ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Ponto de Vista - Ano 2024 - Volume 14 - Número 4

Queimadas e saúde da criança: rumo a um país inabitável?

Vegetation fires and children's health: towards an uninhabitable country?

RESUMO

O Brasil enfrenta uma grave crise ambiental devido às queimadas, cujas CONSEQUÊNCIAS afetam profundamente o meio ambiente e a saúde da população. Em 2024, incêndios atingiram proporções alarmantes, resultando na pior qualidade do ar já registrada na cidade de São Paulo. A poluição gerada agrava riscos à saúde, especialmente em crianças menores de cinco anos, que são mais vulneráveis. Entre os poluentes produzidos pelas queimadas, destaca-se o material particulado inalável fino que penetra profundamente nos pulmões, causando inflamação e aumentando a incidência de doenças respiratórias, como exacerbações da asma, bronquite e de outras doenças respiratórias crônicas, maior probabilidade de pneumonia, resfriados, rinossinusites, traqueítes, adenoamigdalites, conjuntivite, irritabilidade, tosse noturna, anorexia, sensação de cansaço e alterações de sono. Além de comprometer a saúde física, a poluição decorrente das queimadas impacta a saúde mental e cardiovascular, elevando a demanda por serviços de saúde. Também contribui para alterações epigenéticas que podem afetar a saúde ao longo da vida. A crise atual reforça a necessidade urgente de políticas públicas que reduzam as queimadas e protejam os grupos mais vulneráveis, especialmente as crianças. O pediatra tem papel crucial ao monitorar os efeitos da poluição, diagnosticar doenças respiratórias e orientar as famílias sobre medidas preventivas durante picos de contaminação. Além disso, pode ser um defensor de políticas públicas que promovam ambientes mais saudáveis e sustentáveis, garantindo o cuidado adequado às crianças diante desses riscos. Medidas eficazes são essenciais para não caminharmos rumo a um país inabitável.

Palavras-chave: Poluição do ar, Incêndios florestais, Fumaça, Material particulado, Saúde da criança.

ABSTRACT

Brazil faces a severe environmental crisis due to wildfires, whose consequences deeply affect the environment and public health. In 2024, fires reached alarming levels, resulting in the worst air quality ever recorded in São Paulo. The pollution generated exacerbates health risks, particularly for children under five, who are more vulnerable. Among the pollutants produced by the fires, the fine inhalable particulate matter stands out, as it penetrates deeply into the lungs, causing inflammation and increasing the incidence of respiratory diseases, such as asthma exacerbations, bronchitis, and other chronic respiratory conditions. It also heightens the likelihood of pneumonia, colds, sinusitis, tracheitis, tonsillitis, conjunctivitis, irritability, nighttime coughing, anorexia, fatigue, and sleep disturbances. In addition to compromising physical health, pollution from the fires affects mental and cardiovascular health, increasing demand for healthcare services. It also contributes to epigenetic changes that can impact health throughout life. The current crisis highlights the urgent need for public policies that reduce wildfires and protect vulnerable groups, especially children. Pediatricians play a crucial role in monitoring the effects of pollution, diagnosing respiratory diseases, and advising families on preventive measures during contamination peaks. Furthermore, they can advocate for public policies that promote healthier and more sustainable environments, ensuring proper care for children in the face of these risks. Effective measures are essential to prevent us from heading toward an uninhabitable country.

Keywords: Air pollution, Wildfires, Wildfire smoke, Particulate matter, Child health.


INTRODUÇÃO

O Brasil tem a destruição ambiental gravada em seu próprio nome. A madeira da Caesalpina echinata, ou pau-brasil, despertou interesse comercial desde o início da colonização portuguesa, por fornecer um corante vermelho apreciado na Europa. A exploração ilimitada levou a espécie praticamente à extinção. Dessa forma, o patrimônio natural do país traz as marcas de uma devastação conduzida a ferro e fogo1.

O fogo desempenha um papel multifacetado sobre os biomas brasileiros. As regiões de savanas e estepes, como o Cerrado e o Pampa, foram evolucionariamente modeladas pelo contato com o fogo, de origem natural, geralmente limitado, desencadeado por raios. As regiões florestais no território brasileiro não são suscetíveis ao fogo de origem natural. Sua combustão é quase invariavelmente antropogênica, com objetivo de exploração econômica, causando graves danos à biodiversidade e às populações animais e humanas expostas2.

A queimada pode ser definida como a limpeza controlada da biomassa de uma área por meio do fogo, com finalidades agropecuárias. Quando a queima de vegetação rural ou nativa ocorre fora de controle, usa-se o termo incêndio florestal3. Neste artigo, esses termos serão unificados pela sigla QIF (queimadas e incêndios florestais).

O aumento da frequência e da gravidade de incêndios em diversas partes do globo está diretamente relacionado às mudanças climáticas globais e às mudanças do uso da terra4. Em 2024, até o dia 16 de setembro, foram registrados no Brasil cerca de 184.363 focos de incêndio, segundo o monitoramento realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). No ano anterior inteiro, foram registrados pelo INPE 189.926 focos de incêndio no país5.

No segundo semestre de 2024, o Brasil foi tomado por QIF que assolaram todo o país. É sabido que, devido à estação seca e de baixa umidade relativa do ar, o auge da temporada de QIF costuma ocorrer entre os meses de junho a outubro6. Contudo, a piora da crise climática e do fenômeno El Niño deste ano, que trouxe secas e ondas de calor mais intensas, associadas aos incêndios de motivação criminosa, culminaram nos fenômenos extremos que estamos vivendo7.

No dia 9 de setembro de 2024, a cidade de São Paulo foi declarada pela plataforma suíça IQAir, que monitora em tempo real a qualidade do ar de 121 grandes cidades do planeta, como a cidade com a pior qualidade do ar do mundo8,9. A cidade esteve no ranking das cinco cidades mais poluídas do mundo durante cinco dias consecutivos10. Diversas notícias circularam na mídia, com fotos e vídeos alarmantes com prejuízos significativos para a fauna e a flora, além do fato de que as fumaças provenientes dos incêndios ocuparam mais de 60% do território brasileiro11.

A mudança do uso da terra tem sido descrita como responsável por 74% das emissões brasileiras de Gases de Efeito Estufa (GEE)12. Essa categoria abrange tanto o desmatamento de florestas, para dar lugar à agropecuária, quanto as queimadas para cultivo, além do desenvolvimento de vegetação em áreas anteriormente degradadas13. Nos últimos 39 anos, 60 milhões de hectares de florestas foram transformados em pastagens só na Amazônia legal, que em 2022 concentrava 44,3% do rebanho bovino do Brasil14. A combinação de seca e temperaturas altas, resultantes das mudanças climáticas, facilita a propagação do fogo. Em contrapartida, estima-se que, em 2024, entre 95% e 97% dos focos de incêndio no Brasil foram causados por ação humana criminosa7.

Exposição à poluição do ar

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 99% da população mundial vive em ambientes que excedem os níveis de poluição do ar recomendados15. Atualmente, a poluição do ar é o segundo fator de risco de mortes no mundo. Em 2021, foi responsável por um total de 8,1 milhões de mortes (12% do total)16.

A poluição do ar pode ser descrita como a presença de contaminantes no ar, que podem incluir gases, partículas em suspensão ou compostos orgânicos voláteis, oriundos tanto de atividades humanas quanto de fenômenos naturais17. Esses poluentes são prejudiciais à saúde das pessoas e também causam danos ao meio ambiente, tanto a curto quanto a longo prazo. Ela se divide em poluição do ar intradomiciliar, que ocorre dentro de edifícios e residências, e poluição do ar extradomiciliar, também chamada de poluição ambiental, que se refere à contaminação do ar em espaços externos15.

Os poluentes atmosféricos podem ser categorizados, com base em sua composição, em: poluentes gasosos, como o ozônio (O3), dióxido de nitrogênio (NO2), o monóxido de carbono (CO) e dióxido de enxofre (SO2); e o Material Particulado (MP)18. O MP é classificado de acordo com o tamanho de suas partículas em: Material Particulado Inalável, com diâmetro inferior a 10 µm (MP10), Material Particulado Inalável Fino, com diâmetro menor que 2,5 µm (MP2,5), e Material Particulado Ultrafino (MP0,1), com diâmetro inferior a 0,1µm19. A forma como o MP é depositado ao longo do sistema respiratório está diretamente relacionada às suas características de tamanho, forma e densidade. Partículas maiores que 10µm tendem a se acumular nas vias aéreas superiores e são retidas pelo nariz. O MP10 consegue alcançar as vias respiratórias inferiores, atingindo as vias de condução, enquanto o MP2,5 oferece maior perigo, já que suas partículas se acumulam nas regiões mais profundas dos bronquíolos terminais e alvéolos. O MP0,1, por sua vez, pode atingir os alvéolos e penetrar na corrente sanguínea20,21.

Durante os períodos mais secos do ano, a poluição atmosférica tende a aumentar devido à inversão térmica, um fenômeno natural no qual o ar frio fica retido por uma camada de ar quente próximo à superfície terrestre, criando um acúmulo de poluentes. Esse acúmulo, comum em áreas muito urbanizadas, foi agravado pelo aumento das QIF, e resultou em índices recordes de poluição do ar no segundo semestre de 20247.

Quais são as alterações de saúde causadas pelas queimadas e incêndios florestais?

De modo direto, as QIF provocam poluição do ar por aumento de MP, especialmente do MP2,5, e de gases como CO, NO2, O3 e SO222, além da diminuição da umidade relativa do ar e aumento de doenças em crianças e adultos, ao agir nas vias respiratórias causando inflamação e infecção. De modo indireto, a poluição causada pelas QIF pode ativar determinados genes e silenciar outros. Trata-se da epigenética. Ela permite entender como a natureza é capaz de operar transformações profundas no organismo, podendo alterar o DNA (ácido desoxirribonucleico) e não mudar o genoma23.

Estudos que avaliaram exposição à poluição do ar mostraram que as exposições de curto e longo prazo ao MP causam alterações epigenéticas, como a metilação do DNA, modificando a expressão de genes ligados à imunidade inata e adaptativa, com destaque para aqueles associados ao risco de asma20.

A exposição à poluição do ar externo no início da vida tem sido associada ao início da asma durante a infância por efeitos sobre a inflamação e a antioxidação24. Também tem sido associada a uma pior função pulmonar e infecções respiratórias em crianças25. Além disso, a exposição materna pré-natal pode aumentar o risco de asma na prole26.

Dessa forma, todas as doenças respiratórias agudas dos tratos respiratório superior e inferior, incluindo otites, sinusites, amigdalites, pneumonia, e exacerbações de doenças pulmonares crônicas como asma, fibrose cística, discinesia ciliar primária e bronquite, podem apresentar maiores prevalência em ambientes poluídos por fumaça de QIF.

Além dos danos ao sistema respiratório, a exposição ao MP está epidemiologicamente associada a maior risco de prematuridade, baixo peso ao nascer, doenças cardiovasculares, neoplasias, acidentes vasculares cerebrais, transtornos mentais e excesso de mortalidade em geral27.

Por que as crianças são especialmente suscetíveis aos efeitos da poluição do ar?

Em 2021, a poluição do ar foi o segundo principal fator de risco de morte entre crianças menores de 5 anos, ficando atrás somente da desnutrição16.

Numerosos fatores ambientais, incluindo poluição intra e extradomiciliar, alteram a estrutura e função das vias aéreas superiores e inferiores de crianças. Elas têm o trato respiratório menos desenvolvido e um sistema imunológico imaturo e, portanto, são mais suscetíveis a efeitos adversos causados por exposições ambientais. Elas também têm uma frequência respiratória mais alta e passam mais tempo ao ar livre do que os adultos, sendo inerentemente mais expostas e vulneráveis aos efeitos das exposições ambientais28.

A exposição à poluição do ar, intensificada pelas QIF, provoca sérios riscos à saúde, sobretudo em crianças menores de 5 anos de idade, que são mais vulneráveis. Entre os poluentes liberados estão partículas de MP2,5, que atingem as vias aéreas superiores e inferiores onde penetram profundamente nos pulmões. Os desfechos da poluição, provocados pelas QIF, resultam em inflamação e aumento da incidência de doenças das vias respiratórias inferiores, superiores e o aparecimento de numerosos sinais e sintomas clínicos, muitas vezes inespecíficos. As interações entre poluição, diminuição da umidade relativa do ar e inflamação, em diferentes órgãos do organismo, resultam em: exacerbações da asma, bronquite e de outras doenças respiratórias crônicas (fibrose cística, discinesia ciliar primária, bronquiolite obliterante, displasia broncopulmonar, bronquiectasias), maior probabilidade de pneumonia, resfriados, rinossinusites, traqueítes, adenoamigdalites, conjuntivite, irritabilidade, tosse noturna, anorexia, sensação de cansaço e alterações de sono. Além disso, a poluição exacerbada pelas QIF contribui para alterações epigenéticas que podem afetar a saúde ao longo da vida.

As QIF também têm impacto sobre a saúde mental e cardiovascular, aumentando a demanda por serviços de saúde. A situação evidencia a urgência de medidas preventivas e políticas públicas que reduzam as QIF e protejam as populações mais vulneráveis, especialmente as crianças menores de 5 anos de idade.

Qual é o papel do pediatra diante da crise das queimadas?

Tendo em vista o grande interesse da comunidade científica a respeito dos males provocados sobre a saúde do ser humano, sugere-se que o pediatra destine estratégias de educação continuada para mitigar os efeitos das QIF, da poluição do ar, da baixa umidade relativa do ar e da deterioração do meio ambiente e seus efeitos na saúde das crianças e dos adolescentes.

Além disso, o pediatra pode desempenhar um papel fundamental ao se engajar em iniciativas locais de conscientização, alertando sobre os impactos negativos das QIF e incentivando práticas preventivas. A sensibilização da comunidade sobre a importância de reduzir a exposição a ambientes poluídos, especialmente em períodos de pico de QIF, pode ser uma medida eficaz. Isso inclui instruir os pais a adotarem precauções simples, como manter as janelas fechadas em dias de alta concentração de poluentes, o uso de purificadores de ar em ambientes fechados e o incentivo à hidratação adequada, considerando o impacto da baixa umidade29. Adicionalmente, o uso de máscaras poderá proporcionar uma significativa proteção para crianças maiores de 2 anos. Neste cenário, as máscaras cirúrgicas simples apresentam baixa eficiência (20%) na contenção de partículas menores, sendo que as máscaras do tipo N95 ou PFF2 apresentam eficiência de 80%30.

Outro aspecto crucial é o acompanhamento de doenças respiratórias de forma contínua. Dada a prevalência de casos de asma, bronquite e infecções respiratórias desencadeadas pela poluição, o pediatra pode implementar programas de monitoramento para crianças com doenças respiratórias crônicas. Esses programas visam controlar melhor as exacerbações durante os períodos críticos e garantir que as famílias estejam devidamente orientadas sobre como agir em momentos de maior poluição.

Em termos de formulação de políticas e a alocação de recursos públicos, os pediatras podem participar ativamente na elaboração e na defesa de políticas públicas de saúde e ambientais. Colaborar com órgãos de saúde e meio ambiente para promover ações que diminuam o desmatamento, incentivem o reflorestamento e regulem a prática de queimadas pode ser uma estratégia eficaz para proteger a saúde das crianças. Os profissionais de saúde podem usar sua voz para demandar melhores condições de vida, especialmente para as populações vulneráveis.

Por fim, integrar-se a redes de pesquisa sobre o impacto das mudanças climáticas na saúde de crianças e adolescentes pode fornecer novas ferramentas para o enfrentamento desse problema. Ao se manter atualizado com os mais recentes estudos e diretrizes sobre poluição do ar e saúde infantil, o pediatra estará mais bem preparado para proteger seus pacientes e orientar as famílias sobre a importância de um ambiente saudável e seguro.


CONCLUSÃO

O Brasil tem uma participação relevante na disseminação de poluentes atmosféricos em nível global, especialmente devido ao desmatamento e às QIF31. Fica evidente que o país se encontra em uma encruzilhada crítica em relação às políticas ambientais e de saúde pública.

As QIF, exacerbadas por fatores como as mudanças climáticas e a ação humana irresponsável e criminosa, têm gerado consequências devastadoras, não apenas para a biodiversidade, mas também para a saúde da população. A presença de substâncias nocivas no ar representa um problema ambiental significativo, atingindo pessoas de todas as classes socioeconômicas32,33. Contudo, as consequências da poluição e das mudanças climáticas têm um impacto muito mais intenso sobre países e populações em situação de vulnerabilidade econômica, bem como sobre grupos etários específicos, como crianças menores de 5 anos e adultos maiores de 60 anos15. Essas populações são frequentemente as mais expostas aos efeitos adversos da poluição, enfrentando riscos exacerbados à saúde, o que ressalta a necessidade de políticas públicas direcionadas à proteção dos mais vulneráveis.

As QIF não só aumentam a incidência de doenças respiratórias, mentais e cardiovasculares27, como também elevam a demanda por serviços de saúde, diminuindo a qualidade de vida e a expectativa de vida34. As alterações epigenéticas provocadas pela poluição ressaltam a necessidade de uma abordagem holística, que considere não apenas os efeitos imediatos, mas também as consequências em longo prazo para as futuras gerações.

A piora da qualidade do ar observada em setembro de 2024, com São Paulo sendo reconhecida como a cidade mais poluída do mundo, ilustra a urgência da situação. É fundamental que se implementem políticas públicas eficazes que visem a redução das emissões de poluentes e a proteção das populações mais vulneráveis. Entretanto, segundo o Relatório Global de Ponto de Não Retorno35, apresentado na 28ª Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP 28), em 2023, isso por si só pode não ser mais o suficiente.

Atingimos o momento no qual, mesmo com esforços para reduzir as emissões de poluentes, os efeitos das QIF e da poluição podem continuar a impactar nossa saúde e meio ambiente de maneira grave. Nesse cenário, é crucial diversificar as estratégias de resposta. Devemos investir em tecnologias de purificação do ar e promover a reabilitação de áreas degradadas, criando zonas de amortecimento que ajudem a absorver poluentes. Além disso, a educação ambiental deve ser intensificada, capacitando comunidades a adotar práticas sustentáveis e resilientes. A preparação para cenários de saúde pública, incluindo planos de emergência e suporte psicológico, é vital, especialmente para as populações mais vulneráveis. É um momento que exige não apenas ação imediata, mas também uma visão em longo prazo para mitigar as consequências e garantir a saúde das futuras gerações.

Medidas preventivas, como a regulamentação do uso do fogo e a promoção de alternativas sustentáveis para a agricultura e a pecuária, são imperativas. Além disso, a educação e conscientização da população sobre os riscos associados à poluição do ar e às QIF são essenciais para a mobilização social em prol de um futuro mais saudável e sustentável.

O Brasil, com sua rica biodiversidade e recursos naturais, tem a oportunidade de liderar iniciativas globais de conservação e sustentabilidade. Entretanto, essa liderança só será possível se a proteção ambiental for priorizada em todas as esferas da governança. O combate à crise das QIF e à poluição do ar deve ser encarado como uma questão de saúde pública, exigindo uma resposta imediata e eficaz para garantir a qualidade de vida das gerações presentes e futuras.

A ação do médico pediatra é fundamental para a proteção da saúde da criança e do adolescente em face da poluição e das QIF. Esses profissionais desempenham um papel crítico ao monitorar os efeitos da poluição na saúde das crianças, identificando doenças respiratórias e orientando os pais sobre medidas preventivas durante períodos de alta contaminação do ar. Além disso, os pediatras podem assumir a função de defensores de políticas públicas que priorizam a criação de ambientes saudáveis. Considerando a vulnerabilidade das crianças, especialmente as menores de 5 anos, sua contribuição se torna essencial para a promoção de um futuro mais saudável e sustentável, assegurando cuidados adequados e defendendo ações que mitiguem os riscos ambientais, para não caminharmos rumo a um país inabitável.


REFERÊNCIAS

1. Sá MR. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica Brasileira. História Ciênc Saúde-Manguinhos. 1996 Nov;3(3):558-9.

2. Pivello V, Vieira I, Christianini A, Ribeiro D, Menezes L, Berlinck C. Understanding Brazil's catastrophic fires: Causes, consequences and policy needed to prevent future tragedies. PECON. 2021 Sep;19(3):233-55.

3. Caumo SE, Gioda A, Carreira R, Jacobson LSV, Hacon S. Human health impacts caused by exposure to forest fires: the evidence obtained in the last two decades. Br J Climatol. 2022 Jun; 30(1):182-218.

4. Mario E, Raffaele L, Onofrio C, Maria CSJ, Valentina B, Vincenzo G, et al. Coupling heat wave and wildfire occurrence across multiple ecoregions within a Eurasia longitudinal gradient. Sci Total Environ. 2024 Feb 20;912:169269.

5. Instituto nacional de pesquisas espaciais (INPE). Monitoramento dos Focos Ativos por País - Programa Queimadas [Internet]. 2024; [acesso em 2024 Set 16]. Disponível em: https://terrabrasilis.dpi.inpe.br/queimadas/situacao-atual/estatisticas/estatisticas_paises/.

6. Instituto nacional de pesquisas espaciais (INPE). Programa Queimadas [Internet]. 2024; [acesso em 2024 Set 16]. Disponível em: https://terrabrasilis.dpi.inpe.br/queimadas/portal/.

7. Jansen R. Entrevista com Carlos Nobre. Climatologista e referência internacional em estudos sobre aquecimento global. ‘Estou apavorado. Ninguém previa isso; é muito rápido', diz Carlos Nobre sobre crise climática. Estadão [Internet]. 2024; [citado 2024 Set 28]. Disponível em: https://www.estadao.com.br/sustentabilidade/crise-clima-seca-queimadas-amazonia-carlos-nobre/.

8. IQAir. Live most polluted major city ranking [Internet]. 2024; [access in 2024 Sep 16]. Available from: https://www.iqair.com/world-air-quality-ranking.

9. Lacerda L. Fumaça: São Paulo amanhece com ar mais sujo do mundo. Cotidiano. Folha de S.Paulo [Internet]. 2024 Set 9; [citado 2024 Set 16]. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/09/sao-paulo-e-regiao-metropolitana-registram-qualidade-do-ar-muito-ruim-nesta-segunda-9.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwa.

10. Lucena A. SP tem a pior qualidade do ar entre grandes cidades do mundo pelo 5o dia seguido. Sustentabilidade. CartaCapital [Internet]. 2024 Set 13; [cited 2024 Set 16]. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/sustentabilidade/sp-tem-a-pior-qualidade-do-ar-entre-grandes-cidades-do-mundo-pelo-5o-dia-seguido/.

11. CartaCapital. Brasil tem cerca de 60% de seu território coberto por fumaça das queimadas. CartaCapital [Internet]. 2024 Set 9; [citado 2024 Sep 16]. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/brasil-tem-cerca-de-60-de-seu-territorio-coberto-por-fumaca-das-queimadas/.

12. Potenza R, Quintana G, Cardoso A, Tsai D, Cremer M, Barcellos e Silva F. Observatório do Clima, Análise das emissões brasileiras de gases de efeito estufa e suas implicações para as metas de clima do Brasil 1970-2021. Observatório do Clima [Internet]. 2023; [citado 2024 Sep 16] p. 46. Disponível em: https://www.oc.eco.br/wp-content/uploads/2023/03/SEEG-10-anos-v4.pdf.

13. Soares Filho B, Hissa L, Nassar A, Harfuch L, Moreira M, Bachion L, et al. Estudo de Baixo Carbono para o Brasil: Uso da terra, mudanças do usa da terra e florestas. Cetesb [Internet]. 2010; [cited 2024 Sep 16]. 292 p. Disponível em: https://cetesb.sp.gov.br/proclima/wp-content/uploads/sites/36/2020/03/UsoTerra_Final_Portugue.pdf.

14. Salati P. Como a Amazônia se tornou berço do maior rebanho de bois no Brasil. G1 [Internet]. 2024 Jul 23; [cited 2024 Sep 16]. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/agronegocios/agro-de-gente-pra-gente/noticia/2024/07/23/como-a-amazonia-se-tornou-berco-do-maior-rebanho-de-bois-no-brasil.ghtml.

15. World Health Organization (WHO). Ambient air pollution data [Internet]. 2024; [access in 2024 Sep 16]. Available from: https://www.who.int/data/gho/data/themes/air-pollution/ambient-air-pollution.

16. Health Effects Institute (HEI). State of Global Air 2024 [Internet]. Boston, MA: Health Effects Institute; 2024; [access in 2024 Sep 16]. 35 p. Available from: https://www.stateofglobalair.org/resources/report/state-global-air-report-2024.

17. Jacobson M. Air Pollution and Global Warming: History, Science, and Solutions [Internet]. 2nd ed. Cambridge University Press; 2012:12-27. Available from: http://assets.cambridge.org/97811070/21617/frontmatter/9781107021617_frontmatter.pdf.

18. Tiotiu AI, Novakova P, Nedeva D, Chong-Neto HJ, Novakova S, Steiropoulos P, et al. Impact of Air Pollution on Asthma Outcomes. Int J Environ Res Public Health. 2020 Aug 27;17(17):6212.

19. Wilson WE, Suh HH. Fine particles and coarse particles: concentration relationships relevant to epidemiologic studies. J Air Waste Manag Assoc. 1995. 1997 Dec 1;47(12):1238-49.

20. Goossens J, Jonckheere A, Dupont L, Bullens D. Air Pollution and the Airways: Lessons from a Century of Human Urbanization. Atmosphere. 2021 Jul;12(7):898.

21. Souza AP, Gomez CCS, Ribeiro MAGO, Costa PDP, Ribeiro JD. Correlations between ambient air pollution and the prevalence of hospitalisations and emergency room visits for respiratory diseases in children: a systematic review. Arch Dis Child. [Internet]. 2024 May 29; [cited 2024 Sep 28]. Available from: https://adc.bmj.com/content/early/2024/05/28/archdischild-2023-326214.

22. Coelho TF, Souza AR, Souza JAPLL, Pedroza MM. Impactos dos poluentes resultantes das queimadas na saúde humana: impacts of pollutants resulting from burns on human health. Rev Eng E Tecnol [Internet]. 2023 Jul 11; [cited 2024 Sep 28];15(1). Available from: https://revistas.uepg.br/index.php/ret/article/view/21752.

23. Davidson EJ, Yang IV. Role of epigenetics in the development of childhood asthma. Curr Opin Allergy Clin Immunol. 2018 Apr;18(2):132-8.

24. Bettiol A, Gelain E, Milanesio E, Asta F, Rusconi F. The first 1000 days of life: traffic-related air pollution and development of wheezing and asthma in childhood. A systematic review of birth cohort studies. Environ Health Glob Access Sci Source. 2021 Apr 17;20(1):46.

25. Ribeiro M, Lima M, Ilacqua R, Savoia E, Alvaregenga R, Vittor A. Amazon Wildfires and Respiratory Health: Impacts during the Forest Fire Season from 2009 to 2019. Int J Environ Res Public Health [Internet]. 2024; [cited 2024 Sep 28]; 21(6):675. Available from: https://www.mdpi.com/1660-4601/21/6/675

26. Hazlehurst MF, Carroll KN, Loftus CT, Szpiro AA, Moore PE, Kaufman JD, et al. Maternal exposure to PM2.5 during pregnancy and asthma risk in early childhood: consideration of phases of fetal lung development. Environ Epidemiol [Internet]. 2021 Apr; [cited 2024 Sep 28]; 5(2):e130. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33709049/.

27. Bazyar J, Pourvakhshoori N, Khankeh H, Farrokhi M, Delshad V, Rajabi E. A comprehensive evaluation of the association between ambient air pollution and adverse health outcomes of major organ systems: a systematic review with a worldwide approach. Environ Sci Pollut Res. 2019 May 1;26(13):12648-61.

28. Hernandez-Pacheco N, Kere M, Melén E. Gene-environment interactions in childhood asthma revisited; expanding the interaction concept. Pediatr Allergy Immunol. 2022 May;33(5):e13780.

29. Instituto Ar. Médicos pelo Ar Limpo. No combate às mudanças climáticas e à poluição do ar. [Internet]. [Acesso em 2024 Out 20]. Disponível em: https://institutoar.org.br/medicospeloarlimpo.

30. Holm SM, Miller MD, Balmes JR. Health effects of wildfire smoke in children and public health tools: a narrative review. J Expo Sci Environ Epidemiol. 2021 Jan;31(1):1-20.

31. Silva AMC, Mattos IE, Ignotti E, Hacon SS. Material particulado originário de queimadas e doenças respiratórias. Rev Saúde Pública. 2013 Jun;47(2):345-52.

32. Machado-Silva F, Libonati R, Lima TFM, Peixoto RBP, França JRA, Magalhães MAFM, et al. Drought and fires influence the respiratory diseases hospitalizations in the Amazon. Ecol Indic. 2020 Feb 1;109:105817.

33. Urrutia-Pereira M, Badellino H, Ansotegui IJ, Guidos G, Solé D. Climate change and allergic diseases in children and adolescents. Allergol Immunopathol (Madr). 2022 Apr 28;50(Suppl 1):7-16.

34. Anderson L, Marchezini V. Mudanças na exposição da população à fumaça gerada por incêndios florestais na Amazônia: o que dizem os dados sobre desastres e qualidade do ar? Saúde Debate. 2021 Jul 5;44(Spe 2):284-302.

35. Lenton TM, Armstrong McKay DI, Loriani S. The Global Tipping Points Report 2023 [Internet]. University of Exeter, Exeter, UK: University of Exeter; 2023 Dec; [cited 2024 Oct 11]. 478 p. Available from: https://report-2023.global-tipping-points.org.











1. Doutoranda em Ciências - Saúde da Criança e do Adolescente, pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP. Mestra em Ciências pela UNICAMP
2. Professor Associado I, Livre Docente, do Departamento de Pediatria da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
3. Pesquisadora associada da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
4. Professor Titular de Pediatria. Área de Pneumologia Pediátrica Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP. Pneumologista pediátrico

Endereço para correspondência:
José Dirceu Ribeiro
Universidade Estadual de Campinas
Rua Tessália Vieira de Camargo, 126 – Cidade Universitária Zeferino Vaz
CEP 13083-887 – Campinas, SP, Brasil
E-mail: dirceu@fcm.unicamp.br

Data de Submissão: 21/10/2024
Data de Aprovação: 29/10/2024