ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Editorial - Ano 2019 - Volume 9 - Número 3

O Código de Ética Médica, conectado à bioética, acompanha os avanços sociais e da medicina

The Code of Medical Ethics, together with bioethics, follows social and medical advances


O novo Código de Ética Médica (CEM), Resolução CFM 2.217/2018, foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) em novembro de 2018 e entrou em atividade em abril de 2019. É fruto da revisão do CEM que permaneceu em atividade desde abril de 2010. Este, trouxe à época temas e inovações como a previsão de cuidados paliativos, pesquisa envolvendo crianças, reforço à autonomia do paciente e enfoque sobre regras para reprodução assistida. A terminalidade da vida ganhou destaque com a afirmação à ortotanásia, a negação à distanásia e a proibição explícita da Eutanásia e do suicídio assistido, reafirmando o que a Resolução CFM 1.805/2006 já pregara, reconhecida pela Justiça Federal em processo contestador patrocinado pelo Ministério Público Federal (MPF).

De lá para cá, ficou evidente a necessidade de revisá-lo e aperfeiçoá-lo em função do acúmulo, em curto espaço de tempo, de avanços técnico-científicos ocorridos tanto no âmbito da arte e da ciência médica, propriamente ditas, como das relações humanas, profissionais e sociais, além do imperativo de adaptar o Código às recentes resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM) e à legislação vigente no país.

A atual revisão teve início em 2016, por iniciativa do CFM com participação dos Conselhos Regionais de Medicina (CRM), entidades médicas locais e nacionais, Institutos de ensino médico e convidados especialistas. Comissões estaduais receberam por quase dois anos contribuições de médicos regularmente registrados nos CRMs e entidades médicas, analisando cada uma e enviando para revisão da Comissão Nacional sob a coordenação do Presidente do CFM e do seu Corregedor. Ao todo, foram recebidas 1.431 propostas, todas plenamente analisadas.

Três Encontros Regionais e três Encontros Nacionais debateram e deliberaram sobre exclusão, alteração e adição ao texto do CEM vigente.

Temas como segurança e autonomia do paciente e do médico, proteção do ecossistema, atuação do médico com deficiência, cuidados paliativos, pesquisa, discriminação e tempo a ser dedicado ao paciente foram alguns dos pontos debatidos nos princípios fundamentais e nas normas diceológicas (direitos dos médicos). Com relação aos capítulos e artigos deontológicos, “é vedado ao médico”, conteúdos como responsabilidade profissional, direitos humanos, relação com pacientes e familiares, relação entre médicos, remuneração profissional, sigilo profissional inclusive no que tange atendimento a paciente criança ou adolescente, documentos médicos, publicidade médica, ensino e pesquisa, transplante, entre outros, foram, também, amplamente discutidos antes de aprovados.

O novo CEM não é um código somente de princípios, tendo essa modalidade seus defensores, mas sim um código de princípios, direitos e deveres dos médicos, obrigatoriamente resolutivo, por terem o CFM e os CRM o dever institucional de fiscalizar a ética no exercício da medicina. Poucas profissões têm seu código de ética e o usam como a nossa. Nenhuma há tanto tempo, desde 1945.

O CEM e as Resoluções têm força de lei para os médicos, protegendo a sociedade e os que praticam a medicina com dignidade, a quase totalidade, punindo, naturalmente, os faltosos.

O capítulo dos princípios fundamentais é suporte e libelo em defesa dos direitos humanos de médicos e pacientes, do meio ambiente e da liberdade individual e coletiva, fundamentados por princípios bioéticos e humanos, como por exemplo: “A medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza”; “o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional”, dizem o primeiro e segundo princípios, respectivamente. A seguir, alguns outros abordam diretamente os temas: “o médico guardará absoluto respeito pelo ser humano e atuará sempre em seu benefício, mesmo depois da morte”; “Jamais utilizará seus conhecimentos para causar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou para permitir e acobertar tentativas contra sua dignidade e integridade”; “O médico comunicará às autoridades competentes quaisquer formas de deterioração do ecossistema, prejudiciais à saúde e à vida”; “Na aplicação dos conhecimentos gerados pelas novas tecnologias (…) o médico zelará para que as pessoas não sejam discriminadas por nenhuma razão”.

A bioética permeou todo o período de discussões e decisões. Observou-se grande número de especialistas e estudiosos da matéria que imprimiram aos encontros contribuições essenciais à qualidade e justiça do CEM, razão pela qual muitos artigos que fazem parte do novo Código têm forte ingrediente de princípios bioéticos. O que institui a possibilidade do acesso aos prontuários em estudos retrospectivos, desde que justificável, com desenho metodológico adequado aos princípios éticos e bioéticos e autorizado pela Comissão de Ética em Pesquisa em Seres Humanos (CEPSH) ou pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), é um exemplo.

A bioética está conectada ao CFM e não poderia ser de outra forma, já que é parte integrante do seu Código de Ética e de várias ações, como a criação da Revista Bioética em 1993, há 26 anos, e a concepção da sua Câmara Técnica de Bioética, em janeiro de 2011. Dessa maneira, estimulou a formação e manutenção de comissões de bioética nas unidades de saúde e nos CRM. Criou o Congresso de Bioética Clínica em 2011, realizando-o até os dias atuais juntamente com o Congresso da Sociedade Brasileira de Bioética, entidade esta promotora do Congresso Brasileiro de Bioética desde 1996, guardiã dessa ciência adolescente, mas que já reúne acervo de publicações, normas, decisões e nomes reconhecidos dentro e fora das nossas fronteiras, promovendo eventos, publicando artigos e livros, reunindo e estimulando o ensino e a pesquisa dessa disciplina.

Temos um Código de Ética Médica moderno, a Bioética em franca evolução, os Conselhos de Medicina e o CFM se renovando e reorganizando suas ações, os médicos jovens se mobilizando e assumindo importantes responsabilidades, procurando novos caminhos, e o sistema de saúde em péssimas condições. Tempos, portanto, com perspectivas de mudanças, lutas, esperança de união e certeza de muitas conquistas.










Secretário Geral da Sociedade Brasileira de Pediatria