ISSN-Online: 2236-6814

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Artigo de Revisao - Ano 2024 - Volume 14 - Número 4

Meningomielocele e seu manejo na genética pediátrica: uma revisão de tema de seus aspectos biomédicos e psicossociais

Meningomyelocele and its management in pediatric genetics: A theme review of its biomedical and psychosocial aspects

RESUMO

OBJETIVOS: Este estudo tem como objetivo analisar a mielomeningocele como uma anomalia congênita prevalente e seus aspectos patológicos gerais, além de destacar medidas potencialmente protetivas e a importância da atenção pediátrica multiprofissional.
MÉTODOS: Foi realizada uma revisão de literatura do assunto, abrangendo estudos sobre mielomeningocele e espinha bífida. Foram analisados, interpretados e reunidos dados epidemiológicos, aspectos patológicos e medidas de prevenção primária, como o consumo de ácido fólico e vitamina B12.
RESULTADOS: A mielomeningocele é a manifestação mais comum de espinha bífida, resultante do não fechamento do tubo neural. Pode ser influenciada por fatores genéticos e ambientais. O consumo de ácido fólico e vitamina B12 tem sido associado à redução do risco de malformações congênitas, incluindo a mielomeningocele. No entanto, essas medidas não eliminam completamente os casos.
CONCLUSÃO: A prevenção primária da mielomeningocele envolve a conscientização sobre a importância do consumo de ácido fólico. No entanto, é fundamental reconhecer que essas medidas por si só não são suficientes para erradicar totalmente a doença. A atenção multiprofissional desempenha um papel crucial na melhoria da qualidade de vida dos pacientes, através de uma abordagem longitudinal e contínua nas redes de atenção.

Palavras-chave: Meningomielocele, Deficiência de ácido fólico, Anormalidades congênitas, Prevenção primária, Defeitos do tubo neural.

ABSTRACT

OBJECTIVES: This study aims to analyze myelomeningocele as a prevalent congenital anomaly and its general pathological aspects, while highlighting potentially protective measures and the importance of multiprofessional care.
METHODS: A theme review was conducted, encompassing studies on myelomeningocele and spina bifida. Epidemiological data, pathological aspects, and primary prevention measures such as the consumption of folic acid and vitamin B12 were analyzed, interpreted, and compiled.
RESULTS: Myelomeningocele is the most common manifestation of spina bifida, resulting from the incomplete closure of the neural tube. It can be influenced by genetic and environmental factors. The consumption of folic acid and vitamin B12 has been associated with a reduced risk of congenital malformations, including myelomeningocele. However, these measures do not completely eliminate cases.
CONCLUSION: Primary prevention of myelomeningocele involves raising awareness about the importance of consuming folic acid and vitamin B12. However, it is essential to recognize that these measures alone are not sufficient to eradicate the disease entirely. Multiprofessional care plays a crucial role in improving patients quality of life through a longitudinal and continuous approach within care networks.

Keywords: Meningomyelocele, Folic acid deficiency, Congenital abnormalities, Primary prevention, Neural tube defects.


INTRODUÇÃO

Na contemporaneidade, a garantia de qualidade de vida seguindo uma visão holística e longitudinal de saúde tem sido prioridade de políticas públicas e ações que regem a esfera privada de considerada parte dos indivíduos nas mais diversas localidades. Com a formação de tal demanda, a garantia da prevenção e do tratamento adequado de anomalias congênitas se levanta como um dos pontos mais importantes e uma questão de saúde pública relevante1.

Entre tais condições de saúde, a mielomeningocele (MMC) se faz notável por diversos fatores, tais como a possibilidade de haver apresentação de gravidade elevada em comparação a outras condições, a prevalência considerável, a importância das tentativas de prevenção pelo consumo prévio de ácido fólico2, além de seu campo amplo de comorbidades manifestas ainda na infância ou já na vida adulta, com sua maioria sendo pouco estudada ou até mesmo negligenciada. Epidemiologicamente, representa uma das principais alterações neurológicas congênitas, que, por sua vez, são a segunda área mais comum de anomalias congênitas em neonatos internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI)3.

Levando esses argumentos em consideração, cabe aos profissionais da saúde apoderar-se de estudos e resultados precisos das nuances dessa doença e suas maiores implicações clínicas, a fim de propiciar aconselhamento gestacional correto, orientar futuros pais e auxiliar estes na busca por evitar exposição aos fatores de risco e garantir atendimentos resolutivos e eficazes no ponto de vista terapêutico, marcados pelo diagnóstico assertivo e pela minimização dos danos4.

Em síntese, deve haver uma articulação de saberes e de profissionais para um manejo correto e individualizado de cada caso5.


METODOLOGIA

O resumo consiste em uma revisão bibliográfica com base descritiva realizada a partir da análise de artigos científicos publicados nas bases de dados: PubMed, PubMed Central e Bookshelf. Utilizou como descritores: "Mielomeningocele", "Deficiência de Ácido Fólico", "Anomalias Congênitas", ''Prevenção Primária" e "Defeitos no Tubo Neural", estando as terminologias utilizadas de acordo com o Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). A busca dos artigos foi feita entre janeiro de 2022 e novembro de 2023, por meio de periódicos e livros eletrônicos na internet (Figura 1).





Posteriormente, os materiais foram selecionados utilizando os seguintes padrões de inclusão: abordagem temática, escrita original em inglês, português ou espanhol, artigo disponível na versão completa ou resumida, livros eletrônicos e estudos em humanos, enquanto os padrões de exclusão foram: indisponibilidade de artigos na sua forma de leitura integral, artigos que não abordassem a atenção pediátrica da doença e que apresentavam informações destoantes dos consensos atualizados da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia ou da Sociedade Americana de Neurocirurgia (Quadro 1). Foram analisados 69 artigos, dos quais 41 foram efetivamente triados pelos critérios de inclusão e que serviram como base para este trabalho.





Embriologia

Durante o processo embriológico de neurulação primária, o folheto ectodérmico se dobra e dá início à sua forma de tubo. Nesse ponto, ainda existem espaços abertos nas extremidades do tubo, conhecidos como neuróporos caudal e rostral, localizados, respectivamente, nas extremidades de mesmo nome, que logo deverão ser fechados pela migração de células mesodérmicas6 (Figura 2).





Independentemente e concomitante a esse processo, um agrupamento de células de massa caudal forma o tubo secundário chamado de eminência caudal, que se funde ao tubo neural produzido na neurulação inicial7.

Entre a 3ª e a 4ª semana de desenvolvimento embrionário, espera-se que o tubo neural em formação já tenha se fechado (Figura 3), entretanto nem sempre esse processo ocorre plenamente, o que pode ocasionar diversas malformações classificadas de modo geral como Defeitos do Tubo Neural (DTN), especialmente os defeitos do tipo "aberto", haja vista os defeitos "fechados" sejam associados prevalentemente à neurulação secundária.





Dentro desse abrangente grupo de problemas, enquadra-se a espinha bífida, condição marcada pela abertura da parte posterior do arcabouço ósseo componente da coluna vertebral8. Essa abertura, por sua vez, pode propiciar a protusão de elementos do sistema nervoso central que deveriam estar internalizados e protegidos, como meninges e elementos medulares e nervosos, relacionando-se com o diagnóstico de mielomeningocele9 (Figura 4).





Fatores causais

Como fatores de risco, existem fatores genéticos e ambientais (Quadro 2). No campo do estudo dos possíveis genes correlatos, existem diversos candidatos, com considerável parte destes relacionando-se com a metabolização do ácido fólico10, que podem sofrer mutações e implicar o processamento limitado do folato e maior susceptibilidade à patologia. Ainda, existem outros elementos genéticos de etiologias e funções não associadas diretamente com o componente vitamínico, como o GLUT3, cuja correlação e impacto na doença ainda são pouco explicados na literatura11. Além disso, figuram entre os aspectos ambientais a presença de doenças crônicas maternas prévias à gestação, como hipertensão arterial e diabetes, a subnutrição e carência alimentar generalizada e a exposição de gestantes ao álcool e a fármacos como a carbamazepina, a varfarina, o ácido retinoico e o ácido valproico12-14.





Epidemiologia e dados relacionados

Nos Estados Unidos da América, a prevalência de DNT, em específico a MMC e a anencefalia, é de cerca de 0,5-1,0:1.000 indivíduos8. Em comparação com os resultados de 1990-1998, momento no qual ainda não havia a implementação da política de inserção do ácido fólico em alimentos, houve uma projeção de queda no número de casos relatados em 26%. Contudo existe grande variabilidade em índices a depender da localidade e de especificidades como distribuição genética local e acesso a determinantes do processo saúde-adoecimento, fatores esses que contribuem para uma epidemiologia bastante heterogênea entre localidades distintas de um mesmo país e ainda mais entre nações diferentes, o que reforça a importância da autonomia e atenção na vigilância.

Especificamente sobre MMC, os dados nacionais variam entre 0,83 e 1,87 para cada 1.000 nascidos vivos15,16.

Apesar de a maior parte dos casos serem frutos de padrões multifatoriais, nos quais ocorre convívio de teor genético e de fatores socioambientais, aproximadamente 2-16% das patologias relatadas são relacionadas com distúrbios cromossômicos ou de gene único definido, o que é refletido em dados como o de 53% dos fetos abortados de modo espontâneo com espinha bífida terem alterações de cariótipo de ordem balanceada ou desbalanceada. Assim sendo, faz-se imprescindível o acompanhamento genético e a solicitação de cariotipagem por líquido amniótico quando houver diagnóstico prévio ou suspeita clínica em período pré-natal.

Relacionado aos fatores maternos e externos, o uso de medicações anticonvulsivantes, anticoagulantes e derivados da vitamina A durante o primeiro trimestre deve ser considerado, pois há um aumento de risco de 1-2%. Ademais, taxas de sobrepeso ou obesidade, somadas à presença de comorbidades crônicas, podem elevar a chance de se gerar um filho com mielomeningocele para cerca de 35%, podendo, ainda, haver maior resistência ao fator preventivo do ácido fólico, se comparado com gestantes sem esses mesmos elementos12.

Prevenção

Pela possibilidade de múltiplos fatores causais, existem diversas medidas de importância no cuidado antes e durante a gestação que devem ser tomadas a fim de reduzir a prevalência de casos1.

Assim sendo, a suplementação de ácido fólico se ergue como principal prevenção, uma vez que a carência (seja pela ausência total ou redução de reposição) pode alterar os fatores epigenéticos e mecanismos de síntese, reparo e desenvolvimento de DNA do embrião ou do feto, uma vez que há grande plasticidade de material genético no período intraútero, com a necessidade de realizar e desfazer constantemente metilações estratégicas de genes, e esse processo carece do auxílio desse composto para acontecer2.

No tocante à dosagem de folato, estudos indicam que as gestantes devem consumir cerca de 600-750mcg/dia, seja por meio de alimentos como vegetais verdes, frutas em gerais e nozes ou por meio de suplementações advindas de políticas governamentais de segurança alimentar, das quais se destaca o enriquecimento da farinha de trigo com o nutriente e, consequentemente, todos os seus derivados2.

Com isso, é crescente o apelo mundial de expansão das políticas de fortificação alimentar e educação nutricional, dado o sucesso já obtido e as perspectivas de redução de casos em escala mundial16.

Outrossim, a ampliação e acessibilidade do acompanhamento pré-natal também devem ser prioritárias para formular e descartar hipóteses diagnósticas de MMC de modo assertivo, gerir eventuais casos e aconselhar a família. As práticas que envolvem educação coletiva e manejo dos determinantes do processo saúde-doença também foram fundamentais para prevenção.

Diagnóstico

Atualmente, dada a ampliação dos procedimentos corretivos antes das 26 semanas de gestação, a análise diagnóstica no período pré-natal tornou-se padrão fundamental para firmar bom prognóstico e melhor consolidar uma linha de cuidado longitudinal pautada no tratamento e no aconselhamento genético17.

Comumente, o diagnóstico é firmado por exames de ultrassom, principalmente a partir do segundo trimestre. Pode ser realizada a ressonância magnética fetal quando houver a necessidade de cirurgia. Além disso, pelo fato de cerca de 5-20% dos casos serem refletidos em alterações genéticas, o cariótipo e os testes moleculares do feto em desenvolvimento também são importantes para compreender a etiologia em um ponto secundário da investigação12.

É importante que a equipe multiprofissional realize a articulação de condutas com o acompanhamento geral, para que sejam dimensionadas comorbidades, cirurgias e conturbações na gestação em curso, além da existência da gravidez de risco e partos prematuros4,5.

A despeito de sua importância inquestionável no estudo da mielomeningocele, a avaliação pré-natal ainda demanda mais evidências que unam de forma direta e precisa a presença de comprometimentos, em especial da área cognitiva, e a malformação em discussão.

Aconselhamento genético

No Brasil, o aconselhamento genético pré-natal cresce de modo significativo, por mais que os casos de DTN como um todo estejam em queda devido ao incremento de políticas de suplementação alimentar18. De modo geral, essa ferramenta possui vasta utilidade referente ao controle, minimização e manejo dos riscos gestacionais para a mãe, seu bebê e, até mesmo, as futuras gerações. Em sua perspectiva prospectiva, é centralizada na orientação acerca do consumo de ácido fólico antes da fecundação, além de formatação de heredograma e planejamento familiar no aspecto longitudinal do cuidado. Já em sua perspectiva retrospectiva ou pré-natal, deve ser realizado um manejo de estudos frequente e detalhado dos exames de imagem e investigação de anomalias associadas, manutenção de canal comunicativo entre toda a família para com a gestante e categorização de grupos e fatores de risco com base nos elementos genéticos para eventuais cirurgias intrauterinas de correção da anomalia congênita19.

O risco de recorrência depende da causa da MMC. Nos casos isolados, a herança geralmente é multifatorial, mas nos casos em que há outras anomalias congênitas associadas, deve-se realizar testes genéticos para definir se há cromossomopatia ou doença monogênica, mudando totalmente o risco de recorrência, que pode ser mais elevado20.

Procedimentos corretivos

Consiste em um procedimento que visa corrigir o defeito vertebral e evitar a exposição dos conteúdos nervosos. Historicamente, a reparação intrauterina da MMC foi o primeiro procedimento corretivo viável e eficaz de uma condição que não é intrinsecamente letal, realizado ainda com a gestação em curso nos grupos humanos. Conforme resultados divulgados pelo estudo randomizado MOMS (Estudo Multicêntrico da Gestão de Mielomeningocele), o procedimento aberto ainda durante a gestação garante melhor resposta do feto, maior capacidade motora e maior segurança de integridade neural, se comparado ao mesmo procedimento em momento pós-natal, porém esses dados estão mudando21-24.

Assim sendo, quando se tem o diagnóstico pré-natal, o fechamento do tubo neural na parte caudal deve ser antecipado, a fim de reduzir o tempo de exposição de conteúdo nervoso com o meio amniótico e, posteriormente, evitar a exposição com o ambiente externo. Entretanto, as possíveis complicações obstétricas dos procedimentos devem ser levadas em conta, haja vista a necessidade de acesso por via de histerotomia laparoscópica, o que pode gerar maior risco de ruptura de membranas, prematuridade e formações císticas, aspecto relevante que mantém a importância da conduta operatória pós-natal para quadros de risco25.

Ademais, inerente à modalidade de cirurgia, a infecção secundária, além de mortalidade secundária à Malformação de Chiari I e descompensação de quadro prévio de hidrocefalia, pontua como o desfecho negativo mais robusto26.

Em síntese, na dicotomia entre os métodos corretivos pré ou pós-natais, devem ser levados em conta aspectos gerais como melhor prognóstico, perspectiva de vida e êxito no manejo de limitações motoras e nervosas para o feto sem, contudo, ignorar os riscos ao parto e ao restante da gestação, bem como a integridade da mãe. Dessa forma, deve haver um claro canal de comunicação entre o profissional da saúde e a família, a fim de explicitar os principais pontos correlatos com a escolha, respeitando a força deliberativa dos pacientes27,28.

Manejo neonatal de grupos não submetidos a cirurgia intrauterina

Apesar da enorme importância do manejo intrauterino de pacientes com mielomeningocele, entre os grupos que tiveram diagnóstico apenas no pós-parto ou não foram elegíveis à modalidade cirúrgica (Quadro 3), intensos cuidados multidisciplinares são requeridos a fim de otimizar a sobrevida e reduzir morbimortalidades em uma linha geral. Com isso, visando reduzir o risco eminentemente de infecções, deve-se preconizar que a correção cirúrgica ocorra em até 24 horas do pós-parto imediato, cujo foco central é a redução de infecções locais e sepse neonatal e a reconstrução da anatomia funcional do neonato, preservando o máximo de tecido nervoso possível29.





A abordagem imediata principia com a avaliação pré-operatória dos pacientes, de modo que possa contemplar visualização e compreensão das dimensões da malformação tanto por ectoscopia como pela realização de exames de imagem, como Ressonância Nuclear Magnética, além de ser estudada a compreensão do estado geral da criança, frisando suas fragilidades e demandas específicas. No ato cirúrgico em si, é feito o reposicionamento do tecido medular, com o posterior fechamento da pele. Ademais, havendo presença de hidrocefalia, também deve ser estudada a alocação de shunt ventriculoperitoneal para drenagem do liquor excedente. Por fim, deve ser feito um íntimo acompanhamento pós-operatório, com consequente encaminhamento para atenção multidisciplinar de cuidados variados, que podem envolver manejo ortopédico, ocupacional, nefrológico e fisioterápico30-32.

Sintomatologia e complicações

Pode haver diversas manifestações clínicas, variando em gravidade e comprometimento do desenvolvimento geral. Em um cenário abrangente, os principais quadros e sintomatologias associados à condição foram:

Malformação de Chiari II:

Quadro patológico que pode acompanhar pacientes com mielomeningocele em 95% dos casos. Trata-se da herniação de conteúdos neuronais posteriores pelo forame magno dilatado, em específico o quarto ventrículo e parte da medula, e está relacionado com hidrocefalia, aumento de pressão e degeneração neuronal4,28,32-34.

Comprometimento cognitivo:

Ensaios clínicos comprovam que, em testes cognitivos gerais, o score atingido por indivíduos com MMC é significativamente menor do que o obtido por crianças/adolescentes saudáveis. Entretanto, muitas vezes, esse resultado pode ser produto de outras condições comuns à amostra, como hidrocefalia35.

Apesar disso, a forte correlação geral entre a patologia em si e os comprometimentos da área cognitiva não pode ser desconsiderada. Áreas como avaliação de QI verbal e de raciocínio intelectual e motor de ritmicidade obtiveram resultados que reforçam a ideia de comprometimentos; nos estudos de linguagem verbal espontânea, houve pouca diferença entre o grupo-caso e o grupo-controle36.

Má oxigenação durante o sono por problemas respiratórios:

Distúrbios de natureza respiratória e seus reflexos no sono são fatores de alto comprometimento da qualidade de vida e da segurança em saúde da população em geral. Apesar de ainda não possuir dados epidemiológicos bem descritos, estudos transversais apontaram prevalência de Índice de Apneia-Hipopneia (AHI) >2,5 em 42% dos casos com MMC, associado a um pior quadro clínico e manifestação mais grave da doença37-39.

Problemas motores:

Nas diversas classificações da doença, problemas de deambulação são variáveis e relativamente comuns. A limitação de mobilidade torna-se preocupante por ser elemento perpetuador de estigmas sociais, depressor de estima pessoal e potencialmente causa de sedentarismo, obesidade e causas secundárias de problemas em saúde.

Como medidas interventivas, a fisioterapia e o acompanhamento com psicólogos e educadores físicos, articulados com a logística médica, podem minimizar os danos e garantir melhor desempenho motor ao longo da vida39.

Incontinência fecal e urinária:

A existência de crises periódicas de constipação pode ocasionar a incontinência fecal, um sintoma que pode ser frustrante e limitador para grandes grupos. Acerca de sua conduta corretiva, o ponto de partida é um método conservador, seguido por irrigação transanal, que teve sua eficácia e segurança comprovada por estudos recentes.

Sobre o fluxo urinário, bexiga neurogênica e desvios, são manifestações comuns nesses casos, ocasionadas por contrações involuntárias e repentinas do músculo detrusor da bexiga devido ao dano de conteúdo neural. O uso de cateterismo intermitente limpo e a administração de fármacos anticolinérgicos surgem como padrão-ouro para resolução40,41.


CONCLUSÃO

A melhoria da qualidade de vida e a redução da morbimortalidade devem ser o foco de todos que lidam com pacientes com MMC. É importante que seja reforçado o papel de políticas públicas alinhados com o trabalho da equipe médica e multiprofissional devidamente capacitada e sensível às demandas em conjunto com os grupos nucleares de família informados e proativos. Dessa forma, pode haver prevenção em uma esfera primária, secundária, terciária e quaternária de modo democrático, expansivo e ético.


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1. Centro Universitário Christus, Estudante de Medicina - Fortaleza - Ceará – Brasil
2. Universidade Federal do Vale do São Francisco, Estudante de Medicina - Paulo Afonso - Bahia – Brasil
3. Universidade Federal do Caririri, Estudante de Medicina - Barbalha - Ceará – Brasil
4. Hospital Infantil Albert Sabin, Médico do Ambulatório de Genética Pediátrica - Fortaleza - Ceará – Brasil
5. Centro Universitário Christus, Professora de Genética Básica - Fortaleza - Ceará - Brasil

Endereço para correspondência:
Luan Nogueira Duarte
Centro Universitário Christus, Estudante de Medicina - Fortaleza - Ceará - Brasil
R. João Adolfo Gurgel, 133 - Cocó
Fortaleza - CEP, 60192-345
E-mail: luan.duo.com@gmail.com; luan.duo2020@gmail.com

Data de Submissão: 03/07/2023
Data de Aprovação: 15/01/2024