ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo de Revisao - Ano 2016 - Volume 6 - Número 2

Albumina em pacientes pediátricos gravemente enfermos: uma revisão crítica da literatura

Albumins in critically ill pediatric patients: a literature review
Albumina en pacientes pediátricos gravemente enfermos: una revisão crítica de la literatura

RESUMO

INTRODUÇÃO E OBJETIVO: Esta revisão tem como objetivo avaliar a efetividade do emprego de albumina humana em pacientes pediátricos gravemente enfermos internados em unidades de cuidados intensivos.
MÉTODOS: A pesquisa abrangeu as seguintes bases de dados: Cochrane Library, LILACS, Medline (via PubMed) e Uptodate até maio de 2014. As publicações foram selecionadas e submetidas à leitura crítica de modo independente por dois pesquisadores. Os desfechos principais foram morte e disfunção de órgãos.
RESULTADOS E CONCLUSÕES: O uso de albumina humana em crianças gravemente enfermas não mostrou benefício na redução da mortalidade ou disfunção de órgãos quando comparado ao uso de outros expansores volumétricos. Para os desfechos tempo de internação em Unidade de Cuidados Intensivos e tempo de intubação traqueal, o emprego de albumina também não se mostrou superior aos demais expansores utilizados.

Palavras-chave: albuminas, criança, doença catastrófica, mortalidade.

ABSTRACT

INTRODUCTION AND OBJECTIVES: This review aims to evaluate the effectiveness of the use of human albumin in critically ill pediatric patients admitted to intensive care units.
METHODS: The research covered the following databases: Cochrane Library, LILACS, Medline (PubMed) and Uptodate, to May 2014. The publications were selected and submitted to critical reading by two independents researchers. The main outcomes were death and organ dysfunction.
RESULTS AND CONCLUSION: The use of human albumin in critically ill children showed no benefit in reducing mortality and organ dysfunction compared to use of others volumetric expanders. For another outcomes, as time of permanence in intensive care unit and endotracheal intubation time, the albumin employment also was not superior.

Keywords: albumins, catastrophic illness, child, mortality.

RESUMEN

INTRODUCCIÓN Y OBJETIVO: Esta revisión tiene como objetivo evaluar la efectividad del empleo de albumina humana en pacientes pediátricos gravemente enfermos internados en unidades de cuidados intensivos.
MÉTODOS: La investigación abarcó las siguientes bases de datos: Cochrane Library, LILACS, Medline (vía Pubmed) y Uptodate hasta mayo de 2014. Las publicaciones fueron seleccionadas y sometidas a la lectura crítica de modo independiente por dos investigadores. Los desenlaces principales fueron muerte y disfunción de órganos.
RESULTADOS Y CONCLUSIONES: El uso de albumina humana en niños gravemente enfermos no mostró beneficio en la reducción de la mortalidad o disfunción de órganos cuando comparado al uso de otros expansores volumétricos. Para los resultados tiempo de internación en Unidad de Cuidados Intensivos y tiempo de intubación traqueal el empleo de albumina tampoco se mostró superior a los demás expansores utilizados.

Palabras-clave: albuminas, enfermedad catastrófica, mortalidad, niño.


INTRODUÇÃO

Falência circulatória, especialmente devido à hipovolemia, é uma importante causa de morbimortalidade em crianças que procuram serviços de urgência. Crianças acometidas por infecções sistêmicas mais graves podem evoluir para falência circulatória (choque séptico), assim como pacientes com desordens autoimunes, pancreatite, vasculite, tromboembolismo, queimaduras e cirurgias podem também manifestar um quadro de SIRS (síndrome da resposta inflamatória sistêmica) seguido de choque e falência de órgãos1,2.

O reconhecimento precoce da falência circulatória é fundamental para que o tratamento precoce com administração de fluidos seja iniciado2-4. Embora ações rápidas para reposição volêmica sejam fundamentais para a sobrevida do paciente pediátrico, ainda há discussão sobre a composição do fluido a ser administrado, se soluções cristaloides (por exemplo: soro fisiológico) ou coloides (por exemplo: albumina). Resultados de estudos controlados e revisões sistemáticas não confirmam a diminuição de desfechos importantes como mortalidade e disfunção de órgãos com o emprego dos coloides nestes pacientes5,6.

Crianças costumam reagir a doenças graves com queda do índice cardíaco e aumento de resistência periférica ("choque frio"), enquanto em adultos há queda da resistência periférica ("choque quente"). A criança, por possuir maior superfície corpórea, apresenta perdas líquidas mais expressivas que os adultos. Observações como estas contribuem para que conclusões de estudos clínicos feitos em adultos sejam diretamente extrapoladas para pacientes pediátricos7.

Há, portanto, necessidade de rever a literatura científica para buscar evidências consistentes que esclareçam melhor o papel terapêutico da albumina humana em pacientes hemodinamicamente instáveis.

Esta revisão teve como objetivo avaliar a efetividade da introdução de albumina humana em pacientes pediátricos gravemente enfermos internados em unidades de cuidados intensivos, sejam eles portadores de choque, sepse, hipovolemia, em estado pré ou pós-operatório.


MÉTODOS

Foram pesquisadas as bases de dados: Cochrane Library, LILACS, Medline (via PubMed). A busca empregou os descritores (MeSH terms): albumins, critically illness, mortality, child. Para o PubMed, as estratégias de busca foram: ("Critical Illness"[Mesh]) AND "Albumins"[Mesh]) AND "Mortality"[Mesh] e ("Albumins"[Mesh]) AND "Child"[Mesh] Filters: Randomized Controlled Trial, Guideline, Systematic Reviews, Meta-Analysis. A base www.uptodate.com foi também acessada na busca de outras referências de artigos primários que pudessem não ter sido encontradas nas bases já citadas.

As publicações foram selecionadas de acordo com os seguintes critérios: revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados e de coortes; ou ensaios clínicos randomizados e coortes como estudos primários, que avaliassem o emprego da albumina humana por via endovenosa em crianças gravemente enfermas com instabilidade hemodinâmica, comparado com o uso de outras soluções coloides ou cristaloides, tratamento de suporte e tratamento já padronizado para a condição clínica em questão. Foram selecionados artigos publicados em inglês, francês, espanhol e português.

Os desfechos principais estudados foram morte e disfunção de órgãos. Foram avaliados também desfechos secundários como: tempo de internação na unidade de cuidados intensivos; volume total de perfusão ou reposição de coloide, cristaloides e volume sanguíneo transfundido; tempo de intubação traqueal; ganho de peso; resultados de exames complementares. Os títulos e resumos de todos os estudos recuperados foram revisados por dois avaliadores independentes. Discordâncias foram resolvidas por um terceiro avaliador. A busca compreendeu todos os artigos publicados até maio de 2015.

A validade interna, ou seja, a presença de vieses de cada uma das publicações foi avaliada com o emprego de escores validados para este fim e encontram-se apresentadas na Tabela 1 - validade interna dos estudos incluídos8-10.




RESULTADOS

Foram encontrados, inicialmente, 17 estudos que preenchiam os critérios de inclusão descritos, dos quais foram selecionados seis. Os critérios para a seleção dos estudos incluídos na revisão encontram-se descritos na Figura 1.


Figura 1. Seleção dos estudos incluídos na revisão



A validade interna dos artigos selecionados encontra-se resumida na Tabela 1.

A Tabela 2 sintetiza os artigos incluídos destacando os delineamentos e os resultados numéricos de cada um deles. A Tabela 3 relaciona os estudos não incluídos na revisão, bem como os motivos para a não inclusão.






Em virtude da grande quantidade de desfechos estudados nos trabalhos selecionados, optamos por analisar e sintetizar as informações que se referiram àqueles mais relevantes do ponto de vista clínico, a saber: mortalidade, disfunção de órgãos, tempo de internação em UTI e tempo de intubação traqueal11-14.

Mortalidade

Um ensaio clínico randomizado11 que avaliou o índice de mortalidade em crianças sem e com hipotensão grave, comparando reposição volêmica com solução salina, albumina ou sem bolus (controle), encontrou que a mortalidade em 48 h foi maior para qualquer tipo de bolus. A morte em até quatro semanas também foi significativamente maior no grupo com bolus, independentemente do tipo de infusão empregada.

A revisão sistemática16, que avaliou crianças com infecção grave, não tinha mortalidade como desfecho principal. Entretanto, em um dos artigos estudados o índice de mortalidade foi menor para o grupo que recebeu albumina quando comparado à solução salina, especialmente para os casos complicados com coma. Nos casos sem coma não houve diferença significativa entre os grupos albumina e salina. O mesmo ocorreu para o grupo albumina comparado ao Gelofusine em dois dos estudos dessa revisão. Os outros artigos que avaliaram mortalidade não mostraram diferença significativa com uso de albumina quando comparado aos outros expansores volumétricos.

Outro ensaio clínico randomizado17, que avaliou crianças submetidas à derivação cardiopulmonar, comparou a reposição volêmica com albumina 5% ou uma unidade de plasma fresco congelado (PFC) no prime do bypass. A mortalidade perioperatória foi descrita como semelhante para os grupos, embora os autores não tenham informado valores de p ou IC 95%.

Mais um ensaio clínico randomizado18 que realizou a comparação entre cristaloides e albumina em crianças submetidas à cirurgia cardíaca que necessitaram de circulação extracorpórea não encontrou diferença estatisticamente significativa de mortalidade quando comparou o uso de albumina e cristaloide.

Disfunção de órgãos

Não houve diferença significativa no aparecimento de sequelas neurológicas15,16 ou na redução de efeitos adversos como a suspeita de edema pulmonar ou aumento da pressão intracraniana15.

No artigo19 que comparou o uso da albumina com o HES (hidroxietilamido a 6%) em crianças submetidas à cirurgia cardíaca eletiva, apenas o volume médio de solução coloidal e de oferta de proteínas totais foi significativamente maior neste último grupo. Foram relatados, também, mais ocorrências de substituição renal e de efeitos adversos graves com falência de múltiplos órgãos no grupo albumina, porém, não foram descritos valores que comprovem que esses resultados são estatisticamente significativos.

Tempo de internação em UTI e tempo de intubação traqueal

Três publicações17-19 avaliaram tempo de internação da UTI e tempo de intubação traqueal como desfechos. Em nenhum deles houve diferenças estatisticamente significativas para os grupos recebendo albumina ou outro expansor volumétrico.


DISCUSSÃO

Estudos realizados em pacientes adultos não encontraram evidências sólidas que pudessem recomendar o emprego de albumina em pacientes gravemente enfermos que necessitam de reposição volêmica, incluindo os portadores de sepse.

A carência de dados sumarizados em Pediatria levou à realização desta revisão sistemática que, partindo da seleção de 17 artigos, separou para serem incluídos seis. Cada um deles foi submetido à leitura crítica na busca de vieses que pudessem colocar em risco sua validade interna (Tabela 2). Os estudos primários não puderam ter seus resultados agrupados em uma metanálise em virtude da heterogeneidade observada entre eles, seja pela forma com que as soluções foram administradas, seja pela idade dos pacientes, ou ainda pela condição clínica basal que os levou a necessitar dos tratamentos.


CONCLUSÕES

O resultado do sumário das informações coletadas permitiu aos autores concluir pela ausência de evidências sólidas que demonstrem que a infusão de albumina, quando comparada com a de cristaloides, ou outros expansores plasmáticos, possa reduzir o risco de mortalidade e da ocorrência de disfunção de órgãos quando empregada na reanimação de pacientes pediátricos gravemente enfermos com instabilidade hemodinâmica5,6,11-14.


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ESTUDOS INCLUÍDOS

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16. Akech S, Ledermann H, Maitland K. Choice of fluids for resuscitation in children with severe infection and shock: systematic review. BMJ. 2010;341:c4416. PMID: 20813823 DOI: http://dx.doi.org/10.1136/bmj.c4416

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ESTUDOS EXCLUIDOS

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1. Médico Pediatra - Chefe do Departamento de Medicina da UNIVILLE, Joinville, SC, Brasil
2. Médica formada pela Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE, Joinville, SC, Brasil
3. Médico - Residente de Pediatria no Hospital Materno Infantil Dr. Jeser Amarante Faria, Joinville, SC, Brasil

Endereço para correspondência:
Carlos Augusto Cardim de Oliveira
Universidade da Região da Joinville - UNIVILLE
Rua Evaristo da Veiga, n° 305, Glória
Joinville, SC, Brasil. CEP: 89216-215