente, pois não houve coleta de hemocultura quando esta deveria ter sido realizada. Avaliando o prontuário, esta não foi coletada, pois no momento não havia frascos de hemocultura disponíveis no hospital. Não houve recém-nascido sem coleta de rastreio quando havia indicação. Todos os que apresentaram sepse suspeita receberam avaliação diagnóstica correta pela neonatologia.

Ao avaliar a conduta materna intraparto e a evolução clínica dos recém-nascidos, observou-se que os cinco que fizeram rastreio infeccioso sem necessidade foram de mães tiveram conduta considerada como adequada. Já o recém-nascido que teve o rastreio considerado inadequado por não incluir a hemocultura, era de uma mãe que tinha conduta incorreta por não ter feito profilaxia, a qual era indicada.

Dos 86 recém-nascidos com conduta considerada adequada, 53 (61,6%) tiveram mães também adequadamente tratadas. Trinta e três (57,75%) tratados adequadamente tinham mães com conduta incorreta pela obstetrícia. Destes, em 19 a profilaxia tinha sido realizada menos de 4h do parto e em 14 as mães não receberam a profilaxia, quando indicada. Dos recém-nascidos cujas mães não receberam profilaxia quando indicada, 14 (93,3%) tiveram a conduta pela neonatologia como considerada adequada.


DISCUSSÃO

Apesar da taxa de colonização materna por SGB não mudar nos últimos anos, a sua incidência na sepse neonatal precoce diminuiu significativamente com a implementação da profilaxia intraparto. O primeiro guideline proposto pelo CDC ocorreu em 1996, sendo atualizado algumas vezes e, desde então, orienta medidas para auxiliar na conduta da profilaxia intraparto das mães colonizadas por SGB e no manejo dos recém-nascidos8.

Na década de 1970, o SGB foi identificado como o principal agente responsável por meningite e sepse nos recém-natos, o que incentivou, na década seguinte, a profilaxia intraparto materna, que levou à redução desses índices1.

No Brasil, entretanto, há poucos estudos e recomendações em relação a este tema. Os primeiros trabalhos evidenciavam uma taxa de colonização materna de 26% em Porto Alegre e de 25% em Florianópolis. No Paraná, a colonização ocorreu em 15% das gestantes1. Segundo o CDC-2010, 10 a 30% das gestantes são colonizadas por SGB na vagina ou no reto entre 36-38 semanas de idade gestacional2. No presente estudo, encontrou-se uma prevalência de 20,5% de colonização nas gestantes que fizeram pré-natal neste hospital, um resultado próximo ao de outros trabalhos. Não obstante, a prevalência da colonização materna depende da fonte do swab, época de coleta e outras variáveis, que podem explicar diferentes prevalências em diversos estudos e regiões9.

O CDC coloca como situação de risco para desenvolvimento de sepse por SGB a raça negra2. Neste trabalho, entretanto, observou-se que 9,4% das gestantes eram negras, 36,5% pardas e 54,1% brancas. Costa et al.1 observaram também o predomínio entre a raça branca. Tal resultado pode ser atribuído à dificuldade de identificar a cor na pele no Brasil, uma vez que temos uma intensa miscigenação.

O CDC recomenda que os swabs para screening ocorram entre 35 e 37 semanas de idade gestacional nas gestantes2. Entretanto, um teste rápido seria preferencial para direcionar a colonização no momento no parto. Vários testes estão sendo validados, apesar de a cultura, no momento, ser considerada o padrão-ouro10. Observou-se que 75,3% das gestantes realizaram swab entre 35 e 37 semanas de idade gestacional, e que todas tinham o resultado sobre a colonização no momento do parto, o que contribuiu para uma conduta adequada.

Ao avaliar a via de parto, observou-se que 58% foram via cesariana. Em 2004, um estudo identificou uma prevalência de 41,8% de cesarianas no Brasil11. O resultado maior neste estudo pode ser explicado por ser realizado em uma maternidade de alto risco, tanto para a mãe como para o recém-nascido, assim, justificando esse aumento das cirurgias obstétricas.

Em relação ao tipo de profilaxia intraparto materna, observou-se que a ampicilina foi utilizada na maioria dos casos (93,5%). A penicilina, considerada como droga de primeira escolha, não foi utilizada por não estar disponível no hospital. Segundo Money & Dobson10, a ampicilina é a opção quando a penicilina não está disponível. A cefazolina é uma alternativa às alérgicas a penicilinas que não apresentam história de anafilaxia. Logo, em relação a esta conduta, é possível observar que todos os casos foram corretos.

Avaliando o manejo obstétrico intraparto, os resultados apontam que a maioria das gestantes colonizadas recebeu profilaxia intraparto correta (61,2%). Entretanto, das que tiveram conduta considerada inadequada, a maioria (57,5%) ocorreu por conta de parto com menos de 4 horas do início do antibiótico. Em algumas situações, 16,5%, as gestantes estavam sem prescrição antibiótica ou com prescrição incorreta. Um estudo semelhante, realizado por Costa et al.4,12, avaliou a conduta na mesma instituição entre 2002 e 2006, e constatou uma menor proporção de condutas maternas adequadas (43,2%) em relação ao presente trabalho.

No que diz respeito aos recém-nascidos sintomáticos, todos apresentaram bom prognóstico e esquema antibiótico adequado, conforme orientação do protocolo do CDC de 2010. Segundo a Academia Americana de Pediatria, a ampicilina associada a um aminoglicosídeo é o tratamento de escolha para o recém-nascido com sepse precoce por SGB, esquema utilizado na instituição onde o estudo foi realizado13.

Quanto à conduta nos recém-nascidos, 93,5% apresentaram manejo adequado, a partir da conduta materna. Ao comparar com o estudo de Costa et al.4,12, observou-se que a conduta era correta nos recém-nascidos em 71%. Nota-se que também houve na neonatologia melhora em relação à adequada aplicação do protocolo.

Ao comparar a conduta materna intraparto e a evolução clínica do recém-nascido, notou-se que há a tentativa de corrigir um prognóstico desfavorável do neonato. Isso foi observado, pois 57,75% dos tratados adequadamente tinham mães com conduta incorreta pela obstetrícia. No presente estudo, nenhum concepto apresentou sepse comprovada, nem houve óbitos causados pelo SGB. Comparando com os resultados de Costa et al.4,12, que apresentou casos de sepse e óbito por SGB, observou-se que houve uma melhora em relação ao prognóstico do recém-nascido.

Por se tratar de um estudo retrospectivo, baseado na revisão de prontuários, as informações contidas no mesmo dependem das anotações médicas, podendo haver viés de informação, já que os dados podem estar incompletos ou incorretos. Além disso, houve situações em que não foi possível encontrar os prontuários da mãe e/ou da criança, o que contribuiu para que houvesse perdas no estudo. Do mesmo modo, não havia como garantir que todas as mães colonizadas por SGB tivessem o parto nesta instituição, uma vez que por ser uma unidade de referência, localiza-se, em alguns casos, longe da residência de muitas pacientes.

O hospital em estudo, de complexidade terciária, com partos de alto risco para o recém-nascido, concentra crianças com malformações, o que contribuiu para perdas de amostra, uma vez que estas crianças foram excluídas do estudo de modo a evitar o viés de confundimento.

A equipe obstétrica e neonatal do hospital adota o protocolo do CDC de 2010 como rotina. Porém, observa-se que existem falhas em relação à aplicação do protocolo, de modo que deve ser questionado o motivo pelo qual não é seguido como recomendado.

É importante destacar que o seguimento de protocolos pode ter limitações por diversos motivos. Primeiramente, é necessário que toda a equipe que participe do cuidado, seja da gestante ou do recém-nascido, tenha acesso ao protocolo de modo fácil e seja treinada adequadamente. O desconhecimento dos passos a serem seguidos ou até mesmo da existência de um protocolo pode fazer que o mesmo não seja empregado de maneira correta. Deste modo, o treinamento da equipe e a apresentação das etapas a serem seguidas são essenciais para o sucesso de sua aplicação.

Outras limitações que podem levar ao insucesso do manejo incluem as situações de emergência, ou até mesmo a ausência de material para a aplicação correta do mesmo, como de tubo de hemocultura ou de antibióticos, e engajamento e interação da equipe em oferecer o melhor tratamento aos seus pacientes. É importante também realizar um avaliação periódica dos resultados obtidos, de maneira a estimular a equipe a ter melhores desfechos e corrigir os potenciais erros ainda cometidos.

Apesar de poucos estudos serem realizados no Brasil em relação a esse tema e nenhum protocolo ser padronizado no país, trata-se de um tema com relevância para a saúde pública brasileira. O presente estudo mostra resultados melhores em relação ao realizado na mesma instituição por Costa et al., entre 2002 e 20064,12. Entretanto, ainda há a necessidade de aprimorar a assistência perinatal e a adesão ao protocolo do CDC no hospital por meio da divulgação das condutas corretas para obstetras e neonatologistas, de modo a prevenir a doença neonatal precoce pelo SGB.


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1. Cleveland Clinic Children’s Hospital, Residente de Pediatria - Cleveland - Ohio - Estados Unidos
2. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), Residência em Pediatra - Rio de Janeiro - Rio de Janeiro - Brasil

Endereço para correspondência:
Larissa Maria Isaac Maximo
Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira
Av. Rui Barbosa, 716 - Flamengo
Rio de Janeiro - RJ, Brasil. CEP: 22250-020
E-mail: larissamaximo@hotmail.com

Data de Submissão: 12/03/2021
Data de Aprovação: 19/05/2021