ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo Original - Ano 2023 - Volume 13 - Número 1

Síndrome de Cri Du Chat (síndrome do miado de gato) e a inclusão escolar

Cri du chat syndrome and inclusive education

RESUMO

INTRODUÇÃO: O presente trabalho de pesquisa buscou fazer uma reflexão sobre a inclusão de crianças com a síndrome de Cri Du Chat (SCDC), que é considerada uma síndrome rara, não muito conhecida e de origem genética.
OBJETIVOS: promover uma reflexão sobre a inclusão de crianças com a síndrome de Cri Du Chat na sala regular de ensino por meio de um levantamento bibliográfico sobre as características da síndrome, diagnóstico, tratamento, principais sintomas e principais dificuldades no desenvolvimento escolar e aplicar um questionário digital entre professores da rede regular de ensino com intuito de avaliar o conhecimento destes sobre a SCDC e suas práticas pedagógicas.
METODOLOGIA: Foi adotada uma abordagem qualitativa e exploratório-descritiva, tendo como instrumento de pesquisa a aplicação de um questionário digital. Resultados: Participaram desta pesquisa 27 professores, e destes apenas 14,8% conheciam a SCDC e atuaram na sala de aula com práticas pedagógicas adaptadas.
CONCLUSÃO: Verificou-se que um número muito pequeno de professores conhece a SCDC, suas características ou dificuldades e a maioria dos participantes não tiveram contato com a síndrome nem na sala de aula nem na formação acadêmica, tornando, assim, o processo de inclusão das crianças com esta síndrome um caminho ainda a ser desenvolvido com base no conhecimento, afeto, amor e respeito às diferenças.

Palavras-chave: Síndrome do miado do gato, Inclusão social, Aprendizado social.

ABSTRACT

This study offers reflections on the inclusion of children with Cri Du Chat Syndrome (CCS), a rare condition of genetic origin.
OBJECTIVES: To discuss the inclusion of children with CCS in schools and describe the characteristics, diagnosis, treatment, and main symptoms of the condition, along with the main difficulties students with CCS might face; to assess the knowledge teachers have about CCS and potential teaching resources they may use.
METHOD: A digital survey questionnaire was used in this qualitative exploratory descriptive study.
RESULTS: Only 14.8% of the 27 teachers who responded the questionnaire had knowledge about CCS and had worked in a classroom with adapted pedagogical practices.
CONCLUSION: A very small portion of teachers had knowledge about CCS and most had never been in contact with individuals with the syndrome, either in a classroom or during training. A path has to be developed for the inclusion of children with CCS, through a process based on knowledge, affection, love, and respect for differences.

Keywords: Cri Du Chat Syndrome, Social Inclusion, Learning.


INTRODUÇÃO

A síndrome de Cri Du Chat (SCDC), ou síndrome do miado de gato, é uma desordem genética e está associada a vários tamanhos de deleções do braço curto do cromossomo 5 (cariótipo 46, XX/XY, 5p).

Essa síndrome recebeu este nome “miado de gato” em função de o choro característico dos portadores da síndrome lembrar o miado de gatos.

Embora seja uma síndrome com prevalência pequena, as alterações/consequências podem ser bastante sérias, desde a morte ainda na infância por malformações diversas até comprometimentos significativos que afetam vários aspectos da vida de crianças portadoras dela.

A SDCD, por ser uma síndrome rara com comprometimentos diversos, pode levar ao prejuízo da aprendizagem escolar, e pouco ainda se sabe sobre como as crianças com essa síndrome se desenvolvem na sala de ensino regular.

A inclusão nas escolas de ensino regular já é uma realidade, no entanto, pretende-se com este trabalho fazer um levantamento de informações acerca da síndrome e seus impactos na vida escolar.

Atualmente, professores e educadores têm se debruçado sobre a importância da inclusão nas escolas e procurado se especializar e conhecer mais sobre as patologias, anomalias e dificuldades que podem comprometer o desenvolvimento da criança e interferir no seu processo de ensino-aprendizagem.

É importante ressaltar, ainda, que crianças com anomalias cromossômicas podem apresentar dificuldades de aprendizagem, e a síndrome de Cri Du Chat promove alterações diversas, como microcefalia e retardo mental, o que pode comprometer bastante o desenvolvimento escolar.

Assim, pretendeu-se com este artigo fazer uma reflexão sobre a inclusão de crianças com a síndrome de Cri Du Chat na sala regular de ensino, por meio de um levantamento bibliográfico e aplicação de um questionário digital entre professores da rede regular de ensino com intuito de avaliar o conhecimento destes sobre a SCDC e de se fazer um levantamento sobre as características da síndrome, diagnóstico, tratamento, principais sintomas e principais dificuldades no desenvolvimento escolar.

Ao realizar-se um levantamento científico sobre as características da SDCD e suas repercussões na vida escolar, bem como o conhecimento dos profissionais de educação sobre a SCDC, deseja-se auxiliar muitos profissionais que lidam com os comprometimentos que esta síndrome, em particular, pode apresentar em suas salas de aula.


DESENVOLVIMENTO

A síndrome Cri Du Chat (SCDC) foi descoberta na França, em 1963, pelo geneticista francês Dr. Jérôme Lejeune. O geneticista descobriu uma síndrome nova que ganhou o nome popular de “miado de um gato”, pois, ao nascer, os bebês com essa síndrome tinham um choro que lembrava um gato em sofrimento. Este choro, que se assemelha ao miado de um gato, ocorre devido ao desenvolvimento anormal da laringe, um dos vários sintomas que acompanham esta síndrome1,2.

A síndrome SCDC acontece devido a uma anomalia cromossômica do cromossomo 5p, que perde uma parte do braço curto. Essa síndrome provoca uma série de alterações como microcefalia, falha do crescimento, anormalidades faciais, retardo mental, má formação da laringe, aumento da distância entre os olhos, hipotonia, canto interno dos olhos mais altos do que o externo, pregas epicânticas, orelhas malformadas e de implantação baixa, dedos longos, prega única na palma das mãos, retardamento neuromotor e baixo peso ao nascer. Mas sua principal característica é, ao nascimento, o bebê apresentar um choro muito parecido ao miado de gato, como citado anteriormente. Esse choro, ao passar dos anos, torna-se menos característico com o crescimento da criança, o que pode dificultar o diagnóstico em pacientes maiores2-4.

Acredita-se, segundo alguns estudos, que as alterações cromossômicas estejam presentes em 8,1% das gestações e pode estar relacionada a uma das principais causas de mortes fetais e ainda provocar abortos espontâneos em 50% dos casos5.O diagnóstico da SCDC é feito através da realização do cariótipo, ou seja, do estudo cromossômico do paciente, retirando-se uma amostra de sangue. O cariótipo de uma criança/paciente com suspeita da SCDC irá apresentar uma deleção (perda) do braço curto do cromossomo 5, e essa deleção indica, com certeza, a presença da SCDC. No mundo, a estimativa de crianças nascidas vivas que apresentam SCDC é de 1 em cada 50.000 crianças3,6.De acordo com a literatura, algumas crianças com SCDC podem ter dificuldade em controlar suas necessidades fisiológicas e apresentar ainda alguns problemas comportamentais como hiperatividade, balanço excessivo da cabeça, comportamentos obsessivos ou até mesmo agressivos, e tudo isso pode dificultar o processo de ensino-aprendizagem, pois não há prognóstico com cura2,6,7.

Algumas das características citadas anteriormente estão presentes na maioria dos casos como o miado de gato, o baixo crescimento, a microcefalia e o retardo mental. É comum também as crianças com essa síndrome apresentarem problemas cardíacos e respiratórios, além de uma hipotonia muscular significativa. Outros problemas como os de sucção, mastigação, digestivos e/ou intestinais também costumam estar presentes, assim como um atraso significativo da fala2,7.

Infelizmente, não há tratamento ou cura para a SCDC. O que existe é um acompanhamento individualizado, visto que, embora as características sejam parecidas entre os indivíduos portadores desta síndrome, os sintomas e/ou grau de comprometimento são diferentes, portanto, cada indivíduo será tratado de modo particular, de acordo com a especificidade de cada um. De forma geral, vários profissionais cuidam desses indivíduos, como terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, psicólogos, psicopedagogos, médicos e dentistas1.

A educação de crianças com SCDC, como é de conhecimento para a maioria, é de extrema relevância para o tratamento. Para um melhor prognóstico é essencial o desenvolvimento da comunicação, da socialização, da autonomia e das capacidades motoras. A educação é uma garantia básica de todas as crianças e adolescentes e isso é indiscutível, até mesmo porque essa garantia, dentre outras, como as que determinam o direito à saúde, ao bem-estar, à pluralidade e as que proíbem a discriminação, vem expressa em nossa Constituição Federal de 19888.

Da mesma forma, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) (1996) determina que os sistemas de ensino assegurem atendimento aos educandos com necessidades especiais, ou seja, por determinação legal, há mais de 20 anos, as escolas têm a obrigatoriedade de receber e conceder educação inclusiva a qualquer aluno, com qualquer tipo de deficiência9.

A educação é um domínio artificial dos processos oriundos do desenvolvimento. A educação não somente influencia nesses processos, mas também é capaz de reestruturar as funções comportamentais em sua totalidade e, assim sendo, os signos como a fala, escrita, gestual, etc. presentes na educação são elementos culturais de interação e de constituição do ser humano10.

Promover uma educação inclusiva em sua totalidade depende de uma implementação vinculada à existência de uma sociedade que seja também inclusiva. A sociedade precisa “permitir” de forma natural a existência, livre expressão e produtividades das pessoas com necessidades especiais, sejam essas de ordem educacional, pessoal e/ou social6.

A inclusão na escola regular de crianças que manifestam dificuldades de aprendizagem, embora garantida por Lei, ainda apresenta muitos desafios. É importante que a sociedade, os educadores e a instituição escolar façam valer o direito da Educação para todos, buscando constantemente a disponibilidade de serviços de assistência e o sucesso do processo de inclusão escolar. Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº 9394/96), há muito a ser feito no tocante à organização curricular, à metodologia, à avaliação e ao processo de inclusão no ensino regular. Todavia, a mesma lei no Capítulo III, art. 4º, inciso III, destaca que é dever do Estado garantir o atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino9.

A inclusão, nos dias atuais, vem acontecendo nas redes públicas de ensino. Independentemente do tipo de deficiência ou grau de comprometimento, alunos com necessidades especiais frequentam a escola em salas de aula regulares11. No entanto, para que a inclusão ocorra de fato e se solidifique é imprescindível que os professores estejam aptos e preparados. O art. 59, inciso III, da LDB (1996), coloca que os sistemas de ensino devem assegurar aos educandos com necessidades especiais “professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns”9.

Outra participação de extrema relevância na educação e no desenvolvimento de crianças com necessidades especiais é a participação da família, assim como para Paulo Freire “não há educação sem amor […] quem não é capaz de amar os seres inacabados não pode educar […]”, a família também precisa aceitar e promover esforços no sentido de auxiliar o desenvolvimento da criança com SCDC3.

Fiamenghi Jr. e Messa (2007)12, em um estudo que abordava as relações familiares de crianças com deficiências, destacam que:

A família é uma força social que tem influência na determinação do comportamento humano e na formação da personalidade. Pode ser definida como uma unidade social significativa inserida na comunidade imediata e na sociedade mais ampla. É interdependente, ou seja, os relacionamentos estabelecidos entre os familiares influenciam uns aos outros e toda mudança ocorrida nesse sentido irá exercer influência em cada membro individualmente ou no sistema como um todo12.

A família e a escola são responsáveis pela construção do sujeito, assim como de sua autoestima, confiança, expressão das emoções e sentimentos entre outros atributos que personificam o vínculo afetivo e educativo, especialmente de crianças com necessidades especiais13. No entanto, não basta incluir a criança com SCDC ou qualquer outra criança com deficiência na escola de educação regular sem planejamento, sem conhecer as especificidades de cada uma, sua cultura, o contexto que a cerca, entre outros. É imprescindível o afeto, o comprometimento e a capacitação de todos os envolvidos (escola, professor e família). Assim, um sistema educativo inclusivo é um processo político, social, econômico, histórico, pedagógico e possível de ser desenvolvido14.


PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A metodologia utilizada para a efetivação deste estudo foi a abordagem qualitativa e exploratório-descritiva, tendo como instrumento de pesquisa a aplicação de um questionário digital. Além disso, foi realizado um levantamento bibliográfico para servir de embasamento, selecionando livros, artigos científicos, documentos, monografias, dissertações, teses e sites de instituições.

Para o levantamento bibliográfico foram utilizadas as palavras-chaves: aprendizagem; inclusão escolar e síndrome de Cri Du Chat.

O processo de coleta dos materiais (artigos científicos, estudos de caso, etc.) foi realizado de forma não sistemática no período de janeiro de 2020 a outubro de 2020. As bases de dados científicas utilizadas para a pesquisa deste trabalho foram: MEDLINE, LILACS, SciELO e Google Acadêmico.

O processo de coleta dos materiais (artigos científicos, estudos de caso) será realizado de forma não sistemática no período de janeiro a fevereiro de 2022. As bases de dados científicas utilizadas para pesquisa deste trabalho serão: MEDLINE, LILACS, SciELO e Google Acadêmico.

Como critério de inclusão foram utilizados os trabalhos que apresentaram em seus títulos ou resumos os descritores utilizados para a pesquisa e que estivessem relacionados aos objetivos deste trabalho. Como critério de exclusão não foram aceitos trabalhos que apresentaram duplicidade ou publicações recuperadas em mais de uma das bases de dados.

Para tanto, o instrumento utilizado foi uma pesquisa com questões fechadas, elaboradas no formulário Google Forms, disponibilizado na Plataforma Google, com questões dirigidas a professores que atuam na educação básica.

Em relação ao questionário, este foi desenvolvido no formulário Google Forms e direcionado por meio digital aos professores da rede regular de ensino, por intermédio da coordenação escolar, contendo informações sobre a pesquisa, mas com participação anônima e facultativa por parte dos professores. As questões tinham como objetivo avaliar o conhecimento dos professores sobre a SCDC e se estes já trabalharam com crianças com essa síndrome em sala de aula. O questionário apresentava um total de 8 questões, sendo 4 questões de múltipla-escolha e 8 questões abertas (Anexo 1) e ficou disponível para respostas no período de 05/08/2020 a 09/10/2020.


ASPECTOS ÉTICOS

O convite para a realização da pesquisa foi feito aos diretores das escolas, e às instituições que aceitaram foi enviado posteriormente o link de acesso à pesquisa, via e-mail, no qual constava o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), onde todos concordaram em participar da pesquisa e autorizaram o uso e publicação de suas respostas, mediante o compromisso de que a divulgação dos resultados tenha apenas fins científicos e em nenhuma hipótese haveria a identificação dos sujeitos, sendo preservadas a identidade, bem como o nome da instituição em que trabalham.

Relacionado à eventualidade e riscos, conduz a uma possibilidade da perda de dados, levando assim a uma exposição dos conteúdos compactuados via formulário, nesse caso, se houvesse essa ocorrência, seria dada a assistência integral e de forma gratuita conforme a necessidade do participante da pesquisa. Sendo assim, a garantia de que todo conteúdo será armazenado em local seguro, mantendo todo sigilo necessário do participante, todo armazenamento da pesquisa será feito por meio de armazenamento em nuvem, contendo acesso liberado apenas aos pesquisadores; anterior a isso, houve uma disponibilização do termo de consentimento em aceitação à pesquisa disponibilizada ao profissional.

A presente pesquisa passou pela avaliação do Comitê de Ética em Pesquisas (CEP) para análise e posteriormente início da coleta de dados. CAAE 54461521.1.0000.5415


RESULTADOS

A pesquisa foi realizada em 4 escolas de uma Rede Municipal do Noroeste paulista, no período de 5 agosto a 9 de outubro de 2020. Para a coleta de dados, conforme descrito, foi aplicado um questionário de forma digital devido ao fato de as escolas estarem fechadas por conta da pandemia de COVID-19. Por estarem trabalhando de forma remota (em casa) e muito desgastados com afazeres que não faziam parte de suas rotinas, optou-se por aplicar a pesquisa através do Google Forms, pois os professores já apresentavam familiaridade com esse tipo de formulário. O questionário foi direcionado para os grupos dos professores com auxílio das coordenadoras das escolas. Os dados coletados foram organizados em gráficos para facilitar a organização e análise dos resultados. Participaram da pesquisa 27 professores de forma anônima e facultativa.

O questionário apresentava um total de 8 questões, sendo 4 de múltipla-escolha e 4 abertas, assim, os gráficos abaixo representam as respostas enviadas em relação às 4 questões de múltipla-escolha.

Ao serem questionados sobre o fato de conhecer as dificuldades que a criança com SCDC poderia apresentar em seu desenvolvimento, 55,6% dos professores participantes da pesquisa disseram não ter conhecimento sobre essas dificuldades e apenas 14,8% disseram ter conhecimento (Gráfico 1).


Gráfico 1. Conhecimento sobre as dificuldades no desenvolvimento da criança com SCDC. Fonte: Dados da pesquisadora no período de 05/08/2020 a 09/10/2020.



Sobre o fato de durante a formação no curso de Pedagogia os professores terem tido acesso sobre como seria atuar com crianças portadoras de síndromes genéticas como a síndrome de Down, de Edwards, de Klinefelter, de Cri Du Chat, entre outras, 63% dos professores participantes disseram não ter tido acesso e apenas 7,4% relataram que tiveram acesso em como atuar com crianças que apresentavam síndromes genéticas (Gráfico 2).


Gráfico 2.
Acesso no curso de Pedagogia sobre como atuar com crianças portadoras de síndromes genéticas. Fonte: Dados da pesquisadora no período de 05/08/2020 a 09/10/2020.



Foi também questionado aos participantes se estes, como pedagogos, atuaram com crianças portadoras da SCDC e apenas 14,8% dos participantes relataram que já haviam atuado com crianças portadoras desta síndrome (Gráfico 3).


Gráfico 3. Atuação, como pedagogo(a), com crianças portadoras da SCDC. Fonte: Dados da pesquisadora no período de 05/08/2020 a 09/10/2020.



Por fim, em ralação às questões de múltipla-escolha, foi questionado aos professores como se sentiam em relação a estarem preparados(as) ou não para lidar/atuar com crianças portadoras da SCDC e, 66,7% dos professores se sentiam despreparados para atuar com crianças com essa síndrome na sala de aula. Apenas, 7,4% se sentiam preparados. Outros 11,1% se sentiam parcialmente preparados e 11,1% se sentiam parcialmente despreparados (Gráfico 4).


Gráfico 4. Preparo em lidar/atuar com crianças portadoras SCDC. Fonte: Dados da pesquisadora no período de 05/08/2020 a 09/10/2020.



Em relação às questões abertas, as perguntas 5, 6 e 7 só poderiam ser respondidas caso os professores tivessem atuado com a SCDC e, como observado na Gráfico 3, apenas 14,8% dos professores responderam a essas questões que abordavam sobre a maior dificuldade encontrada e sobre as práticas pedagógicas utilizadas. Dos professores que disseram já ter atuado com a SCDC obtiveram-se 2 relatos, e 1 deles, bastante interessante, relatou:

“Quando tive uma criança com esta síndrome, tive pouco apoio da escola, não havia na rede de ensino pessoas que pudessem ajudar, tive o auxílio das educadoras na época somente que ficavam em minha sala para que eu trocasse a criança quando fazia suas necessidades, a alimentação era outro momento difícil, pois tinha que ser batida no liquidificador para que ela não engasgasse, pois, segundo a mãe, se o engasgo acontecesse, poderia levá-la à morte; em relação à parte pedagógica, adequava as atividades para que ela pudesse fazer dentro de suas possibilidades. Foi um ano bem complicado e desafiador…”

Um outro relato bem interessante disse que:

“O primeiro grande empecilho foi a sala numerosa. Uma sala menos numerosa, portanto, menos barulhenta, menos agitada, teria possibilitado a realização de um trabalho um pouco melhor. Depois, conhecer realmente o impacto da síndrome na aprendizagem do/a educando/a. Havia orientação, inclusive de pessoa que deveria ser qualificada, mas era algo sempre muito genérico. A partir do 6º ano, o/a aluno/a passa a tomar contato com professores especialistas, diferente da realidade vivida nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Então, muitas vezes, adaptar/flexibilizar o conteúdo era uma tarefa exaustiva, pois faltava um norte a ser seguido…”

Em relação às práticas pedagógicas, o(a) participante acima escreveu que sua atuação se dava através da utilização de imagens (figuras do livro didático, representações contidas na apostila, entre outras) e música. E acrescentou: “Claro que não havia condições de fazer todos os dias, mas sempre que possível, fazia”.

Infelizmente, muitas das questões 5, 6, 7 e 8 não foram respondidas, impossibilitando sua tabulação e mais informações.


DISCUSSÃO

Após esclarecimentos e levantamento bibliográfico sobre a SCDC, suas características, diagnóstico e dificuldades que podem apresentar o indivíduo portador desta síndrome, pôde-se observar que há poucos estudos e/ou relatos sobre o desenvolvimento de crianças portadoras dela, especialmente no âmbito escolar. Como observado nesta pesquisa, poucos professores conheciam a SDCD (14,1%) ou trabalharam com crianças em sala de aula. Para os pesquisadores Drago et al. (2014)6, por se tratar de uma síndrome sem cura e com prognóstico individual, o acompanhamento de crianças com SCDC deve ser realizado de forma particular e por profissionais diversos e conhecedores da síndrome e suas limitações.

Neste trabalho de pesquisa, observou-se ainda uma dificuldade em relação ao respaldo da escola e a falta de conhecimento sobre síndromes genéticas, visto que a maioria dos participantes desta pesquisa relataram não se sentir preparados (66,7%) para atuar ou lidar com crianças com essa síndrome.

Embora a legislação brasileira tenha avançado bastante em relação à inclusão, ainda há muitas barreiras, preconceito e despreparo profissional6. Não se pode deixar de pensar que para vivenciar a inclusão não basta apenas ter legislação favorável, é preciso promover mudanças no sistema de ensino, levando em consideração o contexto socioeconômico e professores especializados para atendimento educacional especializado3.

Em nossa pesquisa há um relato de um(a) professor(a) em que é mencionada a falta de apoio por parte da escola onde lecionava e a dificuldade em adaptar conteúdos pela falta de conhecimento. Outro dado importante em nossa pesquisa foi a menção de um profissional sobre se ter um ou mais alunos com necessidades especiais em uma sala com muitas crianças sem um professor auxiliar.

O estudo sobre a SCDC discorre sobre a falta de conhecimento sobre a síndrome e pontua também o papel da família, pois se a família não entende o seu papel na inclusão do seu filho na escola regular, e, especialmente se faltar apoio à família nesse processo por parte da escola, o desenvolvimento da criança com SCDC ficará comprometido3.

Sobre as práticas pedagógicas que foram trabalhadas por professores que participaram desta pesquisa, apenas 2 participantes fizeram menção sobre suas práticas, reforçando a dificuldade e a falta de apoio e, assim, acabaram por adaptar atividades quando se era possível.

É indiscutível, para muitos estudiosos em educação inclusiva, que há muito ainda a ser feito para que a educação ocorra de maneira satisfatória, com qualidade e

equidade, levando em consideração as especificidades de cada criança portadora de necessidades especiais sem se esquecer do afeto, compromisso e qualificação profissional2,6,15,16

Assim, com base nos achados da pesquisa em questão e nos achados da literatura, foi possível refletir sobre a SCDC e seu pouco conhecimento entre os profissionais da educação.


CONCLUSÃO

A presente pesquisa buscou refletir sobre a SCDC, suas características e as dificuldades apresentadas no ambiente escolar (inclusão). Para isso, levantaram-se informações acerca da SCDC e a inclusão de crianças portadoras dessa síndrome na escola regular de ensino.

No entanto, verificou-se uma escassez na literatura sobre o tema proposto para esta pesquisa e, em virtude disso, optou-se por aplicar um questionário entre os professores da educação básica, a fim de buscar mais informações e conhecimento.

É importante destacar que muito se avançou, inclusive na legislação brasileira, em relação à educação inclusiva, porém é possível observar também que ainda há muitos obstáculos e falta de profissionais especializados para o atendimento educacional especializado, assim como verificado nos relatos da presente pesquisa.

Pôde-se observar, também, que a questão da inclusão das crianças com SCDC, bem como com outras deficiências necessita ainda de muitas mudanças para que ela ocorra em sua totalidade.

Como conclusão, verificou-se que um número muito pequeno de professores conhece a SCDC, suas características ou dificuldades, e que não tiveram contato com a síndrome nem em sala de aula nem em sua formação acadêmica, tornando assim o processo de inclusão das crianças com essa síndrome num caminho ainda a ser desenvolvido com base no conhecimento, afeto, amor e respeito às diferenças.


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1. FAMERP - Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Programa de Pós-Graduação de Ciências da Saúde - São José do Rio Preto - São Paulo - Brasil
2. UNIRP - Centro Universitário de Rio Preto, Curso de Psicologia - São José Do Rio Preto - São Paulo - Brasil
3. Faculdade Futura, Pedagogia - Votuporanga - São Paulo - Brasil

Endereço para correspondência:

Gerardo Maria de Araújo Filho
Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto
Av. Brigadeiro Faria Lima, 5416 – Vila São Pedro
São José do Rio Preto, SP, Brasil. CEP: 15090-000
E-mail: filho.gerardo@gmail.com

Data de Submissão: 26/10/2021
Data de Aprovação: 09/05/2022