ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo Original - Ano 2016 - Volume 6 - Número 1

Perfil clínico, laboratorial e histológico de lactentes com hepatite por citomegalovírus

Clinical, biochemical, and histological profile of infants with hepatitis cytomegalovirus
Perfil clínico, de laboratorio e histológico de infantes con hepatitis por citomegalovirus

RESUMO

OBJETIVO: A infecção por CMV pode se manifestar com hepatite ou ser assintomática, porém pode ser acompanhada de hepatoesplenomegalia, aumento das aminotransferases, colestase, acometimento multissistêmico, hipertensão portal e progressão para cirrose. Este estudo objetiva descrever o perfil clínico, laboratorial, histológico de recém-nascidos e lactentes diagnosticados com hepatite por citomegalovírus (CMV).
MÉTODOS: É um estudo descritivo de série de casos com crianças com hepatite por CMV. Houve revisão de prontuários de pacientes atendidos entre janeiro de 2008 e março de 2014, sendo incluídos pacientes com menos de 1 ano de vida e hepatite por CMV. O diagnóstico da infecção foi estabelecido por meio de sorológica antiCMV IgM ou do PCR urinário/sérico.
RESULTADOS: Onze pacientes com hepatite preencheram os critérios de inclusão. Oito apresentaram hepatomegalia e nove esplenomegalia. Todos manifestaram icterícia. O tratamento com ganciclovir por 42 dias ocorreu em oito pacientes com hepatite por CMV. Houve redução em 79,7% nos níveis de AST e em 72,4% de ALT. Bilirrubinas totais caíram em 89%, e em 91,3% houve queda da bilirrubina direta. Dois pacientes mantiveram hepatite crônica, sendo um encaminhado para transplante. O tamanho amostral, heterogeneidade da população e falta de grupo controle representam limitações.
CONCLUSÃO: O tratamento para CMV visa melhorar a hepatite e também o prognóstico hepático, ao impedir mecanismos lesivos que propiciem degeneração hepática, fibrose e cirrose. Apesar dos resultados animadores com o antiviral, é necessária a realização de estudos pareados, duplo cegos, com coletas laboratoriais seriadas e sistematizadas.

Palavras-chave: coqueluche, criança, infecções respiratórias, tosse.

ABSTRACT

OBJECTIVE: CMV infection can manifest with hepatitis and may be asymptomatic, but may be accompanied by hepatosplenomegaly, increased aminotransferases, cholestasis, multisystem involvement, portal hypertension and progression to cirrhosis. This study aims to describe the clinical profile, laboratory, histological newborns and infants diagnosed with hepatitis cytomegalovirus.
METHODS: This is a case series descriptive study of children with hepatitis CMV. There was a review of medical records of patients treated between January 2008 and March 2014 and included patients younger than 1 year old and hepatitis CMV. The diagnosis of infection was established by serological anti-CMV IgM or through the urinary/serum PCR.
RESULTS: Eleven patients with hepatitis met the inclusion criteria. Eight had hepatomegaly and splenomegaly nine. All expressed jaundice. Treatment with ganciclovir for 42 days occurred in eight patients with CMV hepatitis. Decreased by 79.7% in the levels of AST and ALT of 72.4%. Total bilirubin fell by 89%, and in 91.3% there was a reduction of direct bilirubin. Two patients remained chronic hepatitis, being sent for transplantation. The sample size, heterogeneity of the population and lack of control group represent limitations.
CONCLUSION: The treatment for CMV aims to improve hepatitis as well as liver prognosis by preventing harmful mechanisms that promote liver degeneration, fibrosis and cirrhosis. Despite encouraging results with antiviral, conducting paired studies is necessary, double-blind, with serial and systematic laboratory collections.

Keywords: child, cough, respiratory infections, whooping cough.

RESUMEN

OBJETIVO: La infección por CMV puede manifestarse con hepatitis y puede ser asintomática, sin embargo puede ser acompañada de hepatoesplenomegalía, aumento de las aminotransferasas, colestasis, acometimiento multisistémico, hipertensión portal y progresión para cirrosis. Este estudio objetiva describir el perfil clínico, de laboratorio, histológico de recién nascidos e infantes diagnosticados con hepatitis por citomegalovirus.
MÉTODOS: Es un estudio descriptivo de serie de casos con niños con hepatitis por CMV. Hubo revisión de prontuarios de pacientes atendidos entre enero de 2008 y marzo de 2014, siendo incluidos pacientes con menos de 1 año de vida y hepatitis por CMV. El diagnóstico de la infección fue establecido a través de serológica anti CMV IgM o a través del PCR urinario/sérico.
RESULTADOS: Once pacientes con hepatitis llenaron los criterios de inclusión. Ocho presentaron hepatomegalia y nueve esplenomegalias. Todos manifestaron ictericia. El tratamiento con ganciclovir por 42 días ocurrió en ocho pacientes con hepatitis por CMV. Hubo reducción en el 79,7% en los niveles de AST y en el 72,4% de ALT. Bilirrubinas totales cayeron en el 89%, y en el 91,3% hubo caída de la bilirrubina directa. Dos pacientes mantuvieron hepatitis crónica, siendo un enviado para trasplante. El tamaño de la muestra, heterogeneidad de la populación y falta de grupo control representan limitaciones.
CONCLUSIÓN: El tratamiento para CMV tiene como objetivo mejorar la hepatitis y también el pronóstico hepático, al impedir mecanismos lesivos que proporcionen degeneración hepática, fibrosis y cirrosis. A pesar de los resultados animadores con el antiviral, es necesaria la realización de estudios pareados, doble ciegos, con coletas de laboratorio seriadas y sistematizadas.

Palabras-clave: hepatitis, citomegalovirus, ganciclovir, infante.


INTRODUÇÃO

O citomegalovírus (CMV) representa importante causa de morbidade e mortalidade perinatal tanto pela aquisição intraútero (determinando más formações congênitas) quanto por meio do canal do parto, leite materno ou hemotransfusão, e por contato pessoa a pessoa devido a mãos mal lavadas ou por fômites contaminados. Geralmente, as consequências decorrentes dessa infecção acometem mais aqueles que são prematuros, de baixo peso ao nascer ou pacientes imunossuprimidos.

As crianças maiores e imunocompetentes, quando infectadas, costumam ser assintomáticas ou apresentarem quadros leves e autolimitados.

A maior parte dos recém-nascidos com infecção por CMV é assintomática e isso se deve, hipoteticamente, à reativação viral que ocorre na mãe, de modo que a criança nasce com anticorpos protetores. Por outro lado, os prematuros têm menos anticorpos e, portanto, costumam ter mais sintomas.

A infecção por CMV pode se manifestar mais frequentemente como pneumonite, enterite e hepatite, além de linfoadenopatia, envolvimento auditivo ou meningite asséptica. O envolvimento hepático pode determinar um quadro assintomático, mas pode também ser acompanhado de hepatoesplenomegalia, icterícia, aumento das aminotransferases e até colestase. Alguns desses casos podem evoluir com gravidade, acometimento multissistêmico, hipertensão portal e progressão para cirrose1-3.

O tratamento com ganciclovir tem indicação clássica naqueles pacientes que apresentam quadro de CMV dentro primeiro mês de vida e acometimento do sistema nervoso central. Para aqueles que o sistema nervoso central é poupado, pode-se considerar terapêutica para CMV quando determina pneumonite, trombocitopenia ou hepatite. O esquema recomendado tem duração de seis semanas, com impacto sabidamente efetivo na redução de perda auditiva e no adequado desenvolvimento neuropsicomotor. No caso da hepatite por CMV, o tratamento com ganciclovir no período neonatal e em lactentes imunocompetentes é controverso, pois se trata de uma medicação de uso venoso e com efeitos colaterais4,5.

Assim, baseado nessa lacuna da literatura, este estudo tem o objetivo de descrever o perfil clínico, laboratorial, histológico dos pacientes recém-nascidos e lactentes no primeiro ano de vida que foram diagnosticados com hepatite sintomática por citomegalovírus.


MÉTODOS

Estudo descritivo e retrospectivo de série de casos, realizado num hospital terciário em neonatos e lactentes com menos de 1 ano de idade portadores de hepatite por CMV, no período de janeiro de 2008 a março de 2014.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa.

Foram incluídos no estudo os lactentes com menos de 1 ano de idade com hepatite por CMV, internados ou acompanhados no ambulatório de hepatologia infantil. O diagnóstico da infecção foi estabelecido por meio de viragem sorológica da genitora durante a gravidez e/ou presença de anticorpo antiCMV IgM positivo no recém-nascido/lactente ou por intermédio de positividade do PCR urinário/sérico para CMV no recém-nascido/lactente. Foram excluídos os pacientes com outras doenças infecciosas congênitas, que causam hepatite: rubéola, hepatites B e C, herpes, varicela, sífilis, toxoplasmose, HIV, além daqueles com diagnóstico de fibrose cística, más formações biliares e doenças metabólicas causadoras de hepatite e colestase.

Os dados colhidos dos prontuários foram anotados em um questionário previamente elaborado. Avaliaram-se itens demográficos, além de principais sinais e sintomas, resultados de exames séricos como perfil e função hepáticos, hemograma, função renal, imagem radiológica e histológica, início do tratamento, dias de uso do ganciclovir e o relato de efeitos colaterais, comorbidades (doenças metabólicas, genéticas, síndromes de hipoplasia de vias biliares, atresia de vias biliares extra-hepáticas, endocrinopatias e se houve tratamento cirúrgico com derivação biliodigestiva ou transplante hepático).

Todos os dados foram armazenados e analisados em um banco de dados do programa Microsoft Excel.


RESULTADOS

Foi obtida pela revisão de registros da unidade uma lista com 85 pacientes, sendo investigados os prontuários a fim de se avaliar a causa da hepatite e colestase. Desses, apenas 11 preencheram os critérios de inclusão. A Tabela 1 mostra os principais achados encontrados entre os pacientes estudados. Os dados revelaram que a maioria desses pacientes nasceu a termo, sete dos 11 investigados, com média total de 36,3 semanas de gestação. A média de peso ao nascer foi de 2579 gramas, sendo o menor peso encontrado em um prematuro de 31 semanas, nascido com 1460 gramas. Apenas um nasceu com peso adequado para idade e nove crianças nasceram com peso abaixo de 3 quilos.




Em relação aos antecedentes neonatais, como intercorrências, além da hepatite, observou-se anemia em cinco pacientes, três com plaquetopenia e dois com insuficiência respiratória. Oito desses pacientes se apresentaram à unidade por referência ambulatorial e três por transferência entre hospitais.

Sobre os antecedentes obstétricos, três genitoras não realizaram pelo menos seis consultas de pré-natal. Apenas uma genitora referiu intercorrência na gravidez - infecção urinária.

Em relação aos sintomas nos lactentes, houve dispneia em três e ganho ponderal insuficiente em três pacientes. A idade de início da dispneia foi de 30 dias de vida e a sua duração ocorreu em média por 21 dias. A descrição de ganho ponderal insuficiente foi descrita em média na idade de 11 dias e durou 83 dias.

Todos os pacientes apresentaram icterícia e cinco apresentaram acolia e colúria. Dez apresentaram hepatomegalia ao exame físico e nove, esplenomegalia. Apenas um que manifestou insuficiência respiratória, sob suspeita de pneumonite, apresentou ausculta pulmonar alterada. Um teve choque hemodinâmico, provavelmente séptico, antes do diagnóstico de infecção por CMV. Outros dois tiveram alterações neurocognitivas manifestadas no período com atraso motor e irritabilidade e apenas um teve microcefalia detectada ao exame físico. A Tabela 2 mostra as principais médias de idade de início e duração dos principais sinais.




O diagnóstico de infecção pelo CMV foi firmado nesses casos em nove situações por PCR urinário para CMV e em duas oportunidades por sorologia. A média de idade dos pacientes quando firmado o diagnóstico foi de 97 dias (27-167 dias), sendo o diagnóstico mais precoce dado no nono dia de vida por sorologia no recém-nascido.

Nove pacientes foram submetidos ao exame de ultrassonografia de abdome total. Os exames de ultrassonografia realizados detectaram hepatoesplenomegalia em três, apenas hepatomegalia em três lactentes e apenas esplenomegalia em um. O exame foi normal em dois indivíduos. Um paciente foi submetido à colangiografia operatória, que mostrou patência de vias biliares. A análise histológica foi efetuada em nove dos 11 indivíduos. A Tabela 3 mostra as alterações encontradas.




Em relação à avaliação multidisciplinar, todos fizeram avaliação oftalmológica com fundoscopia e lâmpada de fenda, sendo encontrada alteração em apenas um caso, com palidez de mácula. A avaliação da audição neurossensorial foi executada em apenas um paciente, sendo alterada. A Tabela 4 demonstra os valores em média e desvio padrão daqueles que foram tratados e apresentavam exames pré e pós-tratamento.




Dos indivíduos diagnosticados, apenas oito foram tratados com o antiviral específico, ganciclovir. A média de início do tratamento foi de 90 dias de idade e com duração por 42 dias, todos com dose de 12 mg/kg/dia. Quatro apresentaram efeitos colaterais, sem necessidade interrupção ou mudança da posologia. Três apresentaram anemia, um leucopenia leve e um teve complicação com acesso venoso periférico. Os três com anemia receberam concentrado de hemácias durante a terapia com ganciclovir.

Dos 11 pacientes, sete ainda estão sob acompanhamento no ambulatório de hepatologia infantil, seis melhoraram as provas hepáticas e, desses, dois receberam alta ambulatorial aos dois anos e meio de idade. Dois descontinuaram acompanhamento, com perda do contato. Dois pacientes não receberam tratamento com ganciclovir e mantiveram hepatite crônica, sendo um encaminhado para transplante devido à colestase intensa. Não houve mortes detectadas entre os casos.


DISCUSSÃO

O citomegalovírus causa a infecção congênita mais comum do mundo. Mulheres grávidas e pacientes prematuros ou imunossupressos são os mais susceptíveis5. Na gravidez, o risco envolvido é com a infecção do concepto. Naquelas soronegativas que se infectam na gestação, o risco de transmissão fetal está entre 30 a 40% e as crianças infectadas em útero, nessa circunstância, apresentam risco maior para o desenvolvimento de infecção grave. As mães portadoras de IgG positivo para CMV podem reativar a infecção em 10-30% com transmissão ao feto em torno 1-3%, com maiores chances de infecção assintomática5. Essa informação não pode ser extraída neste estudo, pois apesar da maioria das mães terem realizado consultas de pré-natal, com mais de seis avaliações como recomenda o Ministério da Saúde, a qualidade desse acompanhamento fica aquém do ideal, prejudicando a triagem e o diagnóstico precoce de algumas infecções na gestação, como a infecção pelo CMV.

Os recém-nascidos quando infectados, geralmente são assintomáticos e podem ser identificados por técnicas laboratoriais6. Como descrito previamente, a doença é mais evidente naqueles prematuros e de baixo peso ao nascer, corroborado neste estudo, que comprovou uma média de idade gestacional abaixo de 37 semanas e peso abaixo do ideal.

As manifestações da infecção por CMV são muito amplas, e podem provocar a tríade neonatal clássica de sintomas composta por ictérica em 62-67% dos casos5, petéquias (58%) e hepatoesplenomegalia (50%). Provavelmente devido à seleção dos pacientes deste estudo, o perfil com hepatite foi identificado em todos os casos com colestase, hepatomegalia clínica em 90% e esplenomegalia em 81%, superando as taxas encontradas por Swanson & Schleiss5, que constataram hepatoesplenomegalia em 60% dos casos, hiperbilirrubinemia conjugada em 81% e icterícia clínica em 67% em casos de infecção congênita por CMV.

As principais alterações histológicas encontradas podem não ser patognomônicas da infecção por CMV, mas refletem a lesão hepática, tais como a infiltração de células mononucleares, esteatose leve, fibrose perissinusoidal, hiperplasia de células de Kuppfer e até mais específicas, como reação granulomatosa, inclusões citomegálicas em células ductais e quadros de colestase3. Outras alterações têm sido descritas, como transformação em célula gigante, colestase, foco hematopoiético extracelular, pobreza de ductos biliares a padrão obstrutivo biliar, fibrose e cirrose.

Essa falta de especificidade tem exigido métodos mais confiáveis de diagnóstico como cultivo viral no tecido hepático, imunohistoquímica e PCR sérico. Desses, o PCR vem se mostrando excelente método, inclusive superando a imunohistoquímica, pois esta se apresenta falsamente negativa com frequência em casos de hepatite em lactentes devido à pesquisa mais "tardia", geralmente após os três meses de vida7. Goedhals et al.7 constataram a superioridade da sorologia ELISA IgM sobre a imunohistoquímica nessa circunstância.

Assim, apesar da grande importância na avaliação clínica e como parâmetro para acompanhamento do paciente com doença hepática, a biópsia não apresenta grande especificidade para o diagnóstico de hepatite por CMV, nem quando se usa a imunohistoquímica, sendo reservada como padrão ouro a técnica de PCR. A sorologia (IgM) teve grande importância neste estudo no diagnóstico, pois a média de idade do diagnóstico ficou em 97 dias, semelhante à observada na literatura, com maior sensibilidade que a imunohistoquímica. Mas ainda assim, a histologia mantém grande importância para avaliar o dano hepático, sua extensão e gravidade.

Os níveis de aminotransferases encontrados se assemelham àqueles encontrados na literatura, chegando em média a três vezes o valor de referência. Essa elevação costuma persistir por aproximadamente seis semanas e pode regredir espontaneamente1,8,9. No entanto, muitos especialistas defendem que, em neonatos, há evidência de melhor prognóstico hepático e neurológico para aqueles que receberam terapia antiviral, bem como para aqueles que apresentam menor carga viral10.

Ozkan et al.3 mostraram que há redução significativa dos níveis de aminotransferases, fosfatase alcalina, gamaglutamiltransferase e bilirrubinas em três meses do tratamento quando se trata os recém-nascidos com ganciclovir em comparação com aqueles que não receberam o tratamento. Esse estudo também constatou que há redução da carga viral mais acentuada naqueles tratados com ganciclovir, apesar de não haver significância estatística pela pequena amostra estudada.

A mesma recomendação não é feita de modo sistemático para crianças maiores e imunocompetentes com hepatite por CMV. Alguns relatos demonstram que aqueles com hepatite aguda grave ou com progressão para doença crônica hepática podem ser pacientes cujo tratamento está indicado2,8,11.

Tezer et al.2 mostraram benefício do tratamento (21 dias) para hepatite em lactentes com idade entre dois e quatro meses com resposta da hepatite aguda. Essas evidências revelaram o impacto do tratamento da hepatite aguda, mas não fornecem ainda substrato para seu efeito em longo prazo, mesmo sabendo-se da hipótese sobre o desenvolvimento de doença crônica hepática, quando a viremia se mantém apesar do tratamento.

Avila-Agüero et al.9 investigaram pacientes com sinais de infecção por CMV (mal-estar, febre, elevação de enzimas hepáticas, linfocitose) e imunidade competente. A efetividade total do ganciclovir foi de 80% ao término do tratamento. Entre os não tratados, 19/54 (35%), sete tiveram antigenemia negativa em duas semanas, sendo que estes pacientes apresentavam antigenemia baixa no início do tratamento.

Vancíková et al.11 estudaram o tratamento com ganciclovir por 15 dias em poucos lactentes que tiveram hepatite por CMV com curso mais agressivo, diagnosticados em média com nove semanas de vida. Observaram melhora na vigência da terapia antiviral, embora tenha havido aumento das aminotransferases e da carga viral posteriormente, criando hipótese de um gatilho imune associado à replicação viral e também à possibilidade de efetuar tratamento mais prolongado que 15 dias.

Mesmo a média de idade no início do tratamento estando fora do período neonatal, bem como não havendo gravidade intensa no envolvimento hepático, o tratamento demonstra indícios de ser uma medida positiva para condução da hepatite em lactentes. Este estudo corrobora essa assertiva, pois constatou redução nos níveis de aminotransferases e bilirrubinas, superando 70% antes, versus pós-tratamento, bem como presença de poucos efeitos colaterais. Nenhum dos pacientes tratados que seguiram com acompanhamento desenvolveu quadro crônico de hepatopatia. Os dois indivíduos que desenvolveram cronicidade, com hepatite crônica, colestase e cirrose, não receberam tratamento específico para CMV. Estes fatos podem demonstrar a utilidade do tratamento em longo prazo. Entre os tratados, a maioria revelou melhora clínico-laboratorial com acompanhamento até dois anos e meio de idade.

Existem alguns limites neste trabalho, pois se trata de um estudo descritivo que observa critérios não estabelecidos previamente e, portanto, dificulta sua análise. O tamanho amostral e a heterogeneidade da população, quanto à idade e formas de diagnóstico (sorologias e PCR) dificultam a análise linear dos fatos, tal como a demora no diagnóstico, muitas vezes confundindo o momento correto da infecção (pré-natal, canal de parto ou pós-natal).

Além disso, o tratamento e o acompanhamento não se iniciaram ao mesmo tempo para todos os pacientes, sendo muitas vezes tardio, acima do primeiro mês de vida, época considerada na literatura ideal para o tratamento da hepatite por CMV.

A falta de grupo controle pareado ao grupo tratamento limita a avaliação da resposta sobre a queda das aminotransferases, melhora da função hepática ou impedimento de progressão para doença crônica. Há necessidade de mais estudos com maior número de pacientes. Por outro lado, há poucos estudos na literatura sobre o tema, sendo importante esta intervenção terapêutica como tentativa de mudar o prognóstico dos pacientes.

O tratamento para CMV não visa puramente melhora aguda da hepatite, mas também melhorar o prognóstico hepático e impedir que se desenvolvam mecanismos lesivos que propiciem degeneração hepática, colestase e cirrose. Portanto, se faz necessária a realização de estudos pareados, duplo cegos, com coletas laboratoriais seriadas e sistematizadas, além de acompanhamento regular e por longo período para entender melhor o impacto do tratamento da hepatite por CMV, principalmente entre os lactentes imunocompetentes.

É válido destacar que o CMV muitas vezes é negligenciado e esquecido por obstetras e pediatras e que pode determinar alterações graves neurossensoriais e hepáticas. Assim, o pré-natal bem conduzido, o diagnóstico precoce e as intervenções terapêuticas imediatas poderão determinar melhor prognóstico e melhor qualidade de vida para os pacientes infectados precocemente na vida.

Não foram encontradas alterações específicas do CMV, tais como inclusão citomegálica e não foi realizado estudo de imunohistoquímica para este vírus nos espécimes retirados.

Média de exames laboratoriais antes e após o tratamento de 7 pacientes portadores de hepatite por CMV que receberam tratamento com ganciclovir.


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1. Pós-graduação latu sensu - Médico residente, Vitória da Conquista, BA, Brasil
2. Professora Titular de Pediatria da Universidade Federal da Bahia. - Chefe do Serviço de Gastroenterologia e Hepatologia Pediátricas do Complexo Hospitalar Universitário Professor Edgard Santos HUPES-CPPHO da UFBA, Vitória da Conquista, BA, Brasil
3. Professora Assistente de Pediatria. - Supervisora da Residência de Gastroenterologia e Hepatologia Pediátricas do Complexo Hospitalar Universitário Professor Edgard Santos HUPES-CPPHO da UFBA, Vitória da Conquista, BA, Brasil
4. Pós-graduação Latu sensu - Residente em Endoscopia Digestiva Hospital Geral Roberto Santos, Vitória da Conquista, BA, Brasil

Endereço para correspondência:
Mateus Teixeira do Amaral Rocha
Avenida Jesiel Norberto, nº 1220, Ap 404, Bairro Candeias
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