Artigo de Revisao
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Ano 2022 -
Volume 12 -
Número
4
Desafios na implementação de cuidados paliativos na neonatologia: Uma revisão integrativa
Challenges in the implementation of Palliative Care in Neonatology: an integrative review
Bárbara Rocha Rodrigues; Ana Paula Oliveira Boscolo; Letícia Lemos Leão; Marcelo Bernardes da Rocha Reis; Lucas Céspedes Pimenta; Jussara Silva Lima
RESUMO
INTRODUÇÃO: Os cuidados paliativos neonatais vêm se mostrando cada vez mais integrativos, promovendo um cuidado individualizado e centrado no vínculo materno e familiar. Mesmo diante desses progressos, há diversos desafios na implementação de condutas adequadas.
OBJETIVO: Ressaltar a importância e as principais dificuldades na implementação dos cuidados paliativos neonatais.
MÉTODOS: Levantamento bibliográfico em bases de dados do PubMed e LILACS. Foram utilizados os descritores “cuidados paliativos”, “neonatologia” e “dificuldades”. Foram selecionados 10 artigos ao final da revisão.
CONCLUSÃO: Os cuidados paliativos neonatais tiveram grandes avanços, entretanto, sua implementação continua sendo um desafio, não somente por parte da família, mas por falta de formação e capacitação de profissionais do meio. Isso ressalta a importância de educação continuada e criação de protocolos que garantam as necessidades dos pacientes.
Palavras-chave:
Cuidados Paliativos, Neonatologia, Unidades de Terapia Intensiva Neonatal.
ABSTRACT
INTRODUCTION: Neonatal palliative care has been increasingly integrated promoting individualized care, centered on maternal and family bonds. Even progress, there are several difficulties in the implementation of conducts.
OBJECTIVE: To emphasize the importance and mains difficulties in implementing neonatal palliative care.
METHODS: Bibliographic survey in PubMed and Lilacs databases. The descriptor used “neonatal palliative care”, “neonatology” and “difficulties”. Ten articles were selected at the end of review.
CONCLUSION: Neonatal palliative care has made great advances; however, its implementation remains a challenge, not only on the part of the family, but also due to the lack of training and qualification of professionals in the field. This shows the importance of continuing education and creating protocols that meet the needs of patients.
Keywords:
Palliative Care, Neonatology, Intensive Care Units, Neonatal.
INTRODUÇÃO
Anteriormente ao desenvolvimento da disciplina de cuidados paliativos, as medidas de cuidados paliativos eram implementadas somente em momentos imediatos que antecediam a morte, colocando o tratamento curativo e paliativo em polos opostos e, consequentemente, excludentes1,2. A partir do momento em que se explorou mais o atendimento de crianças com dependências tecnológicas, doenças progressivas e debilitantes, além de quadros refratários aos tratamentos tradicionais, notou-se a necessidade de complementar e integrar os cuidados paliativos às medidas terapêuticas curativas.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define cuidados paliativos para crianças como um cuidado ativo e total prestado à criança, no contexto físico, mental e espiritual, bem como o suporte oferecido a toda a sua família; devendo ser iniciado no momento do diagnóstico de uma doença incurável e continuado de maneira independente da criança receber ou não tratamento direcionado à doença3. Para que isso ocorra de maneira eficaz, ressalta-se a importância de um trabalho multidisciplinar, visando, além do controle da dor e de outros sintomas, a atenção individualizada integral de cada paciente4.
Embora apresente abordagem semelhante ao adulto, no que diz respeito ao manejo de sintomas e cuidados para toda família, os cuidados paliativos na criança apresentam expressivas singularidades. Além de ter os pais como alicerce nos cuidados gerais da criança, estas podem apresentar doenças com características familiares, podendo afetar outras crianças na família, assim como condições raras e diagnósticos específicos durante o período infantil, que, por sua vez, diferem do processo de investigação no doente adulto. Além disso, deve-se ressaltar que a criança passa por um processo contínuo e progressivo de desenvolvimento físico, psicológico, emocional e cognitivo, cabendo ao profissional de cuidados paliativos entender e trabalhar o impacto da doença para cada fase da vida5.
Diante do aumento das informações, nos últimos anos, tem-se dado ênfase na importância de implementação de cuidados paliativos de forma cada vez mais precoce, considerando dados pré-natais, como anomalias congênitas letais, limites de viabilidade, em casos de prematuros, e neonatos que não respondem a tratamentos curativos6.
No âmbito da neonatologia, os cuidados paliativos vêm se mostrando mais integrativos, abordando questões que antes eram ignoradas, como os cuidados gerais para minimizar a dor neonatal, evitando procedimentos fúteis e sem benefícios, além de adoção de medidas de conforto para o bebê, promovendo, assim, um tempo de maior qualidade desses bebês com sua família, sendo um cuidado individualizado e centrado no vínculo materno e familiar7.
Mesmo diante de visíveis progressos na área, a carência de estudos e protocolos acaba contribuindo para dificultar a implementação de condutas adequadas para esses pacientes. Diante disso, o presente estudo visa a realização de uma revisão integrativa da literatura acerca da importância e das principais dificuldades enfrentadas pelos médicos para instituição dos cuidados paliativos neonatais.
REVISÃO DA LITERATURA
Para o levantamento bibliográfico, foram realizadas buscas nas seguintes bases de dados: na interface U.S. National Library of Medicine and the National Institute Health (PubMed) e Literatura LatinoAmericana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS). Foram utilizados os seguintes descritores: “cuidados paliativos”, “neonatologia” e “dificuldades”.
Os critérios de inclusão definidos para seleção dos artigos foram os artigos publicados em inglês, português e espanhol, com temática referente à importância e às dificuldades na implementação de cuidados paliativos, com enfoque no período neonatal.
Os critérios de exclusão foram os estudos sobre cuidados paliativos voltados para adultos e idosos, assim como para neonatos submetidos apenas a tratamentos curativos. No intuito de eliminar a duplicidade de artigos, os documentos foram ordenados por títulos e autores, sendo excluídos os que apareceram mais de uma vez.
Para a seleção dos estudos, foi realizada uma revisão dos títulos e resumos. Após a primeira revisão, foram selecionados 20 artigos da base de dados da PubMed e 12 artigos da base de dados do LILACS. Posteriormente, foi realizada nova avaliação dos textos na íntegra, resultando na seleção de 9 artigos da PubMed e 1 artigo da LILACS, que obedeciam aos critérios propostos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Tabela 1 apresenta a categorização dos artigos selecionados quanto ao ano de publicação, tipo de estudo e suas principais abordagens.
De forma geral, os artigos reconhecem e enfatizam a importância da implementação precoce dos cuidados paliativos neonatais, ressaltando a necessidade de protocolos institucionais e uma equipe multidisciplinar que certifique que as necessidades dos recém-nascidos, de seus familiares e dos profissionais envolvidos sejam asseguradas. Mesmo diante do reconhecimento da importância destes cuidados, observam-se diversas barreiras para sua implementação.
As incertezas prognósticas e as indicações dos cuidados paliativos neonatais são dilemas apontados frequentemente apontados pelos profissionais da área, sobretudo pelas consequências éticas e legais. Catlin & Carter8 observaram, em seu trabalho, a necessidade de avaliar as peculiaridades de cada paciente e seus familiares para decisão de implementação dos cuidados paliativos neonatais, todavia, reconhecem as incertezas e dilemas profissionais, delineando um protocolo para conduzir os cuidados paliativos neonatais. Para isso, os autores sugerem os cuidados paliativos aos recém-nascidos no limiar de viabilidade, recém-nascidos que desenvolvem complicações sérias que tornam limitantes da vida e recém-nascidos com anomalias congênitas complexas.
Soares et al.10, assim como Mendes & Justo da Silva13, reforçam a mesma linha de pensamento em seus estudos. Ressaltam a importância da implementação de protocolos internos, além do adequado treinamento de uma equipe multidisciplinar especializada, para a integração dos cuidados paliativos neonatais de forma uniformizada, ponderando as necessidades individuais de cada paciente.
Nota-se que, ainda hoje, mesmo diante do conhecimento e da importância dos cuidados paliativos, existem diversos paradigmas de aceitação, não somente entre os familiares, mas entre os próprios profissionais da área da saúde, que associam os cuidados paliativos somente aos momentos finais da vida de um paciente. Tal fato corrobora com o sentimento dos profissionais de incapacidade e desistência do paciente, ao abordar os cuidados paliativos como forma de cuidado ao paciente.
Silva et al.16 abordam esta questão em seu estudo, demonstrando a importância de maior treinamento e capacitação não somente da equipe médica, mas de toda equipe envolvida nos cuidados e na assistência do recém-nascido e sua família. Da mesma forma, Cortezzo et al.12 reforçam a necessidade de treinamento adequado dos profissionais, destacando a importância do acompanhamento regular destas equipes, evidenciando o peso das decisões a serem tomadas e as constantes perdas e dificuldades emocionais enfrentadas nestas situações.
Diversos locais, muitas vezes centros de referência para atendimentos de prematuros, não dispõem de profissionais devidamente capacitados para indicação dos cuidados paliativos. De acordo com os profissionais da área, a qualidade de vida ligada ao prognóstico dos pacientes é fator fundamental para determinar se o recém-nascido pode ou não se beneficiar dos cuidados paliativos. Assim como a formação de profissionais adequados, os artigos abordam a necessidade de implementação de protocolos que contribuam para uma abordagem segura e multidisciplinar, capaz de amparar e assegurar aos profissionais do meio uma conduta ética que permita cuidados sensíveis às necessidades do bebê e da sua família.
Os cuidados paliativos neonatais vão muito além do que cuidados com recém-nascidos com doenças terminais, são cuidados únicos e desenvolvidos de acordo com a necessidade de cada paciente, assim como a de seus familiares. Devem ser implementados o mais precoce possível, de forma paralela com os cuidados intensivos curativos e progredindo sua atuação, conforme a evolução do caso e discussão entre a equipe de saúde e a família do paciente.
CONCLUSÃO
A implementação dos cuidados paliativos neonatais ainda é um desafio. Não somente por questões sociais e familiares, mas por questões éticas e educacionais da equipe de saúde. Sabe-se que a implementação dos cuidados paliativos neonatais, sensíveis às necessidades do bebê e de sua família, promove uma melhor aceitação e conforto por parte da família e dos profissionais do meio. Ainda assim, muitos profissionais não treinados se sentem inseguros na implantação de cuidados paliativos, por receio de estarem deixando de prover cuidado intensivo necessário ao paciente. Dessa forma, é fundamental buscar melhorar a formação e capacitação dos profissionais do meio, permitindo um processo de educação continuada e criação de protocolos que contribuam para a implementação de cuidados que possam garantir maior conforto a esses pacientes.
REFERÊNCIAS
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Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Departamento de Pediatria - Uberaba - Minas Gerais - Brasil
Endereço para correspondência:
Bárbara Rocha Rodrigues
Universidade Federal do Triângulo Mineiro
Av. Frei Paulino, 30 - Nossa Sra. da Abadia
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E-mail: b.rrodrigues@yahoo.com.br
Data de Submissão: 21/11/2021
Data de Aprovação: 16/07/2022