Caso Clínico Interativo - Ano 2011 - Volume 1 - Número 2
Caso clínico interativo: crescimento e desenvolvimento
Caso clínico interativo: crescimento e desenvolvimento
S.F.N., 2 anos e 2 meses, feminino, branca, natural do RJ, residente em Santíssimo.
QP: Tosse com catarro verde, febre e diarréia.
HDA:
Início do quadro aos dois meses de idade com tosse produtiva associada à expectoração espessa e esverdeada e múltiplas infecções respiratórias, com várias internações, incluindo tratamento para tuberculose pulmonar há um ano.
Refere ainda, desde o início do quadro, evacuações líquido-pastosas, volumosas de odor fétido contendo restos alimentares.
Há um mês vem apresentando febre de 37,7º C a 38º C, sem horário definido.
História do parto e neonatal: nascida de parto cesáreo, Apgar 9/9, idade gestacional de 33 semanas com peso de nascimento de 1065g, pequena para idade gestacional.
Intercorrências no período neonatal: hipoglicemia e icterícia neonatal, permanecendo internada na UTI Neonatal por 17 dias; alta com 38 dias de vida.
História alimentar: leite materno exclusivo até 3 meses de vida.
História do Crescimento e desenvolvimento: Atraso na fala e no desenvolvimento motor, ganho pondero-estatural abaixo do esperado.
História Vacinal: em dia.
História Familiar: Irmão com deficiência de IgA e mielodisplasia; mãe hipertensa: estatura: 145cm.
Pai etilista social e tabagista: estatura: 170cm.
História Social: núcleo familiar, casa de alvenaria e saneamento básico.
EXAME FÍSICO
Peso: 8530g Estatura: 81 cm PC: 45,5 cm.
IMC: 13,1kg/m2.
Emagrecida, bom estado geral, ativa e cooperativa.
Postura atípica, massa muscular hipotrofiada.
Microadenopatia cervical, axilar e inguinal bilateral.
Discreto aumento do diâmetro antero-posterior do tórax.
Murmúrio vesicular audível sem ruídos adventícios. FR: 28 irpm.
Aparelho circulatório e abdome sem alterações.
Impressão diagnóstica:
Pré-escolar de 2 anos e 2 meses com desnutrição e déficit de ganho pondero-estatural.
Quadro arrastado de tosse com secreção espessa, episódios febris e infecções de vias aéreas de repetição. Relato de diarreia crônica.
A presença de ganho pondero-estatural insuficiente pode compor o quadro clínico de quaisquer condições das alternativas citadas. A associação de tosse produtiva fala a favor de doença pulmonar, assim como a presença de infecções de repetição são sugestivas de imunodeficiência.
Considerando as hipóteses diagnósticas aventadas na questão 1, todos os exames listados auxiliariam na elucidação clínica do caso.
O peso e estatura da criança ao nascer refletem as condições intrauterinas às quais a mesma foi submetida. Fatores fetais, placentários e maternos podem interferir no crescimento do feto. São fatores maternos frequentemente associados à restrição do crescimento intrauterino: toxemia, hipertensão ou doença renal, hipoxemia, doença crônica ou má nutrição, uso de drogas.
A presença de infecção fetal crônica (ex.: toxoplasmose, rubéola ou sífilis congênitas) também é importante causa de retardo no crescimento. A infecção recente por toxoplasmose (alternativa na questão), seria dada pela presença de IgM, e não IgG no sangue materno.
Existe também forte correlação entre RCIU e baixo nível socioeconômico. Famílias de baixas condições socioeconômicas apresentam taxas elevadas de anemia e outras condições mórbidas, assim como cuidados de pré-natal inadequados.
O Ministério da Saúde adota as recomendações da OMS quanto ao uso de curvas de referência para a avaliação do estado nutricional.
A avaliação antropométrica da paciente nesta data era a seguinte:
Idade = 2 anos 2 meses; P= 8530g; E= 81 cm; IMC= 13,1 kg/m2
A resposta correta esta destacada no Quadro 1.
Nas meninas, o primeiro sinal visível de puberdade e marco do estágio 2 de Tanner é o aparecimento dos botões mamários, entre 8 e 12 anos (Figura 1).
Figura 1. Estadiamento de Tanner.
O crescimento é um processo, e não uma qualidade estática. A maioria das crianças tende a acompanhar um determinado percentil. É comum que nos primeiros 2 anos de vida a criança esteja variando entre diferentes percentis de estatura. Para os lactentes nascidos a termo, o tamanho ao nascimento reflete a influência do ambiente uterino; aos dois anos, se correlaciona com a estatura média dos pais, refletindo a influência genética.
Por esse motivo, entre 6-18 meses, os lactentes podem mudar de percentil em direção ao seu potencial genético.
É importante para a avaliação da estatura a interpretação dos gráficos E/I, velocidade de crescimento e a maturação esquelética, além do cálculo de seu alvo genético para meninas pela seguinte equação:
(Altura do pai – 13) + Altura da mãe / 2
O crescimento somático e a maturação biológica são influenciados por vários fatores que atuam de forma independente e em conjunto, modificando o potencial genético da criança. A influência da nutrição materna e o ambiente intrauterino atuam principalmente nos parâmetros do crescimento ao nascimento, enquanto fatores genéticos atuarão mais tarde.
A Fibrose Cística, principal hipótese para este caso clínico, é uma doença pulmonar e gastrointestinal; assim, o crescimento insuficiente é multifatorial, podendo dever-se à pobre ingestão alimentar, às perdas calóricas fecais, à má absorção, infecções crônicas e às necessidades energéticas aumentadas (pelo esforço respiratório).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Kliegman RM, Jenson HB, Behrman RE, Stanton BF, Nelson WE. Nelson Tratado de Pediatria. 18ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
2. Lopez AL, Campos Jr. D. Tratado de Pediatria Sociedade Brasileira de Pediatria. 2ª Ed. Manole. 2010.
3. http://www.saude.to.gov.br/www_atencaoprimaria_to_gov_br/downloads/MANUAIS/NOVAS_CURVAS_DE
_CRESC_1.pdf
4. Avaliação nutricional da criança e do adolescente – Manual de Orientação / Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de Nutrologia. São Paulo: Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de Nutrologia, 2009.
1. Professora Adjunta do Departamento de Pediatria (DPED) da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Pediatra com Área de Atuação em Endocrinologia Pediátrica pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM). Doutora em Ciências Médicas pela Pós-graduação em Ciências Médicas (PGCM) da FCM da UERJ.
2. Profa. Dra. da Disciplina de Pediatria da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Presidente do Departamento Científico da SBP.
3. Professor Dr. Adjunto da Disciplina de Pediatria da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
4. Médica do Serviço do Pediatria do Hospital Universitário Pedro Ernesto (UERJ). Preceptora da Residência Médica do programa de pediatria do Hospital Universitário Pedro Ernesto (UERJ).
5. Médica Residente do terceiro ano do Programa de Pediatria do Hospital Universitário Pedro Ernesto (UERJ).
6. Médica Residente do segundo ano do Programa de Pediatria do Hospital Universitário Pedro Ernesto (UERJ).