ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Comunicaçao Breve - Ano 2016 - Volume 6 - Número 3

Atendimento ambulatorial: relato de uma experiência

Outpatient care: experience report
Atención en ambulatorio: relato de una experiencia


INTRODUÇÃO

A Pediatria ambulatorial é a relação médico-paciente mais plena e tranquila, sem interferências nem intermediários. O acompanhamento abrange as diferentes faixas etárias do crescimento e do desenvolvimento; o calendário vacinal; a escolaridade; o tratamento das intercorrências; a detecção precoce de patologias, com encaminhamento e orientação na prevenção de acidentes. Como descreveu o professor Eduardo Marcondes1 no Manual de Pediatria Ambulatorial, o ambulatório é a atividade que mais contribui para a formação de um pediatra.

"O pediatra é também um educador"1. Existe uma relação de confiança, respeito e amizade com a criança e sua família. Suas orientações são valorizadas e acatadas. Um pediatra que exerce atividade em ambulatório está mais propício a adquirir novos conhecimentos1. Outra vantagem do ambulatório é permitir que o mesmo pediatra acompanhe a criança. "Eu sou seu médico" - segundo o Dr. Marcio Maranhão2, esta frase "soava como um bálsamo para um paciente do sistema público".

Por sua vez, o sanitarista Heitor Werneck3 observa que a realidade de um posto de saúde, frequentado geralmente por crianças, grávidas e idosos, é diferente da dos serviços de emergência. "Postos de saúde são espaços simples, onde as pessoas se sentem mais bem acolhidas", lembra ele.


OBJETIVO

O presente estudo descritivo traça um perfil clínico de crianças atendidas em ambulatório, evidenciando a importância desse acompanhamento.


MÉTODO

Estudo descritivo realizado no Ambulatório de Pediatria do Centro Municipal de Saúde (Cemusa) de Teresópolis, RJ. No período de agosto de 2014 a março de 2015, foram selecionados 185 prontuários durante o atendimento ambulatorial.

O critério de seleção obedeceu ao mínimo de três consultas para lactentes; e o intervalo máximo de um ano entre as consultas para as demais faixas etárias. As variáveis estudadas foram: número de consultas no pré-natal, o tipo de parto, o sexo, o aleitamento materno exclusivo, o aleitamento por mais de um ano, a faixa etária, a história de internações, a ocorrência de sobrepeso/obesidade e frequência escolar.


RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram estudados 185 pacientes, cujos dados clínicos e o grau de escolaridade estão descritos na Tabela 1.




Constatamos que 74,05% das mães fizeram mais de seis consultas no pré-natal e que 62,16% das crianças nasceram de parto normal.

A maioria foi de crianças com aleitamento materno exclusivo nos 6 primeiros meses (72,43%). E o aleitamento materno até 1 ano foi mantido num elevado percentual (59,45).

As faixas etárias predominantes foram de pré-escolar e escolar.

No universo de atendimento, os prontuários registraram apenas três casos de internação. Uma criança de 1 ano por varicela (em 2013, antes da administração da vacina), que permaneceu sob observação por uma semana e teve alta sem problemas. Outra, por infecção respiratória aguda aos 7 anos, na época das férias, em 2013, internada no Hospital das Clínicas, com alta após 15 dias. Esta criança veio de outro estado (PB) onde, segundo relato de sua madrasta, teve outras internações nos primeiros anos de vida, antes de chegar em Teresópolis e ser acompanhada pelo ambulatório. O terceiro, uma criança de 3 anos, acompanhada por familiar, por queimadura em 2014, na região torácica, causada por carrocinha de cachorro-quente. A internação, por 15 dias, também foi no Hospital das Clínicas e a alta ocorreu sem problemas.

As crianças com sobrepeso/obesidade pertencem a famílias com esse histórico, mas estão com exames controlados e acompanhamento também nos ambulatórios de Endocrinologia e Nutrição; e a de baixo peso, sob a guarda da avó, vivia em condições precárias, mas está em recuperação ponderal.

O quadro vacinal foi satisfatório, de acordo com as vacinas disponíveis na rede pública. Havia o controle, a cada consulta, da situação vacinal. Se houvesse algum atraso, era alertado e corrigido antes da consulta seguinte. Além disso, sempre eram indicadas as demais vacinas recomendadas pela SBP.

Todas as crianças na fase escolar frequentavam a escola e a grande maioria no ano escolar correspondente à faixa etária.

Ainda quanto à escolaridade, houve dois casos de inclusão. Duas crianças que apresentam TD, mas frequentam a escola (uma delas, trigêmea, acompanhando os irmãos, que estão no sexto ano).

Nesta casuística, encontramos um caso de estenose pulmonar, que está sendo acompanhado pela Cardiologia; um caso de hipostádia, acompanhada pela Clínica Cirúrgica; três casos de hernioplastia inguinal, sendo duas no primeiro ano de vida; duas crianças com traço falcêmico; um caso de hepatite aos 6 anos, em 2009, com alta apresentando exames normais; um caso de vitiligo em criança de 4 anos, acompanhada pela Dermatologia; e aumento do valor do colesterol total em oito crianças: uma de 5 anos (205), uma de 7 anos (196), uma de 7 anos e 6 meses (174), uma de 9 anos (188), uma de 9 anos e 2 meses (180), uma de 10 anos (210), uma de 13 anos (219) e outra de 14 anos e 2 meses (186) - algumas apresentavam erros de alimentação, como lanche em cantina, e todas estão com reforço da orientação dietética.

Este trabalho pretende apresentar uma pequena documentação do exercício de 40 anos de pediatria ambulatorial1. Os resultados foram possibilitados pela prática ambulatorial baseada em três pilares:

I - Acolhida - Ouvir o paciente e seu familiar ou acompanhante, não apenas sobre o motivo da consulta, mas de uma forma mais abrangente;

II - Registro de informações - O preenchimento do prontuário, história pré-natal, parto, anamnese, exame físico, avaliação do crescimento e desenvolvimento, calendário vacinal (também na caderneta da criança, juntamente com o gráfico da OMS), intercorrências, escolaridade, exames, encaminhamentos para especialidades, com registro do parecer e conduta, tratamento, orientações dietética e geral;

III - Retorno do paciente - Importante para o acompanhamento, o retorno deve ser mais breve conforme a necessidade (lactentes, avaliação vacinal, presença de intercorrências e parecer de especialistas), evitando um grande número de internações.


REFERÊNCIAS

1. Marcondes E. Introdução. In: Sayeg DC, Dickstein J, coords. Manual de Pediatria Ambulatorial. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Pediatria; 1995.

2. Maranhão M. Sob Pressão: A Rotina de Guerra de Um Médico Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Foz; 2014.

3. Werneck H. SUS para a classe média. O Globo [Internet]. 07 Jan 2015 [citado 15 Set 2016]. Disponível em: http://oglobo.globo.com/opiniao/sus-para-classe-media-14982407










Médica pediatra do Ministério da Saúde. Pós-graduada em Pediatria pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Membro do Comitê de Pediatria Ambulatorial da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro (SOPERJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Endereço para correspondência:
Elisabeth Maria de Souza Correia de Melo
Centro Municipal de Saúde (Cemusa) de Teresópolis
Rua Fernando Ferrari, nº 61/70, Botafogo
Rio de Janeiro - RJ. Brasil. CEP: 22231-040
E-mail: efcmelo@terra.com.br


1 Neste tempo, meu marido, Fernando Correia de Melo, e eu atendemos algumas gerações de pacientes - hoje, professores, comerciários, guardas municipais, seguranças, engenheiros, advogados.