ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Caso Clínico Interativo - Ano 2023 - Volume 13 - Número 3

Disfonia e estridor em paciente pediátrico

Dysphonia and stridor in a pediatric patient

RESUMO

Tem o intuito de relatar um caso interativo de um paciente pediátrico internado com quadro de disfonia, estridor e esforço respiratório progressivo, ressaltando os diagósticos diferenciais e tratamento.

Palavras-chave: Disfonia, Diagnóstico diferencial, Sons respiratórios, Dispneia, Criança.

ABSTRACT

It aims to report an interactive case of a pediatric patient hospitalized with dysphonia, stridor and progressive respiratory effort, highlighting the differential diagnoses and treatment.

Keywords: Dysphonia, Respiratory sounds, Diagnosis, differential, Child.


Paciente com 9 anos, masculino, chega à emergência trazido pela mãe com a queixa de estridor, rouquidão e chiado no peito. Sinais vitais estáveis, mantendo saturação >97% em ar ambiente. Paciente em bom estado geral, hidratado, corado, acianótico, boa perfusão capilar periférica, afebril. Aparelho respiratório: murmúrios vesiculares uniformemente distribuídos, com sibilos inspiratórios e expiratórios, estridor laríngeo de repouso, disfonia, tiragem subcostal leve, leve retração de fúrcula e batimento de asa nasal. Aparelhos cardiovascular, abdominal, genital e neurológico: sem alterações. Paciente previamente hígido, nega intubações, comorbidades ou alergias. Quadro clínico de 3 meses de evolução. Procurou atendimento em serviços de saúde em diversas ocasiões, sendo sempre liberado para casa com corticoide ou anti-inflamatórios. Esteve internado por uma semana em outro hospital, o qual recebeu diagnóstico e tratamento para asma e fora liberado para casa com salbutamol. Ainda com dispneia, odinofagia e tosse a mãe do paciente resolveu levá-lo à outra emergência pediátrica logo após a alta hospitalar.


1. Qual a principal hipótese diagnóstica?

A Laringomalácia.
B Hemangioma subglótico.
C Laringite.
D Papiloma laríngeo.
E Asma.

D) Papiloma laríngeo.

Resposta

A papilomatose laríngea (PL) é uma doença relativamente rara na prática clínica, porém é a neoplasia benigna mais frequente nas crianças. Causada pelo HPV, principalmente subtipos 6 e 11 e caracteriza-se pela presença de lesões proliferativas exofíticas e recidivantes sobre a mucosa das vias aérea, em especial na laringe. 1,2 O diagnóstico é feito geralmente entre 2 a 5 anos de idade, um ano após início dos sintomas que em 75% das crianças iniciam antes dos 5 anos de idade. 3

De maneira geral, inicia-se na comissura e terço anterior das pregas vocais, podendo afetar, posteriormente, todas as porções da laringe, envolvendo, em alguns casos, também traqueia, brônquios e parênquima pulmonar. As lesões são geralmente múltiplas, raramente solitárias. Em casos avançados, as múltiplas lesões vegetantes confluem, ocluindo a luz glótica, e estendendo-se, muitas vezes, às estruturas da supraglote e da subglote. 2

O primeiro sintoma de alerta é a disfonia. A alteração da voz é descrita como rouca ou fraca, sendo persistente e progressiva, sem períodos de voz normal. O estridor, outrossim, é outro sinal de alerta que se apresenta principalmente na inspiração. 3 Além desses, outros sintomas incluem ronco e apneia do sono, tosse crônica, infecções respiratórias recorrentes, disfagia e retardo de crescimento. 2,3


Após avaliação inicial, solicitados exames: Raio-X de tórax, o qual não evidenciou nenhuma alteração, e Raio-X de coluna cervical lateral que evidenciou obstrução de via aérea alta.


2. Qual o exame de escolha para iniciar a investigação do caso?

A Tomografia com contraste.
B Laringoscopia.
C Ressonância magnética.
D Radiografia de tórax PA e perfil.
E Prova de função respiratória.

B) Laringoscopia.

Resposta

O quadro clínico pode ser desafiador. O diagnóstico de asma, nódulos vocais, crupe, alergia ou bronquite antes do diagnóstico definitivo não é incomum. Devemos estar atentos a sintomas respiratórios recorrentes ou progressivos, que não seguem o curso natural das doenças mais comuns e não melhoram com o tratamento convencional.3 O atraso no diagnóstico pode levar à obstrução das vias aéreas superiores. À medida que os PL aumentam de tamanho, eles começam a obstruir as vias aéreas, manifestando-se com falta de ar progressiva e estridor inspiratório agudo.1,3

A transmissão da doença não está totalmente compreendida; no entanto, a transmissão sexual e vaginal durante a gravidez é discutida, uma vez que crianças podem adquirir a doença no canal de parto, após contato com condiloma acuminado. 1


A fim de investigação diagnóstica, solicitada avaliação da otorrinolaringologia a qual sugeriu e realizou exame de nasofibroscopia: evidenciou lesão de aspecto papilomatoso obstruindo a luz glótica (vídeo no link: https://youtube.com/shorts/-1bxA0wQpJY?feature=share).


3. Qual a conduta terapêutica inicial indicada?

A Antibiótico intravenoso.
B Acompanhamento clínico.
C Ressecção cirúrgica.
D Propranolol.
E Pulsoterapia com corticoide.

C) Ressecção cirúrgica.

Resposta

O manejo, tanto clínico quanto cirúrgico, visam uma via aérea segura, melhorar a qualidade da voz, reduzir a extensão da doença e aumentar o intercalo de tempo entre cirurgias. Antibióticos, hormônios, eletrocoagulação, crioterapia, radiação, ultra-som, exérese cirúrgica, vacina autógena, aplicação intralesional de cidofovir e utilização de microdebridador: métodos utilizados para o tratamento das lesões e utilizados muitas vezes como adjuvantes. Porém, nenhuma medida foi suficientemente eficaz no controle de múltiplos papilomas e recorrências. O tratamento convencional segue sendo a remoção das lesões com pinça fria ou por vaporização a laser. Esse último assegura uma boa hemostasia, principalmente em lesões friáveis. 3,4


Realizada a ressecção unilateral do papiloma em bloco cirúrgico e optado por não remoção bilateral para evitar sinéquias. Material enviado para anatomopatológico diagnosticou com papiloma escamoso do tipo viral.


4. Qual o prognóstico desta condição?

A Bom. Doença autolimitada.
B Alta probabilidade de recidiva.
C Se manejo conservador, alta probabilidade de malignização.
D Transformação maligna é comum.

B) Alta probabilidade de recidiva.

Resposta

No cenário atual não existe um tratamento curativo para a doença. No Brasil, a vacinação contra o HPV foi introduzida em 2014, contudo, infelizmente não existem dados na literatura que informem o número de crianças com PL que foram vacinadas ou encaminhadas para vacinação. 1,3


Após procedimento, paciente sem sinais de esforço respiratório, em condições de alta hospitalar com retorno para seguimento ambulatorial com equipe da otorrinolaringologia, com planos de nova ressecção.


REFERÊNCIAS

1. Mercuri G, Rodrigues SA, Martins RHG. An estimate of the incidence and prevalence of laryngeal papillomatosis in São Paulo State (Brasil). Rev Assoc Med Bras. 2020 Sep;66(9):124751. DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9282.66.9.1247.

2. Cuestas G, Rodriguez V, Doormann F, Munzón P, Munzón G. Papilomatosis laríngea: una causa poco frecuente de disfonía en el niño. Serie de casos. Arch Argent Pediatr. 2018 Jun;116(3):e471-5. DOI: https://doi.org/10.5546/aap.2018.e471.

3. Ximenes Filho JA, Simoceli L, Imamura R, Tsuji DH, Sennes LU. Papilomatose laríngea recorrente: experiência de 10 anos. Rev Bras Otorrinolaringol. 2003 Out;69(5):599-604. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-72992003000500003

4. Barros B, Orlando S, Almeida M, Costa P, Estanislau N, Pinto L. Disfonia e estridor em lactente. Resid Pediátr. 2013 Apr;3(1):17-20. DOI: https://doi.org/10.25060/residpediatr













1. Hospital da Criança Conceição - Porto Alegre - Rio Grande do Sul - Brasil
2. Universidade do Vale do Taquari - Lajeado - Rio Grande do Sul - Brasil

Endereço para correspondência:

Alice de Mora Vogt
Hospital da Criança Conceição
Rua Álvares Cabral, nº 565, Cristo Redentor
Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 91350-250
E-mail: alicedmvogt@gmail.com

Data de Submissão: 24/01/2023
Data de Aprovação: 10/05/2023