Relato de Caso
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Ano 2019 -
Volume 9 -
Número
3
Facomatose Pigmentovascular: Relato de Caso
Phacomatosis pigmentovascularis: Case report
Thayla Baptista Campostrini; Renata Souza Lorenzoni; Priscila Tavares Andrade Dutra; Helena Arantes Pelegrine; Hannah Cade Guimarães; Christine Chambô Pignaton
RESUMO
Phacomatosis pigmentovascularis is defined as the association of a vascular malformation with an extensive pigment nevus. It is currently classified by Happle into three groups: cesioflamea, spilorosea and cesiomarmorata. We report a case of a female newborn presenting with typical manifestations of cesioflamea phacomatosis pigmentovascularis, according to the classification above. The rarity of this genodermatosis, the clinical exuberance of the skin lesions and the need for recognition of this syndrome and its repercussions motivated this case report.
Palavras-chave:
vascular malformations, pigmented nevus, mongolian spot, vascular diseases.
ABSTRACT
Phacomatosis pigmentovascularis is defined as the association of a vascular malformation with an extensive pigment nevus. It is currently classified by Happle into three groups: cesioflamea, spilorosea and cesiomarmorata. We report a case of a female newborn presenting with typical manifestations of cesioflamea phacomatosis pigmentovascularis, according to the classification above. The rarity of this genodermatosis, the clinical exuberance of the skin lesions and the need for recognition of this syndrome and its repercussions motivated this case report.
Keywords:
vascular malformations, pigmented nevus, mongolian spot, vascular diseases.
INTRODUÇÃO
Facomatose pigmento-vascular (FPV) é uma síndrome congênita cutânea rara. É caracterizada principalmente pela presença de malformação capilar e nevo pigmentar extenso, podendo ou não cursar com manifestações extracutâneas.1,2 As alterações sistêmicas frequentemente envolvem anormalidades do sistema nervoso central, oculares e esqueléticas.
RELATO DE CASO
Lactente feminino, 5 dias de vida, nascido a termo por via vaginal sem intercorrências, foi avaliado pelo serviço de Dermatologia por apresentar, desde o nascimento, máculas vinhosas associadas a máculas azul acinzentadas, difusas, acometendo quase totalidade da região dorsal corporal. Em algumas regiões, havia sobreposição destes achados cutâneos com regiões hipocrômicas. Além disso, na face, apresentava uma mancha rosada que tornava-se mais evidente durante o choro. Não havia acometimento cutâneo no tronco anterior, abdome, região genital e face ventral de membros superiores e inferiores.
Durante o exame físico, não foram observadas alterações no desenvolvimento neuropsicomotor e as extremidades corporais foram simétricas, sem sinais de atrofia ou hipertrofia nos tecidos moles.
DISCUSSÃO
A Facomatose Pigmentovascular é uma síndrome rara, caracterizada pela presença concomitante de malformação capilar e nevos pigmentares, sendo pouco descrita na literatura, com 245 casos descritos em todo o mundo de 1947 a 2013, aproximadamente.1
A classificação mais recente, criada em 2005, por Happle, inclui três tipos principais:
Facomatose cesioflammea: coexistência de mancha mongólica e mancha em vinho do porto, únicas ou múltiplas;
Facomatose spilorosea: coexistência de nevo spilus e mancha salmão ou, menos frequentemente, o padrão vinhoso da mancha em vinho do Porto;
Facomatose cesiomarmorata: coexistência de mancha mongólica e cútis marmórea telangiectásica congênita.
A coexistência de lesões vasculares e pigmentadas que não se encaixam nas descrições acima são consideradas como FPV tipo inclassificável. Sabe-se que a maioria (75%) dos pacientes apresentam Facomatose Cesioflammea.3,4
A patogênese da FPV ainda não está clara, mas acredita-se que seja uma anormalidade no desenvolvimento de células melanocíticas e células neuronais vasomotoras derivadas da crista neural. 2 O gene responsável pela síndrome ainda não foi identificado. Recentemente, as mutações somáticas do gene GNAQ [proteína de ligação do nucleotídeo guanina (proteína G), q polipéptido] foram identificadas em manchas de vinho de porto e Síndrome de Sturge-Weber, indicando que existe um único mecanismo subjacente. Ainda há dúvidas se mutações de GNAQ ou mutações de outros genes em células progenitoras pluripotentes são responsáveis por vários fenótipos de FPV.5
Embora a porcentagem exata não seja clara, todas as formas de PPV podem estar associadas a manifestações extracutâneas, como defeitos do sistema nervoso central, anomalias oculares, malformações vasculares, assimetria dos membros, linfedema unilateral e escoliose. Além de um exame dermatológico completo, as crianças afetadas devem, portanto, também passar por avaliação pediátrica e, se necessário, neurológica, ortopédica e oftalmológica. Isso ajuda ainda a diferenciar esta condição de outras síndromes vasculares, incluindo Síndrome de Sturge-Weber (ou Angiomatose encefalotrigeminal) e Síndrome de Klippel-Trenaunay.3
No caso relatado acima, as lesões vinhosas eram compatíveis com manchas vinho do porto e localizavam-se em algumas regiões do dorso e nádegas. As máculas azul acinzentadas, localizadas no tronco posterior, dorso, nádegas e raiz dos membros eram compatíveis com mancha mongólica extensa. Em algumas regiões, havia sobreposição de manchas vinho do porto e de manchas mongólicas com nevo anêmico. Além disso, a mancha rosada que tornava-se mais evidente durante o choro caracterizava-se a mancha salmão.
Mediante achados cutâneos de manchas mongólicas e malformações capilares, classificamos então nosso paciente como Facomatose Cesioflammea, subtipo clínico encontrado na maioria dos casos relatados na literatura atual.
Algumas anormalidades sistêmicas ou cutâneas podem estar associadas a este tipo de facomatose, como nevo anêmico, alopécia, assimetria dos membros inferiores, glaucoma, displasia venosa e linfática e síndromes como Sturge-Weber e Klippel-Trenaunay.
No caso apresentado, não existia consanguinidade parental e relato de outros casos similares na família apresentando malformações vasculares.
Até o quinto mês de vida, o paciente encontrava-se em acompanhamento conjunto com a pediatria, não tendo sido encontradas alterações extracutâneas e sinais e/ou sintomas de outras doenças ou acometimento sistêmico.
O tratamento e o prognóstico da Facomatose Pigmentovascular dependem da associação com alterações extracutâneas. Como a maioria dos casos ocorre esporadicamente sem risco em gravidezes subseqüentes, a triagem pré-natal não é necessária e isso ajuda a tranquilizar os pais durante o aconselhamento genético.
Haja vista que a FPV sem envolvimento sistêmico tem curso benigno e não requer tratamento, no caso relatado, optou-se por realizar conduta expectante, com reavaliação periódica a fim de detecção precoce de sinais sistêmicos da doença.
Em alguns casos, devido ao impacto na autoestima, pode-se considerar a realização de procedimentos estéticos a fim de melhorar a qualidade de vida dos pacientes, não havendo consenso até então sobre o momento exato para intervenção. Alguns autores sugerem que o tratamento com laser deve ser feito ainda na infância, idealmente antes da idade escolar, a fim de reduzir a extensão das lesões.1,2,5
REFERÊNCIAS
1. Segatto MM, Schmitt EU, Hagemann LN, da Silva RC, Cattani CAS. Phacomatosis Pigmentovascularis Type IIa - Case report. An Bras Dermatol. 2013;88(6 Suppl 1):85-8.
2. Villarreal DJV, Leal F. Phacomatosis pigmentovascularis of cesio ammea type. An Bras Dermatol. 2016;91(5 Suppl 1):54-6.
3. Sgarbi CR, Hostalácio IFF, Tranquillini G, Villa RT, Ferreira LF, Bedin V. Facomatose pigmentovascular: relato de caso. Med Cutan Iber Lat Am. 2014;42(4-6):133-5.
4. Nanda A, Al-Abdulrazzaq HK, Habeeb YK, Zakkiriah M, Alghadhfan F, Al-Noun R, et al. Phacomatosis pigmentovascularis: Report of four new cases. Indian J Dermatol Venereol Leprol. 2016;82(3):298-303.
5. Fischer K, Trautinger F. Phacomatosis pigmentovascularis. J Dtsch Dermatol Ges. 2015;13(11):1178-9. doi: 10.1111/ddg.12834
Hospital Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Serviço de Dermatologia
Endereço para correspondência:
Thayla Baptista Campostrini
Hospital Santa Casa de Misericórdia de Vitória, Serviço de Dermatologia, Vitória, ES, Brazil
R. Dr. João dos Santos Neves, 143 - Vila Rubim,
Vitória ES, Brasil CEP: 29025-023.6
E-mail: tatacampost@hotmail.com
Data de Submissão: 06/03/2018
Data de Aprovação: 02/20/2019