ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Relato de Caso - Ano 2024 - Volume 14 - Número 4

Massa mediastinal em lactente - relato de caso

Mediastinal mass in an infant - case report

RESUMO

INTRODUÇÃO: O teratoma mediastinal é uma neoplasia originada de células germinativas e compreendem cerca de 8%-16% dos tumores nessa região. São incomuns em crianças e igualmente incidentes entre os sexos. Comumente, o diagnóstico é realizado após o nascimento devido ao surgimento de sintomas respiratórios, sendo quase sempre incidental. Apresenta ótimo prognóstico quando completamente ressecados e por isso é vital a suspeição e diagnóstico precoces através de exames de imagem.
OBJETIVO: Evidenciar a ocorrência de tumores mediastinais em crianças com história de pneumonia recorrentes que cursam de forma atípica e ressaltar a importância de ter os tumores mediastinais como diagnóstico diferencial para que a investigação seja realizada adequadamente.
RELATO DE CASO: Lactente, 7 meses de vida, apresentou-se ao pronto-socorro de um hospital universitário no interior de Minas Gerais com quadro de taquidispneia, insuficiência respiratória e rejeição do seio materno. Paciente com múltiplos diagnósticos de pneumonia anteriores sem resposta à antibioticoterapia. Durante a investigação, foram realizados exames de imagem que evidenciaram massa mediastinal em compartimento anterior com componente gorduroso e áreas de calcificação. Foi realizada uma toracotomia esquerda no 5° espaço intercostal, com ressecção completa da teratoma. O paciente evolui com melhora completa do quadro, sendo acompanhado até os 13 anos de idade sem recorrências.
CONCLUSÃO: Tumores mediastinais são raros e aumentam a morbimortalidade infantil. A suspeita e aplicação de métodos de diagnósticos adequados e os procedimentos cirúrgicos são essenciais para o tratamento e redução de danos a esses pacientes, que muitas vezes são submetidos a tratamentos desnecessários antes do diagnóstico.

Palavras-chave: Teratoma, Neoplasias do mediastino, Cirurgia torácica, Lactente, Diagnóstico, Resultado do tratamento.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Mediastinal Teratoma is a neoplasm originating from germ cells and comprises about 8-16% of tumors in this region. They are uncommon in children and equally incident among sexes. Commonly, diagnosis is made after birth due to the emergence of respiratory symptoms, often being incidental. It presents an excellent prognosis when completely resected, highlighting the vital importance of early suspicion and diagnosis through imaging exams.
OBJECTIVE: To highlight the occurrence of mediastinal tumors in children with a history of recurrent pneumonia presenting atypically, emphasizing the importance of considering mediastinal tumors as a differential diagnosis to ensure appropriate investigation.
CASE REPORT: A 7-month-old infant presented to the Emergency Department of a university hospital in the interior of Minas Gerais, Brazil, with symptoms of tachypnea, respiratory failure, and rejection of maternal breastfeeding. The patient had multiple previous diagnoses of pneumonia with no response to antibiotic therapy. Imaging exams during the investigation revealed a mediastinal mass in the anterior compartment with fatty components and areas of calcification. Left thoracotomy was performed at the 5th intercostal space, with complete resection of the teratoma. The patient had complete resolution of symptoms and was followed up until 13 years of age without recurrence.
CONCLUSION: Mediastinal tumors are rare and increase infant morbidity and mortality. Suspecting and applying appropriate diagnostic methods and surgical procedures are essential for treatment and reducing harm to these patients, who often undergo unnecessary treatments before diagnosis.

Keywords: Teratoma, Mediastinal neoplasms, Thoracic surgery, Infant, Diagnosis, Treatment outcome.


INTRODUÇÃO

Teratomas são tumores de células germinativas, compostos geralmente por três camadas embrionárias (endoderma, mesoderma e ectoderma), múltiplos tecidos e arquitetura variável. Muitos desses tumores contêm tecidos cutâneos, neurais, adiposos, cartilaginosos, intestinais e ganglionares normais1,2.

Mediastino é o sítio extragonadal mais frequente de apresentação desses tumores. Epidemiologicamente, os teratomas representam cerca de 10% das neoplasias primárias de mediastino, sendo 70% dos casos de etiologia benigna3.

Em relação aos tumores de células germinativas que acometem a população pediátrica, 80% são de etiologia benigna, sendo 4% de localização mediastinal, acometendo igualmente os sexos3. Apesar disso, o prognóstico desses pacientes não se altera em relação à etiologia do tumor1.

A sintomatologia dos pacientes com massas mediastinais é bastante inespecífica e se apresenta de acordo com as estruturas acometidas. Variando de indivíduos assintomáticos a pacientes com sintomas de desconforto respiratório, dor torácica, tosse e estridor devido à compressão de órgãos vitais4.

O diagnóstico de teratomas mediastinais é difícil de ser realizado devido à escassa sintomatologia apresentada pela maioria dos pacientes. Entretanto, há relatos de pacientes cuja sintomatologia inicial variava entre hemoptise, tosse, pleurite, dor torácica, dispneia, sendo atribuída à empiema, tuberculose ou pneumonia5. A falha e o atraso no diagnóstico desencadeiam tratamentos com pouca efetividade e prejuízo para o paciente.

Portanto, os teratomas mediastinais são tumores raros, especialmente na faixa etária pediátrica. Grande parte tem seu diagnóstico acidental em exames de rotina6, dessa maneira, nosso objetivo com este relato é lembrar que esse é um diagnóstico diferencial possível para quadros em que há sintomas respiratórios de origem desconhecida. Além disso, considerar essa possibilidade diagnóstica precocemente é fundamental para prevenir complicações.


RELATO DE CASO

Lactente, masculino, branco, natural de Araxá-MG, com história de diagnóstico de pneumonia com 1 mês de idade internado para tratamento com antibióticos. Aos 6 meses, houve recorrência, sendo novamente internado para tratamento. Aos 7 meses, foi encaminhado ao Pronto-Socorro do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Apresentava-se em regular estado geral, corado, hidratado, taquidispneico, com intenso desconforto respiratório, sibilos expiratórios, dessaturando 91%, afebril a 36,2ºC e com recusa da amamentação. A investigação foi iniciada com a coleta de exames laboratoriais e radiografia de tórax. Os laboratoriais mostraram ausência de leucocitose, ausência de distúrbios hidroeletrolíticos e PCR levemente alterada, o RX evidenciou opacidade em hemitórax esquerdo de contornos bem definidos e desvio da área cardíaca para direita, além disso, presença de atelectasia subsegmentar em lobo inferior direito (Figura 1).



Posteriormente, foi realizada tomografia computadorizada de tórax, que mostrou massa em hemitórax esquerdo, com partes densas e hipodensas promovendo desvio de área cardíaca para hemitórax direito com íntimo contato com artéria carótida comum esquerda, ramos proximais do arco aórtico, crossa da aorta, átrio e ventrículo esquerdos e artéria pulmonar esquerda (Figura 2A). Devido ao achado sugestivo de massa tumoral, foi realizada ressonância magnética para caracterizar melhor as partes moles. Demonstrou massa de cerca de 7,4 a 9,5cm localizada no mediastino anterior à esquerda, encapsulada, apresentando componente gorduroso e focos de calcificação sugestivos de teratoma, sem, no entanto, promover invasão das estruturas adjacentes (Figura 2B). Após exames ficaram como hipóteses diagnósticas timoma, teratoma e cisto pericárdico.



Foi realizada a toracotomia lateral esquerda no 5º espaço intercostal (Figura 3) e ressecção da massa mediastinal. Procedimento ocorreu sem intercorrências. O lactente foi encaminhado à UTI pediátrica com dreno de tórax e cateter venoso central. A análise anatomopatológica evidenciou massa tumoral de 185g envolta por segmento do timo, de dimensões 9,5x7,5x6,0cm (Figura 4). Estudo histopatológico mostrou ausência de malignidade. Apresentando timo permeado por neoplasia benigna constituída por diferentes tecidos, como nervoso, epitelial (tipo respiratório, intestinal e tireoidiano), conjuntivo (tipo cartilaginoso, ósseo, mieloide e adiposo) e áreas císticas desprovidas de revestimento (Figura 5 e 6). Com diagnóstico de teratoma maduro cístico benigno.













A criança recebeu alta 4 dias após a cirurgia de remoção do teratoma e foi acompanhada anualmente até os 13 anos e 11 meses de idade, não apresentando recidivas.


DISCUSSÃO

Os teratomas mediastinais são tumores com grande dificuldade diagnóstica, em decorrência de representarem apenas 4% dos tumores da população pediátrica e pelo fato de a maioria dos pacientes se apresentar assintomática3. Dentre os sintomáticos, o quadro clínico varia de acordo com os órgãos comprimidos pelo tumor.

Sob essa perspectiva, percebe-se por meio do caso clínico abordado que a suspeita diagnóstica de teratoma, diante da sintomatologia símile à infecção de vias aéreas, ocorre por exclusão ou diante da piora do quadro do paciente. Além disso, existem pacientes cujas imagens radiológicas sugerem outros diagnósticos, como tuberculose pulmonar5. Assim, embora teratomas mediastinais sejam raros, esse diagnóstico deve ser discutido e suspeitado diante de pacientes com sintomatologias inespecíficas cuja terapêutica clínica não resultou em melhora completa do paciente.

Nesse sentido, o tempo demandado entre o início da sintomatologia, quando presente, e o diagnóstico correto possibilita o crescimento do tumor e, possivelmente, a compressão de órgãos vitais. Nesse caso, os presentes na região mediastinal, como coração, pulmões e grandes vasos.

A excisão cirúrgica precoce permitiu maior sobrevida ao lactente, evitando complicações e prejuízos no desenvolvimento neuropsicomotor do paciente.


CONCLUSÃO

Evidencia-se, portanto, a importância de valorizar hipóteses diagnósticas de etiologias consideradas pouco prevalentes em nosso meio. Teratomas mediastinais são predominantemente tratados por profissionais da área cirúrgica, entretanto não devem ser conhecidos apenas por essa parcela de profissionais. Uma vez que sua sintomatologia diversa, provocada pelo componente compressivo da massa sobre os órgãos da caixa torácica, pode levar a erros diagnósticos que atrasam o tratamento adequado.

Além disso, reconhecer a possibilidade do diagnóstico de massa mediastinal como diferencial para infecções pulmonares em quadros atípicos, em que não há febre ou alterações laboratoriais típicas de quadros infecciosos, como leucocitose, ajudam a prevenir tratamentos desnecessários com antibioticoterapia, que aumentam a morbidade além de contribuir para surgimento de cepas bacterianas resistentes.

Há, dessa maneira, a necessidade de maior compreensão e estudo dessa classe de tumores pelos profissionais de saúde devido à importância de se diagnosticar corretamente o paciente. Por meio da história clínica e exames de imagem complementares a fim de evitar tratamentos errôneos e prejuízo ao paciente.


REFERÊNCIAS

1. Tovar JA. Tumores Mediastinais. In: Holcomb GW, Murphy JP, Ostlie DJ. Ashcraft – Cirurgia Pediátrica. 6. ed. São Paulo: GEN Guanabara Koogan; 2017.

2. Avelino MA, Berquó LSAP, Caixeta JA, Oliveira CG. Lesão congênita rara como causa atípica de estridor neonatal: relato de caso de teratoma congênito de orofaringe (epignathus) causando manifestação tardia de obstrução de via aérea. Resid Pediatr. 2021;11(2):1-4 DOI: https://doi.org/10.25060/residpediatr-2021.v11n2-130.

3. Brady LW, Yaeger TE. Encyclopedia of radiation oncology. Heidelberg: Springer; 2013.

4. Sereke S, Oriekot A, Nalikka O, Magala J, Bongomin F. Mature cystic teratoma of anterior mediastinum in a 4-month-old infant: a rare case report. Gen Thorac Cardiovasc Surg. 2021 Jun;69(6):1016-21.

5. Liu J, Tian B, Zeng Q, Chen C, Zhou C, Li H, et al. Mediastinal teratoma presenting with hemoptysis and pleuritis misdiagnosed as tuberculosis (empyema). BMC Pediatr. 2018 Dec 1;18(1):382.

6. Lukovic A, Arsenijevic M, Milisavljevic S, Stojkovic D, Mrvic S, Radovanovic D. Cystic Lesions of Anterior Mediastinum: Case Report. EABR. 2020 Jun 1;21(2):185-8.











1. Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Medicina - Uberaba - Minas Gerais - Brasil
2. Hospital de Clínicas da UFTM, Staff Pronto-Socorro Infantil - HC UFTM - Uberaba - Minas Gerais - Brasil
3. Hospital de Clínicas da UFTM, Staff UTI Neonatal e Pediátrica da UFTM - Uberaba - Minas Gerais - Brasil
4. Hospital de Clínicas da UFTM, Docente Responsável pela Disciplina de Cirurgia Pediátrica UFTM - Uberaba - Minas Gerais - Brasil

Endereço para correspondência:
Thiago Rezende Silveira
Universidade Federal do Triângulo Mineiro
Av. Frei Paulino, 30 - Nossa Sra. da Abadia
Uberaba - MG, 38025-180
E-mail: thiago_rs28@hotmail.com

Data de Submissão: 03/10/2023
Data de Aprovação: 16/04/2024