ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Introduçao à Metodologia Científica - Ano 2016 - Volume 6 - Número 2

Medidas de associação: Que medida escolher e como interpretar

Measures of association: Which to choose and how to interpret
Medidas de asociación: Qué medida escoger y cómo interpretar


Quando realizamos um estudo científico, frequentemente desejamos saber se algum fator (medicamento, vacina, fator ambiental) está relacionado a uma determinada condição (alívio de sintomas, ocorrência de doenças).

Para tanto, utilizamos algumas medidas que têm o objetivo de aferir e quantificar a ligação entre a exposição a um fator e a ocorrência de um desfecho. Uma das medidas mais frequentemente empregadas nos artigos científicos é o risco relativo (RR).

O objetivo deste artigo é descrever sinteticamente a definição e a aplicação desta medida.


RISCO RELATIVO

Quando pretendemos avaliar a eficácia de um medicamento, de uma vacina ou de um cuidado de saúde, podemos utilizar um desenho de estudo, analisando-se os indivíduos que compõem uma amostra, segundo sua exposição ao fator de interesse e ao desenvolvimento de um determinado desfecho:




Este tipo de estudo é conhecido como estudo de coorte. Para realizá-lo, é necessário selecionar um grupo de indivíduos (uma coorte) em que nenhum deles tenha experimentado o desfecho de interesse, mas que todos tenham condições de experimentá-lo. Assim, por exemplo, se tivermos interesse em saber se a exposição à radiação no primeiro ano de vida é um fator de risco para o desenvolvimento de câncer ginecológico, a coorte deve ser constituída apenas por meninas.

Conhecendo estes dados, como podemos mensurar as respostas às exposições que pretendemos estudar?

Uma forma de fazer isto é verificar se uma determinada exposição (medicamento, vacina, fator ambiental) protege ou aumenta o risco de ocorrência de um determinado desfecho. Para tanto, utiliza-se o risco relativo (RR).

Para melhor entendimento desta medida, devemos considerar algumas definições:
• Risco: proporção de participantes que experimentam um evento de interesse.

• Incidência: o número de novos casos ou desfechos numa população estabelecida, durante um determinado período de tempo.
O RR é a razão dos riscos nos dois grupos: intervenção e controle. É definido como a razão entre o risco de ocorrência do desfecho no grupo que recebeu a intervenção (medicamento, vacina, fator ambiental) e risco de ocorrência do mesmo desfecho no grupo controle (que não recebeu a intervenção).

O RR é, portanto, uma razão de incidências: a razão entre a incidência do desfecho entre os expostos e a incidência do desfecho entre os não expostos.

A pergunta fundamental é: quantas vezes é mais provável que pessoas expostas se tornem doentes em relação às não expostas?




Cálculo do RR:

RR:

Interpretação:
= 1: a exposição não interfere no desenvolvimento do desfecho
> 1: a exposição é um fator de risco para o desenvolvimento do desfecho
< 1: a exposição é um fator protetor contra o desenvolvimento do desfecho.
De forma simplificada, considera-se que a associação é:
Forte: RR > 3
Moderada: RR em torno de 2
Fraca: RR = 1,5
Inexistente: RR = 1
Intervalo de confiança:

Quando lemos estudos que avaliam a eficácia de um tratamento ou de uma medida de proteção, vemos que o RR vem seguido do intervalo de confiança (IC), comumente em 95%. Para que serve o IC?

Quando um estudo avalia toda a população de interesse, afastados cuidadosamente os vieses, o RR encontrado é preciso. Entretanto, na maioria das vezes, isso não é viável. Os pesquisadores trabalham com amostras da população. Ao selecionar uma amostra, é possível encontrar, ao acaso, um resultado diferente do que ocorre na população inteira.

A princípio, a solução poderia ser repetir o mesmo estudo várias vezes, utilizando diferentes amostras da mesma população, até que pudéssemos assegurar a precisão dos resultados encontrados. Para responder a esta questão, utilizase o intervalo de confiança, que é uma medida da incerteza em torno do resultado estatístico encontrado.

O IC95% significa que, se o estudo fosse repetido em outras amostras da mesma população, em 95% das vezes o intervalo de confiança desses estudos o valor verdadeiro do RR. Alternativamente, IC de 90% ou 99% são utilizados algumas vezes. IC amplos indicam menor precisão. Intervalos estreitos, maior precisão.

Interpretação:

IC inclui o 1: a exposição não interfere no desenvolvimento do desfecho.

IC não inclui o 1: há diferença estatisticamente significativa entre os grupos de exposição e controle.
• Se o IC for todo > 1: exposição é fator de risco

• Se o IC for todo < 1: exposição é fator de proteção

VAMOS ENTÃO À PARTE PRÁTICA:

O primeiro passo para cálculos epidemiológicos é desenhar uma tabela 2×2. Cada uma das caselas representando:



Dessa forma, cada casela corresponderá:
• A ao número de indivíduos que foram expostos e apresentam o desfecho

• B ao número de indivíduos que foram expostos mas não apresentam o desfecho

• C ao número de indivíduos que não foram expostos mas que apresentam o desfecho

• D ao número de indivíduos que não foram expostos e não apresentam o desfecho
Leia o exemplo hipotético:



O primeiro passo será o de preencher a parte da tabela 2×2 com os números que o exemplo nos dá, sabendo que o desfecho será "Óbito" e a exposição será "Peso ao Nascimento"

O total da amostra é composto por 2000 RN, divididos em dois subgrupos de 1000 classificados segundo a adequação do peso ao nascimento.







Agora já temos informações suficientes que nos permitem completar a tabela 2×2:



RR =

Empregando-se a fórmula acima, teríamos:

RR =

Se o resultado encontrado fosse um RR = 1, então constataríamos que não haveria diferença entre RN de baixo peso ao nascimento e aqueles com peso adequado quanto ao risco de óbito após o nascimento.

Por outro lado, um RR < 1 nos faria supor que haveria um risco menor de ir a óbito entre aqueles que nasceram com baixo peso.

O RR = 3 encontrado no exemplo indica que é 3 vezes maior o risco de ir a óbito entre os que nasceram com baixo peso comparado aqueles com peso adequado.

Vamos agora interpretar o 95% IC:


I) Qual a interpretação desse 95% IC encontrado?

II) Esse resultado foi significativo sob o ponto de vista estatístico?

III) O que se pode concluir acerca da precisão do RR?
Respostas:
I) O intervalo de confiança no nível 95% (95% IC) significa que o resultado estará dentro daquele intervalo em 95 dos 100 estudos hipoteticamente realizados, ou seja, o RR estará entre 4,3 e 25. Assim, para uma leitura correta do intervalo de confiança podemos afirmar que em 95 de 100 amostras hipotéticas, o resultado estará dentro deste intervalo.

II) Esse resultado foi significativo (p < 0,05), uma vez que entre os limites superior e inferior do IC o valor = 1 não esteve incluído.

III) O resultado do RR mostra um IC com uma largura considerável, variando cerca de 20 unidades, o que configura uma baixa precisão.

I) Qual a interpretação desse 95% IC encontrado?

II) Esse resultado foi significativo sob o ponto de vista estatístico?
Respostas:
I) O intervalo de confiança no nível 95% (95% IC) significa que o RR estará dentro do intervalo 0,4-1,1 em 95 dos 100 estudos hipoteticamente realizados.

II) Esse resultado não foi significativo (p > 0,05) uma vez que entre os limites superior e inferior do IC o valor = 1 esteve incluído.











Editoras adjuntas da revista Residência Pediátrica

Endereço para correspondência:
Marilene Augusta Crispino Santos
E-mail: crispinomarilene06@gmail.com