ISSN-Online: 2236-6814

https://doi.org/10.25060/residpediatr



Artigo Original - Ano 2019 - Volume 9 - Número 2

Crescimento de prematuros nos primeiros dois anos

Growth of preterm infants during the first two years of life

RESUMO

OBJETIVO: Analisar o crescimento de crianças prematuras acompanhadas em serviço de referência secundária em seus dois primeiros anos.
MÉTODOS: Estudo transversal de dados de prematuros com menos de 37 semanas gestacionais de setembro de 2010 a dezembro de 2015. Monitorizou-se o crescimento pós-natal ao longo dos dois primeiros anos de idade gestacional corrigida (IGC) pelas curvas Fenton 2013 até a IGC de 50 semanas, e da World Health Organization (WHO) 2006 a partir deste marco. Construiu-se uma linha de tendência utilizando-se uma função polinomial de terceiro grau para permitir melhor visualização das medidas antropométricas de acordo com a IGC.
RESULTADOS: Foram incluídos 183 prematuros. As medidas antropométricas de peso, estatura e índice de massa corporal (IMC) demostraram predomínio de adequação em todo o período analisado, com tendência a aumento das taxas de adequação ao final do período de observação. O peso e o IMC elevados para a idade tenderam a aumento, com destaque ao IMC elevado entre os pequenos para a idade gestacional, enquanto houve redução das taxas de baixa estatura para a idade.
CONCLUSÕES: Os parâmetros de crescimento dos prematuros tendem à adequação ao longo dos primeiros dois anos de IGC, sendo o crescimento mais intenso nos primeiros seis meses. O IMC elevado para a idade sinaliza a necessária continuidade de seguimento e, principalmente entre os pequenos para a idade gestacional, a compreensão do diferenciado ritmo de crescimento e acompanhamento. A monitorização do crescimento dos prematuros com intervenções adequadas pode minimizar a evolução futura de doenças crônicas não transmissíveis.

Palavras-chave: Prematuro, lactente, crescimento e desenvolvimento, índice de massa corporal.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To analyze the growth of premature children followed in a secondary referral service in their first two years.
METHODS: A cross-sectional study of preterm data less than 37 gestational weeks from September 2010 to December 2015. Postnatal growth was monitored throughout the first two years of corrected gestational age (CGI) using the Fenton 2013 curves up to the IGC of 50 weeks, and the 2006 World Health Organization (WHO) from this milestone. It built up a trend line by using a third-degree polynomial function to allow better visualization of anthropometric measurements according to the CGI.
RESULTS: 183 premature infants were included. The anthropometric measures of weight, height and body mass index (BMI) showed a predominance of adequacy throughout the analyzed period, with a tendency to increase the adequacy rates at the end of the observation period. High weight and BMI for age tended to increase, with a high BMI among the small for gestational age, while there was reduction in the rates of short stature for the age.
CONCLUSIONS: The growth parameters of premature infants tend to be adequate during the first two years of CGI, with the most intense growth in the first six months. High BMI for age at the end of the second year signals the need for longer follow-up time and, especially among the small for gestational age, the understanding of their different rhythm of growth and follow-up. The monitoring of preterm birth and appropriate interventions may minimize the future development of chronic non-communicable diseases.

Keywords: infant, premature; infant; growth and development; body mass index.


INTRODUÇÃO

Parece haver relação entre o potencial de desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis em um indivíduo ao longo de sua vida e as condições apresentadas por ele no período fetal ou nas fases iniciais da vida extrauterina. As doenças crônicas não transmissíveis, exemplificadas pelas doenças coronarianas, hipertensão arterial, doença metabólica e doença renal crônica, estão associadas à prematuridade, o baixo peso ao nascer, o nascimento PIG (pequenos para a idade gestacional) e a restrição do crescimento intrauterino ou extrauterino1-3.

Entre prematuros, se por um lado os maiores ganhos de peso se associam a melhores resultados do desenvolvimento neurológico, por outro, o maior ganho de peso em relação à estatura, além de não conferir benefícios adicionais, associa-se à obesidade e ao risco cardiovascular futuro, fato que pode ser minimizado com a adequação nutricional nos primeiros anos de vida4-6.

Assim, faz-se necessária a monitorização do crescimento das crianças prematuras no intuito de minimizar a evolução futura de doenças crônicas não transmissíveis, fato que é um desafio para a equipe de saúde. Com base nessas premissas, o presente estudo teve como objetivo analisar o crescimento de crianças prematuras acompanhadas em serviço de referência secundária em seus dois primeiros anos.


MÉTODOS

Trata-se de estudo transversal a partir de dados obtidos de prontuários dos prematuros acompanhados no Centro Estadual de Atenção Especializada (CEAE), em Viçosa-MG, cadastrados de setembro de 2010 até dezembro de 2015. O fato de os prontuários de atendimento do CEAE serem semiestruturados possibilitou a obtenção de dados de forma confiável para o presente estudo.

Características da população e local do estudo

O Hospital São Sebastião (HSS), onde ocorrem todos os nascimentos de Viçosa e região de saúde, é referência para gestação de alto risco desde 2009, possui banco de leite humano desde 2005 e unidade de terapia intensiva neonatal desde 2004.

O CEAE é o único serviço de referência para atendimento a prematuros de Viçosa e região de saúde, atendendo 20 municípios de pequeno porte e uma população de cerca de 227.203 pessoas. O número anual de nascidos vivos no município de Viçosa variou no período entre 632 e 959 e as taxas anuais de prematuridade variaram entre 8,8 e 9,9%.

O seguimento da atenção à saúde dos prematuros é realizado pela equipe multiprofissional - composta por profissionais das áreas de Pediatria, Enfermagem, Nutrição, Psicologia, Fisioterapia e Assistência Social - e tem convênio com a Universidade Federal de Viçosa (UFV). No momento da alta hospitalar do HSS, todos os prematuros são encaminhados ao CEAE para acompanhamento do crescimento e desenvolvimento. O CEAE foi inaugurado em setembro de 2010 e totalizou 190 prematuros acompanhados até dezembro de 2015, cujo ingresso anual variou de 18 (período próximo à inauguração) a 66 pacientes.

Critérios de inclusão e exclusão

Foram critérios de inclusão para a pesquisa: ter nascido prematuro no HSS, ou seja, com idade gestacional (IG) inferior a 37 semanas, independentemente do peso de nascimento, e manter acompanhamento no CEAE. Foram critérios de exclusão: prontuários não encontrados, malformações graves e doenças que sabidamente comprometem a alimentação e o crescimento.

Variáveis do estudo

Prematuro: todo recém-nascido com IG inferior a 37 semanas. Idade cronológica (ICR): definida como a idade pós-natal. IG corrigida para a prematuridade (IGC): diferença entre a idade gestacional ao nascimento e tempo de duração médio de uma gestação a termo (40 semanas)7,8.

Variáveis sociodemográficas: idade materna e paterna, escolaridade materna e paterna (até o ensino fundamental e a partir deste) e renda familiar em salários mínimos (SM; < 2 SM e ≥ 2 SM)9. Variáveis do período pré-natal e perinatal: tipo de parto, sexo, internação na unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN), IG (em semanas e categorizada em < 32 semanas ou ≥32 semanas), peso ao nascer (PN; em gramas e categorizado em < 1500g e ≥ 1500g). A adequação do PN para a IG baseou-se nas curvas Fenton e foi categorizada em pequeno para a IG (PIG; valores < percentil 10) e não PIG (valores acima do percentil 10)7,10.

A alimentação na primeira consulta foi categorizada em aleitamento materno (AM; considerando aleitamento materno exclusivo ou complementado) e alimentação artificial (AA)11. Registrou-se a duração total do AM, considerando a IGC em meses. O termo "leite de vaca" se referiu ao leite de vaca in natura e não à fórmula infantil.

Obtiveram-se os registros de peso (gramas), estatura (cm) e índice de massa corporal (IMC) para os dois primeiros anos de IGC. As medidas antropométricas são realizadas pelos pediatras ou nutricionistas durante as consultas, usando balança digital e antropômetro, e registradas no prontuário. Para monitorar o crescimento pós-natal, até o prematuro atingir 50 semanas de IGC, são utilizadas as curvas de Fenton12. Após este marco, são preconizadas as curvas da World Health Organization (WHO), em escores-Z, utilizando-se a IGC7.

Documentou-se a ocorrência de problemas respiratórios e de internação hospitalar durante o período de acompanhamento ambulatorial. As coletas de amostras de sangue seguem a rotina de acompanhamento ambulatorial do serviço. Caracterizou-se anemia quando o valor de Hb foi inferior a 11,0g/dL, a partir dos seis meses de ICR, evitando-se, assim, interferências da anemia da prematuridade8.

Análise estatística

Para análise descritiva, as variáveis quantitativas do estudo foram apresentadas em média, desvio-padrão, mediana, e percentis 25 e 75. Já as variáveis qualitativas foram descritas em valores absolutos e percentuais. Verificou-se a normalidade da distribuição de variáveis quantitativas pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. Aquelas que apresentaram distribuição paramétrica foram apresentadas em média e desvio-padrão, enquanto as que apresentaram distribuição não paramétrica foram apresentadas em medianas e percentis. As frequências referiram-se ao total de respostas válidas, não sendo considerados os dados ausentes.

Para análise do crescimento, foram avaliados os dois primeiros anos de IGC. Para permitir melhor visualização dos percentuais de adequação ou inadequação das medidas antropométricas de acordo com a IGC, optou-se por construir uma linha de tendência utilizando-se uma função polinomial de terceiro grau que promove a suavização das curvas, suprimindo pequenas variações na sua forma9.

Utilizaram-se os softwares Excel versão 2010, e SPSS versão 23.0 para a elaboração do banco de dados, codificação, digitação e análises dos dados.

Aspectos éticos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Viçosa (CAAE 19676613.5.0000.5153) e integra o projeto "Crescimento, desenvolvimento e morbidades de lactentes e pré-escolares pré-termo ou com baixo peso ao nascimento". Este estudo está de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadas de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, em atenção à Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde do Ministério de Saúde, Brasília, DF. Foram garantidos o sigilo e a confidencialidade das informações de todos os participantes da pesquisa.


RESULTADOS

Foram elegíveis para o estudo os dados de 183 prematuros (dos 190 prematuros cadastrados, não foram encontrados sete prontuários). De acordo com os dados da Tabela 1, observou-se que as idades médias materna e paterna foram, respectivamente, 26 e 29 anos, e que 39,9% das mães e 52,6% dos pais estudaram até o ensino fundamental. A renda de 53,4% das famílias era inferior a dois salários mínimos. Entre os prematuros, 55,7% eram do sexo masculino, 72% tinham 32 ou mais semanas gestacionais e 16,9% nasceram PIG.




A primeira consulta ambulatorial no serviço de referência ocorreu com 41 semanas e estavam em aleitamento materno 73,8% dos prematuros. A duração mediana do aleitamento materno foi 5 meses e deve ser ressaltado que 81,7% dos prematuros utilizaram leite de vaca no primeiro ano. Foram observadas prevalências relevantes de anemia, atingindo taxas no primeiro ano e segundo anos de 25,8% e 12,2%, respectivamente. Durante o período de acompanhamento, 10,4% dos prematuros foram hospitalizados, especialmente por problemas respiratórios.

A evolução antropométrica dos prematuros nos primeiros dois anos de IGC está demonstrada nas Figuras 1, 2 e 3. Observou-se em todo o período predomínio de adequação de peso, estatura e IMC para a idade, com tendência ao aumento proporcional das taxas de adequação no final da observação. O peso e estatura tenderam a aumentar o percentual de adequação nos primeiros seis meses de IGC. Porém, o peso elevado para a idade mostrou um aumento proporcional discreto a partir dos 18 meses de IGC.


Figura 1. Percentuais de adequação e inadequação do peso nos dois primeiros anos de idade corrigida para a prematuridade e as respectivas linhas de tendência. Prematuros, Viçosa-MG, 2010-2015. Peso baixo: compreende peso baixo e muito baixo para a idade.


Figura 2. Percentuais de adequação e inadequação da estatura nos dois primeiros anos de idade corrigida para a prematuridade e as respectivas linhas de tendência. Prematuros, Viçosa-MG, 2010-2015. Estatura baixa: compreende estatura baixa e muito baixa para a idade.


Figura 3. Percentuais de adequação e inadequação do índice de massa corporal (IMC) nos dois primeiros anos de idade corrigida para a prematuridade e as respectivas linhas de tendência. Prematuros, Viçosa-MG, 2010-2015. IMC baixo: compreende magreza e magreza acentuada. IMC elevado: compreende risco de sobrepeso, sobrepeso e obesidade. Não há dados de IMC antes dos 2 meses devido ao uso das curvas de Fenton neste período.



O IMC adequado para a idade comportou-se com tendência a aumento proporcional das suas taxas ao final do período de observação. Esse comportamento ficou mais nítido a partir dos 12 meses de IGC. Contudo, o IMC elevado para a idade demonstrou tendência de aumento a partir dos 18 meses de IGC, acompanhando-se de comportamento semelhante do peso, mas de redução das taxas de baixa estatura para idade.

Pelos dados da Figura 4, que demonstra a evolução antropométrica somente dos prematuros nascidos PIG, houve uma tendência em recuperação de peso e estatura nos primeiros dois anos. Porém, deve ser ressaltado que o IMC elevado para a idade tendeu a se elevar entre os PIG a partir dos cinco meses e se manteve ao final dos dois anos de IGC.


Figura 4. Percentuais de adequação e inadequação do peso (A), estatura (B) e índice de massa corporal-IMC (C) dos prematuros PIG nos dois primeiros anos de idade corrigida para a prematuridade e as respectivas linhas de tendência. Viçosa-MG, 2010-2015. Peso baixo: peso baixo e muito baixo para a idade; estatura baixa: estatura baixa e muito baixa para a idade; IMC baixo: magreza e magreza acentuada; IMC elevado: risco de sobrepeso, sobrepeso e obesidade. Não há dados de IMC antes dos 2 meses devido ao uso das curvas de Fenton nesse período.



DISCUSSÃO

Em nosso estudo, observamos em todo o período predomínio de taxas de adequação de peso, estatura e IMC para a idade, tendendo a elevação aos dois anos de IGC. Ficou evidente o comportamento de recuperação do peso e estatura para a idade nos primeiros seis meses de IGC dos prematuros. Mas o peso elevado para a idade elevou-se discretamente a partir dos 18 meses de IGC, fato que sinaliza a necessidade de maior tempo de acompanhamento dessa população. Entre prematuros, os maiores ganhos de peso e IMC ao termo se associam a melhores resultados do desenvolvimento neurológico. Porém, após o termo deve-se ter cautela quanto ao maior ganho de peso em relação à estatura, por não conferir benefícios adicionais e por se associar a risco cardiovascular futuro4-6,10,11.

É sabido que o crescimento é mais intenso nos primeiros seis meses, situação compatível com o que encontramos em nosso estudo13. O ganho de peso inicial é um preditor do catch-up de crescimento14. O catch-up é definido como o aumento da taxa de crescimento da criança, permitindo que ela se recupere após período de crescimento lento ou de ausência de crescimento, e ocorre na seguinte ordem: perímetro cefálico, comprimento e peso. Assim, o catch-up permite que os prematuros adquiram, em seus primeiros anos de vida, crescimento similar ao das crianças nascidas a termo13.

Há evidências de que os prematuros nascidos PIG apresentam uma velocidade de crescimento mais lenta nos primeiros meses quando comparados com os não PIG. Em torno das 36 a 40 semanas de vida, ocorre um pico de crescimento dos prematuros, porém a restrição de crescimento extrauterino neste período é uma preocupação e tem como fator contribuinte o nascimento PIG que, em nosso estudo, acometeu 16,9% dos prematuros15,16.

Geralmente, 80% dos prematuros atingem a normalidade de estatura e perímetro cefálico até os três anos de idade e 70% recuperam o peso, estando a ausência de recuperação associada ao baixo nível socioeconômico e à ocorrência de doenças. Outros fatores que podem influenciar o catch-up e o crescimento nos primeiros anos de vida são a nutrição inadequada durante e após a alta hospitalar, a displasia broncopulmonar e o crescimento intrauterino restrito13,14,16. A velocidade de crescimento das crianças prematuras após o nascimento evidencia a importância da sua vigilância nutricional, uma vez que há indícios de que adequações na alimentação podem influenciar positivamente o crescimento17,18.

Em nosso estudo, 4,8% dos prematuros apresentaram-se com baixa estatura aos dois anos de IGC, com tendência em redução percentual da baixa estatura para a idade ao longo do período, porém ao se analisar separadamente os prematuros nascidos PIG, estes apresentaram estatura adequada ao final dos dois anos de IGC. Crianças que sofreram restrição extrauterina do crescimento apresentam menores valores de peso e estatura aos 8 anos em comparação àquelas sem restrição extrauterina do crescimento, demonstrando que este fator deve ser observado no seguimento do prematuro19.

Apesar de grande parte dos prematuros atingirem a normalidade da estatura até os 3 anos de idade, é preconizado que a baixa estatura após os 2 anos de idade deve ser investigada e adequadamente conduzida20. Assim como as crianças que sofreram restrição do crescimento extrauterino, aquelas nascidas PIG também apresentam mais dificuldades na recuperação da estatura de acordo com seu potencial genético e, para os PIG, deve-se considerar o tratamento com hormônio de crescimento20,21.

O IMC adequado para a idade comportou-se com tendência a aumento proporcional das suas taxas ao final dos dois anos de IGC, mais nitidamente a partir dos 12 meses de IGC. Contudo, observou-se que o IMC elevado para a idade na população estudada demonstrou tendência em aumento a partir dos 18 meses de IGC, apresentando relação direta com o peso elevado para a idade e inversa com a estatura baixa para a idade.

Ao se analisar somente os prematuros nascidos PIG, observou-se que 10% destes apresentaram IMC elevado para a idade desde o final do primeiro semestre até os dois anos de IGC. O IMC elevado para a idade é fato que deve ser salientado e requer mais tempo de acompanhamento desses prematuros, visto que o maior ganho ponderal e de IMC nos primeiros dois anos de IGC se associa ao sobrepeso e obesidade em escolares22.

Somando-se a isso, a prematuridade, o baixo peso ao nascer, o nascimento PIG e a restrição do crescimento, tanto intrauterina quanto extrauterina, são condições associadas às doenças crônicas não transmissíveis, como as doenças coronarianas, hipertensão arterial, doença metabólica e doença renal crônica2,3,22-25. Isso é demonstrado pelos maiores níveis pressóricos e alterações do perfil lipídico em adolescentes e adultos jovens nascidos prematuramente26,27, pela combinação entre a prematuridade e restrição intrauterina do crescimento e sua associação com alterações no metabolismo da glicose e síndrome metabólica10 e, também, pela combinação entre a prematuridade e restrição do crescimento extrauterino se associando a alterações metabólicas e de pressão arterial na puberdade19.

Considerando que o crescimento dos prematuros pode ser influenciado por fatores biológicos, socioeconômicos e culturais, em nosso estudo são fonte de preocupação a baixa duração do aleitamento materno, a alta taxa de uso do leite de vaca pelos prematuros em seu primeiro ano, a prevalência de anemia, a baixa escolaridade dos pais e a baixa renda familiar.

O aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida tem papel protetor para o excesso de peso na idade escolar e deve-se ressaltar que a adequação nutricional nos primeiros anos de vida pode levar à reprogramação fenotípica e reduzir o risco de obesidade18,22. Entretanto, crianças de famílias de baixa renda, precocemente desmamadas, expostas a uma alimentação rica em açúcares, farináceos e leite de vaca tendem a uma rápida recuperação ponderoestatural, cuja aceleração do crescimento pode acarretar prejuízos do ponto de vista cardiometabólico18,28-30.

Como fragilidades do estudo, citamos a característica descritiva, que não permite fazer estudos de associações, e as perdas inerentes a um estudo de dados secundários, fato este minimizado pelo prontuário semiestruturado no serviço. Como pontos fortes, ressaltamos a continuidade do seguimento dos prematuros no serviço de referência para o município e região de saúde, o que permitirá compreender seu crescimento ao longo do tempo, estudar fatores associados e contribuir para o conhecimento científico e a melhoria das práticas de assistência à saúde dos prematuros.

Nossos achados se alinham aos dados da literatura, em que os prematuros apresentaram tendência ao aumento da adequação dos parâmetros de crescimento em seus dois primeiros anos de IGC: peso, estatura e IMC. Neste período, foi perceptível a redução da proporção de baixa estatura para a idade entre as crianças avaliadas. Contudo, a presença de IMC elevado para a idade, principalmente entre os nascidos PIG, é fato que deve ser ressaltado e sinaliza para um necessário olhar diferenciado em seu acompanhamento, visto que eles têm um ritmo mais lento no ganho de peso e estatura nos primeiros meses, o que pode ser inadequadamente interpretado como necessidade de mais calorias.

Tais resultados evidenciaram que, neste período, todas as crianças ganharam peso e estatura de forma a tentar se equiparar ao crescimento das crianças nascidas a termo. Assim, destaca-se a importância da monitorização do crescimento das crianças prematuras visando minimizar a evolução futura de doenças crônicas não transmissíveis, o que representa um desafio para a equipe de saúde.


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Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, MG, Brasil

Endereço para correspondência:
Gabriela Miranda Mendes
Universidade Federal de Viçosa
Avenida P. H. Rolfs, s/n, Campus Universitário
CEP: 36570-900 - Viçosa (MG), Brasil
E-mail: gabimm@msn.com

Data de Submissão: 26/07/2017
Data de Aprovação: 04/07/2018