ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo Original - Ano 2018 - Volume 8 - Supl.1

Crise febril na Infância: Uma revisão dos principais conceitos

Febrile seizure in childhood: A review of the main concepts

RESUMO

Crise febril é definida como crise ocorrendo entre seis meses e cinco anos de idade associada à hipertermia, porém, sem evidências de infecção do Sistema Nervoso Central ou outra causa identificada. Crises febris simples são generalizadas e de curta duração. Crises febris complexas são prolongadas, isto é, com duração superior a 15 minutos e/ou focais, podendo recorrer nas próximas 24 horas. Estudos mostram que entre 2 e 5% das crianças podem apresentar ao menos uma crise febril até os 5 anos de idade. A evolução é benigna e a recorrência não cursa com déficit cognitivo, sendo poucos os casos que desenvolvem epilepsia. Fatores de risco para recorrência da crise febril são idade de início inferior a 18 meses, história familiar positiva, duração prolongada e intensidade da febre. Para epilepsia, os fatores de risco incluem atraso do desenvolvimento e crise febril complexa. O tratamento profilático pode ser intermitente com o uso de diazepínicos ou, então, contínuo com fenobarbital ou ácido valproico. Antipiréticos não são eficazes. Neste artigo serão revisados os principais conceitos a respeito das convulsões febris, seu diagnóstico e tratamento.

Palavras-chave: Estado Epiléptico, Convulsões Febris, Epilepsia, Prevenção de Doenças, Recidiva.

ABSTRACT

Febrile seizure is defined as a seizure that occurs between 6 months and 5 years of age, associated with fever, without signs of central nervous system infection or any other identified cause. Simple febrile seizures are generalized and have a short duration. Complex febrile seizures last longer than 15 minutes, are focal, and might recur within the first 24 hours. Between 2%-5% of children may present at least one febrile seizure up to 5 years of age. The outcome is benign, and there are no associations with cognitive impairment. A few cases may develop epilepsy. The risk factors for recurrence are age below 18 months, family history of febrile seizures, prolonged duration, and fever intensity. The risk factors for epilepsy development are developmental delay and complex febrile seizure. Prophylaxis may be intermittent with benzodiazepines or continuous with phenobarbital or valproic acid. Antipyretics are not effective. In the present article, we review the main concepts about febrile seizures, diagnosis, and treatment.

Keywords: Status Epilepticus, Seizures, Febrile, Epilepsy, Disease Prevention, Recurrence.


INTRODUÇÃO

Crise febril (CF) é toda crise associada à febre, desde que a criança não tenha infecção intracraniana ou outra desordem neurológica, distúrbios metabólicos definidos e antecedentes de convulsões afebris1-6. É a forma mais comum de crises convulsivas na infância, afetando em média de 2 a 5% das crianças, principalmente entre 6 e 60 meses de idade, com pico de ocorrência aos 18 meses7,8.

As crises febris (CFs) são classificadas em simples e complexas. Clinicamente, a apresentação inicial pode ser de estado de mal epiléptico febril (EMEF)1,3.

Crise febril simples (CFS) é aquela que se apresenta como uma crise tônico-clônica generalizada com duração inferior a 15 minutos, que há recorrência nas próximas 24 horas e a recuperação é espontânea e completa3,9.

Já a crise febril complexa (CFC) é definida por uma ou mais das seguintes características: crises focais; crises seguidas de alterações neurológicas pós-ictais, como a Paralisia de Todd; duração superior a 15 minutos; e, recorrência em menos de 24 horas3,9.

O estado de mal epiléptico febril (EMEF) é uma CF com duração acima de 30 minutos, podendo caracterizar-se por uma única crise prolongada, ou, então, crises subentrantes1, ou seja, crises recorrentes entre as quais não há recuperação completa do nível de consciência. Corresponde a 5% de todas as CFs e é a condição mais comum de estado de mal epiléptico na infância.

A grande maioria das CFs são simples, correspondendo a 70-75% de todos os casos, enquanto as complexas respondem por 9-35% do total.

Segundo Mukherjee, em 21% das crianças afetadas, a crise febril desenvolve-se uma hora após o início da febre, em 57% em um intervalo de 1 a 24 horas, e, em 22%, acima de 24 horas3. Dessa forma, tem-se que o período de maior risco para ocorrência da CF corresponde às primeiras 24 horas de doença febril.

Epidemiologia

Crise febril corresponde à forma mais comum de crises epilépticas na infância, afetando em média 2 a 5% de todas as crianças, principalmente entre 6 meses e 5 anos de idade2,4,7,8, com pico de ocorrência aos 18 meses3,9.

Sua incidência é variável e, de acordo com a literatura, é relativamente maior nos países asiáticos, como no Japão, onde se encontrou uma incidência de 7-8%, do que na Europa e EUA, com incidência entre 2 e 4%5.

Etiologia

A etiologia da CF é considerada multifatorial, associando fatores ambientais e genéticos, determinando suscetibilidade à ocorrência de CFs. O padrão de herança genética é variável, e em 25-40% dos casos há história familiar positiva10-12. Gêmeos monozigóticos parecem ter maior taxa de concordância se comparados a gêmeos dizigóticos, particularmente em relação às CFSs13.

Como exemplo de etiologia predominantemente genética, tem-se a Epilepsia Generalizada com Crises Febris Plus (GEFS+), a qual é considerada uma síndrome genética com um espectro de gravidade. Clinicamente, as crianças apresentam um histórico de crises febris, com frequência do tipo complexa, e que ocorrem além de 5 anos de idade, sendo a evolução para Epilepsia Generalizada ainda na infância ou, então, na idade adulta. Uma série de genes já foram relacionados à síndrome, como o SCN1A e o SCN1B14.

Avaliação Clínica e Diagnóstico

O diagnóstico de CF na emergência é de extrema importância, uma vez que diferentes etiologias podem estar envolvidas, desde meningites bacterianas com elevada morbimortalidade até mesmo quadros prevalentes e benignos como infecções virais de vias aéreas superiores. As crianças são algumas vezes submetidas a procedimentos invasivos como punção lombar ou tratadas indevidamente por diagnóstico equivocado.

O diagnóstico da crise febril é eminentemente clínico. Na maioria das vezes, trata-se de uma crise generalizada, isto é, com perda de consciência, podendo ter apresentação tônico-clônica, tônica ou atônica. Outras vezes são caracterizadas por olhar fixo, cianose e sinais focais, com ou sem comprometimento da consciência. Em geral, a recuperação é imediata. Caso a criança continue sonolenta, com exame neurológico anormal, deve-se atentar para uma doença de base com possível comprometimento neurológico.

A avaliação do estado geral e a identificação da causa da febre são de extrema relevância. A principal tarefa na investigação diagnóstica de uma criança com uma crise febril recente é determinar se a febre e/ou a crise são resultados de uma doença potencialmente prejudicial ou até mesmo fatal9. Qualquer doença febril, seja de etiologia viral ou bacteriana, pode provocar uma crise febril, principalmente infecções virais15, por serem mais prevalentes. Otite média aguda, infecção de vias aéreas superiores, síndrome gripal, pneumonia e infecção urinária são exemplos comuns de infecções que podem desencadear uma crise febril na população pediátrica5.

O EMEF pode apresentar-se como crises subentrantes ou como uma única e prolongada crise. No primeiro cenário, as crises são intercaladas por períodos de irresponsividade, isto é, sem completa recuperação do nível de consciência, o que pode dificultar o diagnóstico inicial. O médico deve estar atento para essa condição, uma vez que ela é uma emergência neurológica e requer tratamento imediato16.

Investigação diagnóstica

Aquele paciente que tenha apresentado uma CFS e que possui exames segmentar e neurológico sem anormalidades não necessita realizar exames complementares complexos, como estudos de neurofisiologia e neuroimagem. Dessa forma, as investigações a serem feitas em uma criança com crise e febre devem ser orientadas pela apresentação clínica e pela suspeita de infecção de base17.

Punção lombar

A Academia Americana de Pediatria recomenda que a punção lombar seja fortemente considerada em crianças abaixo de 12 meses que apresentem crise convulsiva com febre18. Em uma revisão atual, a punção está sendo considerada para crianças entre 12 e 18 meses, uma vez que os sinais clínicos de meningite não são confiáveis em crianças abaixo de 18 meses de idade19,20. Antibioticoterapia deve ser iniciada se houver contraindicação à punção lombar e hipótese diagnóstica de meningite17,20.

Entretanto, é extremamente incomum que crianças apresentem meningite na ausência de achados clínicos sugestivos, como petéquias, rigidez de nuca, alteração do nível de consciência e coma9. Em estudo realizado com uma população de 455 crianças admitidas com febre e crise, em 30% destes pacientes foi realizada cultura de líquor com um índice de positividade para bactérias patogênicas igual a zero9. Em outro estudo realizado com 839 crianças com CFC no serviço de emergência, a punção foi realizada em 260 crianças que apresentaram indicação no momento da avaliação, nas quais 5 (0,7%) mostraram culturas positivas, todas em menores de 12 meses de idade. Dentre os pacientes em que não foi realizada a punção lombar, nenhum apresentou quadro clínico de meningite bacteriana posteriormente21.

Desta maneira, a punção lombar deve ser considerada em crianças com menos de 18 meses de idade, uma primeira crise febril complexa, pós-ictal prolongado, história recente de antibioticoterapia e/ou estado geral comprometido.

Eletroencefalograma

Parâmetros práticos apresentados pela Academia Americana de Pediatria confirmam que não existem evidências que demonstrem que eletroencefalogramas (EEG) anormais após uma primeira crise febril sejam preditivos de risco de recorrência ou desenvolvimento subsequente de epilepsia, mesmo no subgrupo com crise febril complexa18,19.

O EEG realizado até 7 dias da crise pode mostrar sofrimento cerebral ou atividade epiléptica, porém, este achado não implica em maior risco de desenvolvimento de epilepsia. De uma forma geral, não há indicação de EEG nesses casos19. Sendo assim, a presença de anormalidades epileptiformes no EEG carece de valor preditivo e gera ansiedade desnecessária nos pais, podendo resultar em maior probabilidade de essas crianças receberem tratamento medicamentoso22.

Assim, as indicações de EEG em qualquer tipo de crise febril ficam restritas à suspeita de doença cerebral subjacente, presença de atraso de desenvolvimento neuropsicomotor e de déficit neurológico19.

Neuroimagem

Estudos de neuroimagem, como tomografia computadorizada ou ressonância magnética de crânio, não são rotineiramente indicados e devem ser considerados apenas em pacientes que apresentem anormalidades neurológicas focais, EMEF, sinais sugestivos de aumento da pressão intracraniana, possível trauma cranioencefálico ou suspeita de malformação estrutural18,19,23.

Tratamento

Na população pediátrica, a crise é uma situação que gera ansiedade e insegurança nos pais, em especial devido ao seu significado e implicações futuras. Assim, deve-se orientá-los quanto aos cuidados iniciais durante a crise, a evolução benigna do quadro e a possibilidade de tratamento profilático para reduzir o risco de recidivas.

Tratamento durante a crise febril

O tratamento da CFS consiste primariamente na manutenção das vias aéreas pérvias. A maioria das CFs tem duração limitada e não ultrapassa 5 minutos, portanto, nenhuma intervenção medicamentosa deve ser realizada nesse primeiro momento5,9,24. Caso ultrapasse 5 minutos, diazepam solução por via retal pode ser administrado pelos próprios pais, na dose de 0,5 mg/kg, podendo ser repetido, se necessário, após 5 minutos. Midazolam bucal (0,5 mg/kg) ou intranasal (0,2-0,5 mg/kg) são outras possíveis opções terapêuticas.

Se a crise persistir, a criança deve ser levada imediatamente ao hospital para aplicação de benzodiazepínicos, como o diazepam, por via intravenosa (IV) em baixas doses consecutivas, entre 0,2 a 0,4 mg/kg/dose. Os benzodiazepínicos são drogas seguras, mas, que podem, eventualmente, apresentar efeitos colaterais no SNC quando usados em altas doses ou rapidamente por via IV, como parada respiratória (presente em 6% dos pacientes com estado de mal epiléptico febril tratados via IV) ou efeitos colaterais menores, como sedação, ataxia, hipercinesia e agitação. Todavia, a administração das doses preconizadas e a via retal raramente culminam em efeitos colaterais.

Não cessada a crise, aplica-se fenitoína 15 - 20 mg/kg ou fenobarbital 15 - 20 mg/kg IV, ambos com administração lenta devido aos potenciais efeitos colaterais, como parada cardiorrespiratória.

A hospitalização deve ser considerada no caso de lactentes, estado de mal epiléptico febril, quadro de febre de etiologia indeterminada, incerteza do acompanhamento nas horas seguintes e para aquelas famílias muito ansiosas24.

Tratamento profilático com medicação antiepiléptica

A evolução da CF é benigna, assim, o tratamento profilático em longo prazo é indicado somente em situações específicas. O tratamento pode ser contínuo ou intermitente3,5,24.

O tratamento é indicado em situações específicas, casos em que há 2 ou mais fatores de risco para recorrência; como, crises que ultrapassam 15-20 minutos; na presença de 2 ou mais crises anteriores; crises com curto intervalo de tempo (2 crises em 12 horas, 3 ou mais crises em 6 meses, ou 4 ou mais crises em 1 ano)4. Nesses casos, a recorrência diminui em 1/3 com o tratamento25.

Tratamento contínuo

É indicado quando há história de 2 ou mais episódios de crise em 24 horas, crise prolongada (> 10 minutos). O tratamento contínuo é efetivo para a diminuição da recorrência, porém, não atua na prevenção da ocorrência de epilepsias19.

De forma geral, o tratamento contínuo é realizado com fenobarbital ou ácido valproico. O fenobarbital, em relação ao placebo, é eficaz, porém, associa-se a efeitos colaterais, por exemplo, distúrbios de sono, hiperatividade, irritabilidade e letargia3,5. O ácido valproico também é efetivo em uso contínuo3,5, mas os efeitos colaterais devem ser considerados ao ser utilizado em crianças menores de 2 anos9. A carbamazepina e a fenitoína não são efetivas para prevenir recorrência de CF3,5.

O tratamento contínuo em crianças abaixo de 2 anos pode ser feito com o uso de fenobarbital na dose de 3 a 5 mg/kg/dia, dividindo a dose diária em duas tomadas. A dose do valproato é de 15 a 60 mg/kg/dia, preferencialmente entre 20 e 40 mg/kg/dia3,5. O tratamento é mantido por um período mínimo de 12 meses, podendo estender-se até os 5 anos de idade. A retirada da medicação deverá ser lenta e gradual, realizada num período de 3 a 6 meses3,5.

Em relação à CFC, uma revisão sistemática de 2017 mostrou eficácia do uso do fenobarbital e ácido valproico, de forma contínua, na diminuição do risco de recidiva. Por outro lado, a carbamazepina aumentou esse risco19.

Tratamento intermitente

Consiste na administração de diazepam supositório ou por via oral na dose de 0,5 mg/kg/dose inicialmente e 0,2 mg/kg/dose de 12 em 12 horas durante o período febril. Outra opção é o clobazam por via oral na dose de 2,5 mg (para menores de 10 kg) e 5,0 mg (para maiores de 10 kg) de 12 em 12 horas26. Esses medicamentos devem ser dados à criança nos episódios de febre e nas próximas 48 a 72 horas de doença febril3,5,24,27. Ainda que o uso não seja contínuo, o tratamento profilático intermitente também está associado a efeitos colaterais como sonolência e letargia3,5.

Antipiréticos e controle de temperatura

Agentes antipiréticos podem ser utilizados para reduzir a temperatura, no entanto, não reduzem a recorrência de crises febris3,5,6,24,28. Além disso, os antitérmicos não apresentam eficácia na profilaxia de CFS6.

Nas CFCs, uma revisão sistemática concluiu que o uso intermitente de diazepam intraretal e clobazam via oral foi eficaz na profilaxia de recorrência de crises19.

Prognóstico

Risco de desenvolver epilepsia

O risco de evolução para epilepsia depois de uma CF é de 6 a 7%. Cerca de 13% dos pacientes com diagnóstico de epilepsia têm histórico de CF19.

Fatores de risco para o desenvolvimento de epilepsia incluem déficit neurológico prévio, CFC e história familiar de epilepsia1,7,9. O risco de desenvolver epilepsia está mais relacionado à predisposição genética do que à história de crise febril5.

Em um estudo britânico, após um episódio de crise febril simples o risco de desenvolver epilepsia foi de 1%, após crises múltiplas de 4%, após convulsões prolongadas de 6%, e, após convulsões focais, de 29%. O estudo Rochester demonstra a influência de crises febris complexas no desenvolvimento de epilepsia, sendo que, para crianças com uma crise complexa, o risco é de 6,8%, para duas crises é de 17 a 22%, e, para três, de 49%1. Vale ressaltar, no entanto, que o risco de epilepsia não difere entre o grupo tratado e o grupo não tratado nas CFCs19.

Diversos estudos tentam demonstrar a relação entre crise febril e epilepsia do lobo temporal associada à esclerose mesial temporal. A conclusão é de que essa associação é rara6. Essa correlação é reconhecida, porém, controversa1,29.

Recorrência

Aproximadamente 30 a 40% das crianças que apresentam uma crise febril fazem recorrência do quadro1,3,6. A probabilidade de uma criança que venha a apresentar uma crise febril de ter uma recorrência é de 32%, de ter duas é de 15% e de ter três é de 7%7. A recorrência é mais comum nos primeiros 6 a 12 meses após o primeiro episódio de crise febril9.

A evolução depende de predisposição genética, fatores ambientais e fatores de risco específicos, dentre os quais são relatados idade de início precoce, história familiar de Epilepsia, história familiar de crise febril, crise febril complexa no primeiro episódio e tempo curto entre o início do pico febril e a crise1,30. Estudos indicam que as chances de recorrência aumentam de 30% para 50% quando o primeiro episódio ocorre antes de a criança completar um ano de idade2,33.

Crianças não tratadas e sem fatores de risco apresentam baixo risco de desenvolver episódio recorrente (10%). Crianças não tratadas, com um ou dois fatores de risco apresentam taxa de recorrência de 25 a 50%, enquanto três ou mais fatores de risco presentes aumentam essa taxa para 50 a 100%. Crianças de alto risco para recorrência, tratadas com diazepam profilático, que apresentam um ou mais fatores de risco, são beneficiadas, com redução do risco de recorrência de 75 a 100% para 10 a 15%1,6. Crianças com risco moderado e com risco baixo de recorrência apresentam, respectivamente, resposta moderada e baixa ao tratamento profilático com diazepam6.

Déficit neurológico

Dano cerebral agudo não ocorre na CFS, apenas em raros casos de estado de mal epiléptico febril. O dano neurológico parece estar mais relacionado a uma doença cerebral de base que à crise em si1. CFS não causa dano estrutural ou aumento do risco de desenvolver déficit cognitivo1. Um estudo realizado pela National Collaborative Perinatal Project (NCPP) e outro estudo britânico relatam não haver evidência de que CF possa levar a prejuízo do desempenho acadêmico, inteligência ou comportamento1,32. Não há diferenças significativas quanto ao desenvolvimento cognitivo entre crianças tratadas com diazepam profilático e aquelas não tratadas1.


CONCLUSÕES

CFs são crises convulsivas precipitadas por febre, comuns em crianças entre 6 meses e 5 anos, que resultam normalmente de infecções sem envolvimento do SNC. Possuem um excelente prognóstico e evolução benigna. O maior risco para essas crianças é a recorrência.

Crises são usualmente manifestações de inúmeras condições patológicas e, para diferenciá-las, uma anamnese cuidadosa, exame físico e, eventualmente, exames laboratoriais devem ser realizados. A primeira conduta é avaliar e identificar o processo infeccioso subjacente. A punção lombar é indicada nos casos em que houver suspeita de comprometimento do SNC e lactentes com menos de 18 meses de idade sem foco infeccioso identificado. Não há necessidade de realizar eletroencefalograma. Exame de imagem é indicado na suspeita de lesão cerebral.

O uso de medicação profilática deve ser individualizado. As crises febris são muito prevalentes na população pediátrica e apresentam um caráter benigno, logo, deve-se considerar o risco versus benefício do tratamento, uma vez que essas medicações possuem potenciais efeitos colaterais.

Naquelas situações em que os pais apresentam-se muitos ansiosos, em associação a crises febris complexas ou recorrentes, o uso profilático de benzodiazepínicos de forma intermitente pode ser justificado. Embora antipiréticos possam melhorar o conforto da criança, eles não atuam na prevenção de crises subsequentes.

A medida mais importante é a orientação familiar, a partir da qual se consegue fazer o manejo adequado destas crianças sem que haja necessidade de um tratamento farmacológico, o qual pode causar mais riscos do que benefícios ao paciente.


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1. Pediatra - Residente, Curitiba, PR, Brasil
2. Médico Neuropediatra do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil
3. Professor Adjunto de Neuropediatria no Departamento de Pediatria da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil

Endereço para correspondência:
Mayara de Rezende Machado
Centro de Neurologia Pediátrica do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Rua Floriano Essenfelder, nº 81, Alto da Glória
Curitiba- Paraná. Brasil. CEP: 80060-270

Data de Submissão: 01/03/2018
Data de Aprovação: 02/08/2018