ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo Original - Ano 2025 - Volume 15 - Número 1

Precepção dos profissionais de saúde em um hospital escola sobre cuidados paliativos em pediatria

Perception of healthcare professionals in a teaching hospital about palliative care in pediatrics

RESUMO

Resumo A filosofia do cuidado paliativo diz respeito a maximizar a qualidade de vida de uma pessoa. Através de suporte físico, social, psicológico, espiritual e familiar, de uma forma significativa e efetiva, é permitido ao paciente a possibilidade de ser ele mesmo em um momento de dificuldade. Trata-se de uma pesquisa quanti-qualitativa, que utilizou de técnicas de entrevista estruturada e semiestruturada, realizada em Goiânia, com uma amostra de 30 profissionais de saúde, que estavam ativamente trabalhando em setores do Departamento de Pediatria do Hospital das Clínicas de Goiás - EBSERH. A média de idade dos participantes foi de 30,97 anos, com predominância do sexo feminino. Aproximadamente 56,7% eram solteiros e os(as) médicos(as) foram os mais prevalentes no estudo. Em relação aos questionários, a maioria afirmou sentir insegurança ao falar sobre cuidados paliativos, além de afirmar que não acredita no preparo da equipe frente a essa temática. Os resultados da entrevista semiestruturada foram dispostos em tópicos, sendo que os mais prevalentes foram capacitação, cuidado e comunicação. Há a necessidade de se ampliar a discussão acerca dos CPP, para melhor aplicação de seus princípios.

Palavras-chave: Cuidados paliativos, Pediatria, Criança, Percepção.

ABSTRACT

Abstract The philosophy of palliative care is about maximizing a persons quality of life. Through physical, social, psychological, spiritual and family support, in a meaningful and effective way, the patient is given the possibility of being themselves in a time of difficulty. This is a quantitative-qualitative research, which used structured and semi-structured interview techniques, carried out in Goiânia, with a sample of 30 health professionals, who were actively working in sectors of the Pediatrics Department of the Hospital das Clínicas de Goiás - EBSERH. The average age of the participants was 30.97 years, with a predominance of females. Approximately 56.7% were single and doctors were the most prevalent in the study. In relation to the questionnaires, the majority stated that they felt insecure when talking about palliative care, in addition to stating that they did not believe in the teams preparation regarding this topic. The results of the semi-structured interview were arranged into topics, the most prevalent of which were training, care and communication. There is a need to expand the discussion about CPP, to better apply its principles.

Keywords: Palliative Care, Pediatrics, Child, Perception.


INTRODUÇÃO

A filosofia do cuidado paliativo (CP) diz respeito a maximizar a qualidade de vida de uma pessoa. Através de suporte físico, social, psicológico, espiritual e familiar, de uma forma significativa e efetiva, é permitido ao paciente a possibilidade de ser ele mesmo em um momento de dificuldade. Nesse sentido, é necessária uma equipe multidisciplinar, a partir da qual as habilidades de vários profissionais são reunidas e utilizadas em prol deste cuidado1.

O primeiro registro histórico sobre cuidados paliativos data de 1960. Na época, Cicely Saunders, médica, enfermeira e assistente social do Reino Unido, iniciou um movimento de cuidados que incluía assistência, ensino e pesquisa, objetivando trazer conforto ao paciente. Seguindo essa linha, em 1967 foi fundada a primeira instituição de internação com intuito único de acompanhamento, tratamento e supervisão clínica dos pacientes em estado terminal, o St. Cristopher’s Hospice. Em 1970, essa tendência chegou à América através de Elisabeth Kubler-Ross, uma psiquiatra que teve contato com o trabalho que Cicely promovia no Reino Unido2.

No Brasil, o primeiro serviço de cuidados paliativos foi aberto em 1991, no Instituto Nacional do Câncer. Ao longo dos anos, o serviço foi se desenvolvendo, e em 2004 o Hospital do Câncer buscou uma visão mais atual. Com um conjunto de ações assistenciais baseadas na oferta de atenção integral e humanizada, o Hospital promoveu conforto físico e suporte psíquico objetivando melhorar o ambiente e as condições de trabalho dos envolvidos no processo de cuidar3.

O avanço da ciência também possibilitou uma maior expectativa de vida para pacientes pediátricos. Como consequência, o número de crianças com condições que causam risco de vida aumentou consideravelmente4. Quando ofertado no momento oportuno, o Cuidado Paliativo Pediátrico (CPP) pode melhorar a qualidade de vida, diminuir o estresse e disponibilizar suporte para todos atravessarem o luto de se perder uma criança5.

O planejamento para a morte é um processo difícil para toda a equipe médica. No entanto, a família é a unidade mais afetada por este momento6. Nesse sentido, uma comunicação de alta qualidade com a unidade familiar abre portas para um ambiente mais tranquilo, associado a sentimentos de conforto e paz de espírito7.

É importante que a equipe seja treinada para adaptar sua forma de comunicação, de maneira que esteja em sinergismo com as necessidades dos pacientes e seus acompanhantes. Para isso, é necessário dar atenção não só à linguagem verbal, mas também à não verbal. Ao permitir que o paciente pediátrico se sinta confortável para demonstrar seus medos, vontades e anseios, o cuidado paliativo se torna mais eficaz para toda a unidade envolvida na situação8.


MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa de natureza mista, sendo qualitativa fenomenológica e quantitativa do tipo descritivaexploratória. Foram utilizadas, respectivamente, as técnicas de entrevista semiestruturada e estruturada, além de inquérito com dados epidemiológicos.

A instituição estudada foi o Hospital das Clínicas UFG/ EBSERH de Goiânia – Goiás. O período de aplicação dos instrumentos foi de outubro de 2021 a novembro de 2021.

Houve a aplicação de três questionários compostos de perguntas diretas para 30 profissionais da equipe de saúde do Serviço de Pediatria no HC-UFG/EBSERH, além de entrevista semiestruturada com oito participantes. Após a aplicação, foi realizada avaliação quantitativa e qualitativa a fim de estabelecer as percepções e o nível de conhecimento básico sobre manejo de cuidados paliativos pelos participantes.

Para a interpretação qualitativa das entrevistas semiestruturadas, foi utilizado o método de análise de conteúdo, na modalidade análise temática. As gravações das entrevistas foram redigidas na íntegra e interpretadas pelos pesquisadores.

Para a análise estatística da parte quantitativa da pesquisa, foram usados como componentes os dados dos questionários epidemiológicos e entrevistas estruturadas. Foi elaborado um instrumento informatizado para o arquivo no software Statistical Package for the Social Sciencies versão 22.0 e feita a entrada dos dados pelos pesquisadores do trabalho. Os resultados foram analisados utilizando-se os seguintes testes estatísticos: a) medidas de tendência central e de variabilidade — média, mediana, desvio-padrão e intervalo de confiança da média (IC 95%), avaliadas por estatística descritiva; b) Teste do Qui-Quadrado ou Exato de Fisher, em caso de variáveis qualitativas. O nível de significância adotado foi de 95% (p<0,05).


RESULTADOS

A média de idade foi de 30,97 anos, com um predomínio do sexo feminino, em 90,0% dos casos. A maioria dos participantes eram solteiros (56,7%), católicos (46,7%) e apresentaram nível superior (63,3%), sendo médico(a) a profissão mais predominante na pesquisa (36,7%). Profissionais que não tinham unidade fixa de trabalho foram os de maior predominância (46,7%), além disso, a mediana do tempo de formação em pediatria foi de 1,0 ano (Tabela 1).




A entrevista sobre impressões pessoais (Tabela 2) revelou que 81,8% dos médicos se sentem inseguros ao falar sobre cuidados paliativos, enquanto 60,0% dos enfermeiros e 100,0% dos fisioterapeutas não. Todos os profissionais acreditavam que a prática dos cuidados paliativos era algo importante e possível, apesar de que 4 médicos (36,4%), 1 nutricionista (33,3%) e 1 farmacêutico (50,0%) afirmaram sentir dificuldade em aceitar que crianças podem precisar de cuidados paliativos.




Sessenta e três por cento dos médicos, 50,0% dos técnicos de enfermagem, farmacêuticos e fonoaudiólogos afirmaram não se sentirem capazes de cuidar de pacientes em CPP e a maioria dos profissionais reconheceram que a aceitação ou não da família interfere na prática de cuidados paliativos.

Houve divergência significativa sobre a opinião dos participantes a respeito do preparo da equipe para lidar com pacientes em cuidados paliativos: 100,0% dos médicos, fisioterapeutas e farmacêuticos afirmaram acreditar que a equipe não se encontra preparada, enquanto 60,0% dos enfermeiros, 100,0% dos técnicos de enfermagem e 66,7% dos psicólogos colocaram que a equipe estava preparada.

Também se obteve resultados estatisticamente relevantes sobre discussão acerca de cuidados paliativos durante a formação acadêmica: de 80,0%-100,0% dos médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e fonoaudiólogos receberam algum tipo de informação sobre CP, em contraste com apenas 33,3% dos psicólogos e nenhum dos fisioterapeutas e farmacêuticos.

Em relação ao formulário sobre conhecimentos em CPP (Tabela 3), ainda que os profissionais de saúde sintam necessidade de maior formação na área dos CP e apresentem inseguranças acerca do tema, eles obtiveram bom desempenho ao responder questões básicas e universais sobre cuidados paliativos.




Apenas um profissional acreditava que cuidados paliativos indicam fim de vida, e outro que crianças em cuidados paliativos não deviam receber cuidados curativos. Já a pergunta que gerou maior divergência foi sobre a família concordar com os cuidados paliativos, uma vez que 81,8% dos médicos, 80,0% dos enfermeiros e 66,7% dos psicólogos optaram pela resposta ‘‘falso’’ e 100,0% dos fonoaudiólogos responderam ‘‘verdadeiro’’ para essa pergunta.

Oito profissionais de saúde concordaram em participar da entrevista semiestruturada. Por meio de uma categorização de assuntos (Tabela 4), foi possível classificar os resultados em tópicos.




Conceito de cuidados paliativos

Nesta categoria alguns profissionais de saúde se sentiam mais familiarizados com o conceito de cuidados paliativos que outros. Entretanto, todos eles valorizaram os cuidados paliativos como forma de fornecer conforto e apoio ao paciente e seus familiares.

“Não intervir naquilo em que não há necessidade, mas não deixar de oferecer conforto para criança e oferecer atendimento aos pais” (E7).

Desafios na prática de CCP

Quando questionados sobre os desafios que os cuidados paliativos trazem, cumpre ressaltar a aceitação familiar, mas também o entrosamento da equipe de saúde e a decisão conjunta sobre o melhor caminho a ser tomado para o paciente.

Assim, na categoria desafios na prática de cuidados paliativos pediátricos, surgiram 3 subcategorias. A 1ª está na dificuldade de aceitação da terminalidade pela família:


“[…] aceitação da família […]” (E6).
“É difícil para a família e os profissionais entenderem todo o processo […] é difícil aceitarem […]” (E2).


2ª subcategoria diz respeito à objeção dos profissionais de saúde:


“[…] aceitar a criança que está se encaminhando para o processo de morte… as vezes eles (paciente e família) aceitam e a gente (profissional) fica resistente […]” (E8).


Essa resistência, tanto da família quanto dos próprios profissionais, é particularmente mais evidente na pediatria, como foi trazido na subcategoria 3:


“Ninguém está preparado para entender que uma criança tem uma doença muito grave e que não tem cura […] que sua vida será abreviada [...]” (E1).


Papel da equipe de saúde

Foi relatado que o papel da equipe no âmbito dos cuidados paliativos pediátricos era trazer a melhor assistência para o paciente e sua família (subcategoria 1):


“[…] realizar os procedimentos que são necessários de forma tranquila e segura [...] acolher bem a criança e família […] estar bem e aceitando os cuidados paliativos para acolher a dor da família e do paciente […]” (E4).


Outro ponto levantado foi a importância de os profissionais reconhecerem o seu objetivo dentro da unidade de trabalho e relacioná-lo com o de seus parceiros profissionais (subcategoria 2):


“[…] parece óbvio, mas o papel da equipe é trabalhar em equipe [...] saber os objetivos em comum e trabalhar em prol do paciente [...] favorecendo uma boa morte […]” (E5).


Limitações pessoais

Ao serem perguntados sobre os desafios pessoais encontrados na prática diária dos CPP, os entrevistados relataram o apego emocional com os pacientes e suas famílias:


“Sou emotiva […] tenho empatia demais […]” (E2).
“A gente se apega muito […]” (E3).


Um dos participantes trouxe a necessidade de ter mais formação em CPP: “[...] tínhamos que ter mais capacitação […]” (E8).

Outro entrevistado levantou a dificuldade de reconhecer os estágios do CP: “[...] quando parar de intervir nessa tentativa de cura, saber o que não se deve investir para não prolongar o sofrimento […]” (E1).

Aceitação da família

Para os entrevistados, a aceitação da família interfere de forma direta na condução do cuidado paliativo pediátrico:


“[…] a gente tem mais facilidade de auxiliar a família (quando ela aceita) […]” (E4).

A aceitação ou não da família também influencia a tomada de decisões da equipe de saúde:


“[…] a família pode entender algumas condutas como desistência… construir com a família esse raciocínio é um desafio gigante […] eles estão vivenciando o processo de entender o adoecimento e que o óbito está próximo […]” (E5).


Melhorias da prática dos cuidados paliativos

Ao trazer o questionamento de melhorias nos cuidados paliativos, foi levantado o ponto sobre a necessidade da continuidade do aprendizado e ensinamento (subcategoria 1)


“[…] bato na tecla da necessidade de formação […] desde a graduação […]” (E8).


Outros entrevistados destacaram que a equipe deveria estar preparada e trabalhar de forma arquitetada, para poder repassar, com segurança, as informações e condução do caso para o paciente e sua família (subcategoria 2):


“Através do trabalho em equipe […] se tivéssemos mais tempo de interação talvez ajudasse um pouco’’ (E2).



DISCUSSÃO

Os profissionais frisaram a importância da implementação do CP e afirmaram a necessidade de englobar toda a unidade familiar nesse momento. Apesar de a maioria dos entrevistados ter afirmado interesse em leitura sobre cuidados paliativos, alguns deles associaram a implementação dos CP com o fim iminente da vida do paciente, citando principalmente o conforto e analgesia. Pesquisas apontam que essa é uma tendência comum e relacionada à percepção de finitude da vida com a instauração dos cuidados paliativos, enquanto na verdade os CPP devem ser iniciados tão logo se perceba a impossibilidade de cura9.

Nesse cenário, a confusão conceitual se apresenta como um importante obstáculo para a implementação dos cuidados paliativos de forma e no momento adequado. Um estudo suíço apontou que ainda que a equipe multidisciplinar soubesse e entendesse bem o conceito de CP, ela optava por iniciar os cuidados paliativos apenas quando os cuidados curativos já não faziam mais efeito10.

Assim, é importante entender que cuidados paliativos podem e devem ser iniciados a partir do momento do diagnóstico, e não só quando não há mais perspectiva de cura.

Quanto à aceitação familiar, os entrevistados afirmaram que se a família não aceita o momento vivenciado, o processo se torna mais penoso globalmente. Nesse sentido, é apontado que a possibilidade de morte é muitas vezes um tema evitado entre a família e o paciente. Ocorre uma negação da finitude da vida, ainda que de forma subconsciente11.

A comunicação é uma ferramenta essencial para a prática dos cuidados paliativos. A partir dela, o paciente pode sanar dúvidas e diminuir sua ansiedade e aflição, melhorando assim sua qualidade de vida12.

O diálogo é o ponto-chave do cuidado paliativo e este não deve ficar em segundo plano em nenhum momento. Uma comunicação terapêutica permite desenvolvimento do relacionamento entre equipe e paciente, abrindo portas para engrandecimento da qualidade de vida de ambos os grupos. Uma pesquisa americana indicou que a falta de suporte e entendimento familiar, com expectativas irrealísticas, é o maior obstáculo de um cuidado paliativo de qualidade. Isso se sobrepõe a barreiras como um programa de CP de nível básico e uma equipe com conhecimentos menos aprofundados13. Há que se ressaltar que o primeiro impacto diante da certeza da morte possa ser de rejeição. Nesse sentido, o paciente e sua unidade familiar podem apresentar barreiras ao se tratar do assunto. Este tópico foi bastante evidenciado pelos participantes da pesquisa. Assim, é papel da equipe multidisciplinar conduzir essa situação da melhor maneira possível, mostrando que a aceitação de cuidados paliativos não significa desistir da vida, mas aprender a viver com a situação real, com a maior qualidade de vida que se possa alcançar.

Outro ponto a ser analisado é o da não aceitação por parte da equipe multidisciplinar de saúde. Durante as entrevistas, pode-se notar que mesmo que fosse uma situação corriqueira na vida dos profissionais, eles ainda lidavam com sentimentos de incapacidade diante da impossibilidade de cura de seus respectivos pacientes. A maior porcentagem foi na classe médica, dado provavelmente associado ao sentimento de “liderança” da equipe multidisciplinar, que traz consigo responsabilidades. Nesse aspecto, os profissionais da área da saúde são formados com ênfase no processo de curar. Então, quando esse objetivo não é alcançado, o profissional tende a adotar uma postura de negação diante da situação. Nessas condições, a possibilidade do acontecimento da distanásia aumenta consideravelmente, já que a equipe pode ter dificuldade em renunciar aos tratamentos curativos11.

Além disso, por ser um pilar de apoio para o paciente e sua unidade familiar, a equipe multidisciplinar tende a não demonstrar seu sofrimento em detrimento do bem-estar do meio em que se encontra. Nesse cenário, essas atitudes desencadeiam impactos negativos nos profissionais, incluindo síndrome de Burnout, diminuição da satisfação com o trabalho, ansiedade e depressão14.

No caso dos profissionais de saúde, a empatia vem sendo descrita como uma qualidade essencial de um cuidado mais humano. Essa habilidade é definida como um atributo que implica capacidade de compreender as experiências, preocupações e perspectivas dos pacientes15. No entanto, ainda que a empatia seja uma característica louvável, a carga emocional que a equipe multidisciplinar de saúde carrega ao acompanhar diferentes pacientes pode ser prejudicial tanto para o paciente e sua unidade familiar quanto para os profissionais. Neste estudo, foi relatado que o sofrimento emocional acompanha a equipe mesmo após terminarem o turno de trabalho, o que poderia acarretar inúmeras consequências para a saúde deles.

Uma pesquisa realizada na Austrália trouxe a definição de “Cuidado Compassivo” que consiste em uma abordagem totalmente centrada no paciente e em sua família, buscando entender seus medos, anseios e aflições. No entanto, essa mesma pesquisa afirma que ao se preocupar tanto com o próximo, a equipe multidisciplinar de saúde acaba negligenciando o autocuidado, gerando fadiga nos profissionais16, fato que esteve presente em vários relatos neste estudo.

Um ponto levantado pelos entrevistados foi a necessidade de um trabalho em equipe bem coordenado. Foi evidenciado que a presença de diferentes visões sobre o potencial de recuperação do paciente dificultava a tomada de decisões diante desse processo, pois acabava influenciando na prática diária. A maioria dos participantes desta pesquisa acreditava que a equipe não se encontrava totalmente preparada para lidar com pacientes em cuidados paliativos. Essa divergência de posicionamentos pode estar relacionada a problemas de comunicação e carência de protocolos assistenciais. Para que se ocorra a uniformização das condutas, faz-se necessário que a equipe multidisciplinar trabalhe de forma ativa na comunicação, pois ela é fundamental no CPP e permite melhor acesso e abordagem à dimensão emocional do processo11. Ademais, a ausência de protocolos auxiliares dificulta na decisão de qual o melhor caminho a ser seguido e de quais terapêuticas devem ser mantidas nos pacientes em cuidados paliativos. Nesse sentido, a capacitação dos profissionais e instauração de protocolos no hospital forneceria uma melhor abordagem multidisciplinar tanto para a equipe quanto para os pacientes e sua unidade familiar12.

Durante a entrevista, a maioria dos participantes citou a necessidade de discussão sobre CP no ensino. Para eles, a educação não só capacita tecnicamente o profissional, mas auxilia na construção do relacionamento com a equipe e os pacientes. Pesquisas apontam que treinamento e educação desde o início do ensino superior são efetivos para a formação de profissionais de saúde capacitados para administrarem cuidados paliativos de excelência, além de construírem melhores relacionamentos com a equipe de trabalho17.

Considerando a falha nesse aspecto, era esperado que os entrevistados apresentassem conhecimento escasso quanto aos princípios básicos do CPP. Ainda que essa não tenha sido a tendência deste estudo, três perguntas apresentaram divergências de respostas. A maioria dos entrevistados afirmou que a família deve sempre concordar com as medidas de cuidados paliativos.

Para o Ministério Público, o médico que insistir em manter tratamento ou qualquer outro procedimento, contrariando a vontade do paciente ou de seu representante legal praticará distanásia. Ainda assim, a equipe multidisciplinar deve sempre respeitar a vontade do paciente ou de seu representante legal, e não o contrário, tomando o devido cuidado para não infringir os aspectos legais do ato de cuidar18. Em resumo, a abertura do protocolo de cuidado paliativo para determinado paciente é uma decisão médica, porém sua real implementação depende também da vontade do paciente e de sua família.


CONCLUSÃO

Este estudo enfatiza a necessidade de se ampliar a discussão acerca da temática cuidados paliativos pediátricos, para melhor assistência e aplicação de seus preceitos, além de maior integração da equipe no cuidar de pacientes paliativos. A equipe multidisciplinar da Pediatria do HC mostrou conhecimentos conceituais básicos sobre cuidados paliativos pediátricos.


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1. Universidade de Rio Verde, Medicina - Rio Verde - Goiás - Brasil
2. Universidade Federal de Goiás, Departamento de Pediatria do Hospital das Clínicas UFG/EBSERH - Goiânia - Goiás - Brasil

Endereço para correspondência:

Fernanda Queiroz Xavier
Universidade de Rio Verde. Fazenda Fontes do Saber, s/n
Rio Verde, GO, Brasil. CEP: 75901-970.
E-mail: fernandaqx@hotmail.com

Data de Submissão: 02/01/2024
Data de Aprovação: 29/02/2024