Resenha
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Ano 2020 -
Volume 10 -
Número
1
Atuação multiprofissional na disfagia pediátrica
Multiprofessional action in pediatric dysphagia
Vanessa Souza Gigoski Miranda1; Camila da Cunha Niedermeyer1; Micheli da Silva Tarnowski1; Karoline Flach1,2; Katherine Flach1; Lisiane De Rosa Barbosa3
RESUMO
O objetivo desse manuscrito é descrever a importância da atuação multiprofissional em casos pediátricos de disfagia orofaríngea, identificando aos profissionais de várias especialidades que, o envolvimento do paciente como um todo no seu processo de reabilitação, proporciona êxito. Além disso, a comunicação entre a equipe de atenção à saúde do paciente deve ser priorizada, a fim de oferecer qualidade no atendimento do paciente, trocas de experiências e aprofundamento de técnicas.
Palavras-chave:
Pediatria, Equipe de Assistência ao Paciente, Transtornos de Deglutição.
ABSTRACT
The purpose of this manuscript is to describe the importance of multiprofessional performance in pediatric cases of oropharyngeal dysphagia, identifying professionals of various specialties that the involvement of the patient as a whole in their rehabilitation process provides success. In addition, communication between the patients’ health care team should be prioritized in order to provide quality patient care, exchanges of experience and deepening of techniques.
Keywords:
Pediatrics, Patient Care Team, Deglutition Disorders.
A prevalência de distúrbios da alimentação na pediatria está de 25 a 45% em crianças com desenvolvimento típico e 33 a 80% em crianças com atrasos no desenvolvimento. Porém a incidência de disfagia pediátrica ainda é desconhecida. O que se sabe é que, a incidência de disfunções de deglutição na população pediátrica vem aumentando, devido as taxas crescentes de sobrevivência de crianças prematuras, com baixo peso ao nascer e crianças com históricos médicos complexos1.
A fonoaudiologia atua no diagnóstico e terapia das disfagias orofaríngeas, relacionando-se com outras profissões da saúde, a fim de garantir que os aspectos de deglutição e alimentação possam ocorrer de forma segura e eficiente. Também, o fonoaudiólogo não somente atua na assistência direta à criança com disfagia orofaríngea, como colabora para estabelecer os protocolos de avaliação e condutas da equipe multidisciplinar com esse paciente, orienta os cuidadores as formas, posições e técnicas para oferta de via oral de forma segura, e previne possíveis alterações2,3.
A disfagia em crianças pode resultar em risco de crescimento deficiente, desnutrição, deficiência de nutrientes e até mesmo atrasos no desenvolvimento4. É papel da nutricionista avaliar e fornecer diagnóstico nutricional do paciente, incluindo histórico nutricional, avaliação do crescimento, avaliação laboratorial, sinais clínicos nutricionais e ingestão alimentar, bem como garantir as necessidades nutricionais adequadas a partir da forma ou consistência mais segura para a alimentação do mesmo. A terapia nutricional na disfagia tem como objetivo de manter ou recuperar o estado nutricional e a hidratação do paciente com a dieta adaptada às suas necessidades5,6,7,8.
Diversos estudos relatam o impacto positivo da participação do farmacêutico clínico no cuidado ao paciente. O papel do farmacêutico clínico é maximizar a terapia medicamentosa e minimizar os riscos, promovendo o uso seguro e racional de medicamentos9.
O uso de muitos medicamentos, conhecido como polifarmácia, aumenta o risco de ocorrer eventos adversos. Logo é imprescindível que haja o monitoramento destes possíveis eventos, buscando reduzir problemas relacionados a medicamentos e, consequentemente, propiciando a melhora da qualidade de vida dos pacientes9,10. Dentre os principais parâmetros avaliados na prescrição estão a via de administração, frequência e dose dos medicamentos, compatibilidade, reconstituição e diluição de medicamentos endovenosos, interações medicamentosas (medicamento versus medicamento e medicamento versus alimento), alergias, monitoramento de reações adversas ao medicamento (RAM) e avaliação do uso de medicamentos via sonda, visando fornecer as orientações adequadas para a administração9.
A atuação da farmácia clínica nesses casos de disfagia pediátrica, auxilia na orientação aos demais profissionais sobre a terapia medicamentosa do paciente e seus efeitos colaterais, visto que alguns medicamentos podem causar xerostomia, sialorreia e sonolência, dificultando as terapias com o paciente disfágico, além do auxílio com a forma de ingerir a terapia medicamentosa, de acordo com as possibilidades de alimentação. A contribuição do farmacêutico junto à equipe multidisciplinar, além de aumentar a qualidade e segurança no atendimento, proporciona a racionalização de recursos, reduzindo custos com o tratamento. A atenção farmacêutica pode ainda auxiliar na adesão dos pacientes ao tratamento, fazendo-se essencial para o alcance dos objetivos e resultados terapêuticos9,10.
A fisioterapia nos casos de disfagia está relacionada principalmente com o funcionamento adequado do sistema respiratório, visando a manutenção ou recuperação da função pulmonar para garantir a permeabilidade das vias aéreas11. Cabe salientar a correlação existente entre a fraqueza muscular respiratória e as disfunções da deglutição, que podem aumentar o risco de aspiração traqueal e, consequentemente, a instalação das pneumonias aspirativas. Na ausência de força muscular respiratória, os volumes e capacidades pulmonares sofrem redução, o que afeta o sistema de proteção das vias aéreas durante a deglutição. Assim, pode-se destacar algumas intervenções possíveis dentro do tratamento fisioterapêutico, como a desobstrução das vias aéreas, o manejo de secreções e manutenção dos volumes pulmonares, o que colabora diretamente para os aspectos de coordenação entre respiração e deglutição nas crianças12.
A atuação da psicologia oferece apoio aos pacientes e aos familiares durante o processo de readaptação ou impossibilidade de alimentação, proporcionando espaço para acolhimento e trabalho com os sentimentos vivenciados nessa situação, além de auxiliar com estratégias para enfrentamento da nova condição de alimentação e no processo de reabilitação da mesma. De acordo com Torres13, a importância do psicólogo concentra-se na tarefa de atuar como um facilitador no processo dos pacientes, assim como de seus familiares, de adaptação e de mudança de papéis diante da condição de adoecimento. O adoecimento de uma criança atinge inevitavelmente todo o sistema familiar, podendo ocasionar o surgimento de diversos sentimentos, como angústia, apreensão e até mesmo o desenvolvimento de quadros psicopatológicos, como resultado das mudanças que são exigidas à criança e à família neste contexto, especialmente quando se faz necessária a hospitalização14,15. Tendo em vista este cenário, o acompanhamento psicológico poderá auxiliar na preparação da criança e da família acerca dos procedimentos e intervenções terapêuticas que se farão necessários, no sentido de provocar o levantamento de estratégias de enfrentamento16.
Permeando a atuação de todos os profissionais, o médico, além de ser o responsável por fazer a solicitação de intervenção da equipe multiprofissional, muitas vezes, é o profissional que inicialmente identifica os sinais e sintomas da criança disfágica. Para além disso, é o profissional que está sempre presente nas unidades de saúde, sendo responsáveis pela prescrição do paciente. Cabe ao médico também, identificar as condições clínicas iniciais para reintrodução de via oral, para início de acompanhamento fonoaudiológico.
Um estudo recente identificou que por mais que os profissionais de saúde referissem saber o que é a disfagia, esse conhecimento ainda é muito incipiente no que diz respeito aos cuidados com o paciente disfágico e sobre a administração por via oral de medicamentos17. Portanto, a atuação multiprofissional com esses pacientes proporciona integralizar o cuidado, e compartilhar os conhecimentos específicos de cada área, objetivando à reabilitação da criança disfágica.
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1. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Residência Multiprofissional Integrada em Saúde - Ênfase em Atenção em Terapia Intensiva - Porto Alegre - Rio Grande do Sul - Brasil
2. Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Hospital da Criança Santo Antônio - Porto Alegre - Rio Grande do Sul - Brasil
3. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Fonoaudiologia - Porto Alegre - Rio Grande do Sul - Brasil
Endereço para correspondência:
Vanessa Souza Gigoski Miranda
Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre
Rua Sarmento Leite, nº 245
Porto Alegre. Brasil. CEP: 90050-170
E-mail: vanessa_gigoski@hotmail.com
Data de Submissão: 26/11/2018
Data de Aprovação: 29/04/2019